David Bruno, natural de Vila Nova de Gaia, é um artista que se define como um “olheiro de Portugalidade”. Na sua biografia do Spotify, descreve alguém que “transmite a cultura kitsch portuguesa e que pode ser considerado como um verdadeiro objeto arqueológico em alguns aspetos clássicos desta Europa meridional”.
Fez parte do ‘Conjunto Corona’ e iniciou-se a solo com o álbum ‘4400 OG’, em 2016, ao qual se seguiu o ‘Último Tango em Mafamude’, lançado em 2018, e os projetos ‘Miramar Confidencial’, em 2019, e ‘Raiashopping’, em 2020.
Estamos habituados a vê-lo em várias colaborações, sendo talvez a mais conhecida ‘Palavras Cruzadas’, lançada em 2021, com Mike El Nite.
Lança agora um novo trabalho, ‘Tens-me na mão’, a convite da Samsung Portugal. Este novo lançamento, com cinco músicas, “interpreta a rotina de um empreendedor das criptomoedas, um novo-rico contemporâneo, que nos leva numa viagem pela sua intimidade, os seus pequenos luxos e as suas maiores extravagâncias”.
Em conversa com o Notícias ao Minuto, falou sobre o seu novo trabalho, que nas suas palavras é um trabalho que mistura “coisas portuguesas com tecnologia”.
Para quem não conhece o David Bruno, o que é que deve saber?
Sou músico, natural de Gaia, olheiro de Portugalidade e amante do Portugal “P”, não o lindo que brilha, que aparece na televisão, mas o Portugal do dia-a-dia simples. A minha música é sempre à volta disso.
E especificamente sobre este novo trabalho?
Este trabalho foi um convite da Samsung. Numa primeira altura, até achei que não era muito compatível comigo. Depois, decidi pensar na coisa de outra forma, que é como é que um português, com esta Portugalidade… Ou seja, como é que estas tecnologias da Samsung servem a chico-espertice portuguesa. E fiz cinco músicas em que cada música é dedicada a uma funcionalidade da Samsung, dentro de uma persona que é o chico-esperto português, mas os novos que são estes novos empreendedores da criptomoeria, etc.
''Tens-me na mão', de David Bruno© D.R
Como é que esta realidade económica se transfere para música?
O que eu quero explorar é o estilo de pessoa que hoje em dia é empresário em Portugal, é chico-esperto e que se transformou. No passado, talvez estes empresários fossem empreiteiros e hoje são empreendedores, com cripto e esse dinheiro “supostamente fácil”, e em esquemas em pirâmide.
Eu interpreto uma pessoa desse estilo a criar músicas sobre isto.
O álbum chama-se 'Tens-me na mão'? O que é que significa?
O telemóvel da Samsung, ou seja, está relacionado com todas as coisas que é possível fazer com um telemóvel.
Todos os cinco temas estão relacionados com telemóveis?
Não só com o telemóvel, mas sim tecnologia em geral.
O que têm de especial estes cinco temas?
São cinco temas sobre cinco funcionalidades diferentes que servem como tutoriais. Não tutoriais normais mas na ótica deste empreendedor chico-esperto.
Tens uma primeira música, que se chama ‘Regula-me o Termóstato’, que é uma música romântica, onde este homem fala com a assistente virtual, como aliás ele fala depois ao longo de todo o disco, e que é a sua melhor companhia. Esta música é uma metáfora sobre o conforto do lar, sobre gostarem de ter companhia e a tristeza da solidão de estar em casa. Ao mesmo tempo, é uma música que fala sobre como é que tu com o teu telemóvel podes controlar as coisas da tua casa.
O segundo chama-se ‘Contigo na Retina’ e é uma música que usa a funcionalidade de projetares imagens a partir do teu telemóvel para televisões, mas ao mesmo tempo fala sobre um homem obcecado pelo objeto da sua obsessão nestas tecnologias. Ou seja, a tecnologia ajuda-o a ultrapassar a dor.
O terceiro tema chama-se ‘Sempre Disponível’ e tem a ver com o facto de tu poderes atender chamadas no telemóvel/tablet. No entanto, será que é isto que ele quer? Porque, por vezes, não queres atender chamadas de quem não interessa.
O quarto tema chama-se ‘Só Entre Nós’ e é uma metáfora, em que parece que um homem está a falar com a sua amada. Basicamente, é sobre a funcionalidade de guardar 'passwords' para nunca nos esquecermos de nada.
A última música chama-se ‘Trocar Sem Encostar’, que é uma metáfora com “tocar sem encostar”, e tem a ver com a facilidade de enviar ficheiros e com o Quick Share, que é um sistema da Samsung para mandares ficheiros rapidamente. Esta é uma música sobre um homem que utiliza essa funcionalidade para engatar miúdas num bar, mandando-lhe fotografias como antigamente, com o Bluetooth.
Por isso, resumidamente, este álbum é sobre um chico-esperto que utiliza as funcionalidades para a sua vida correr melhor.
E qual é a tua música preferida?
Não posso dizer. Isso é como tu perguntares a um pai qual é o filho favorito. Gosto de todas.
E qual foi a mais desafiante fazer?
Foram todas. Quando me lançaram este projeto eu sempre achei que se fosse um compromisso meramente comercial, eu nunca o faria. Eu sempre concordei em fazer músicas que têm a ver com o meu universo. Então, simplesmente, fiz as músicas todas utilizando estas metáforas e remetendo para este jogo da Portugalidade. Vão ouvir-se referências à Festa do Fumeiro e do Alvarinho, ao Festival do Bacalhau em Ílhavo… O objetivo foi misturar coisas portuguesas com tecnologia e com uma marca como a Samsung, e posso dizer que o desafio foi grande.
O que é que o Fumeiro tem a ver com tecnologia?
O que é que a Feira do Fumeiro, o Festival do Bacalhau ou o Festival do Mirtilho (disse mal de propósito) ou o Jorge Palma a tocar na Agrival em Penafiel têm a ver com a Samsung? É uma questão de ouvirem o álbum porque o desafio foi misturar isto tudo.
O que é que te deu mais gozo fazer?
O que teve mais piada foi quando soube que as letras, as músicas e os vídeos - porque vai haver um videoclipe para cada música - teriam que ser aprovados na sede da Samsung na Coreia do Sul. Então, quando eu imaginei os senhores na Coreia a ouvirem isto com as letras traduzidas... Existem coisas que são intraduzíveis como: “Sou delicado como um naperom”. Como explicar isto a um coreano? E ri-me muito a fazer isto. E digo-te que estava convencido que não fosse ser aceite pelo tipo de conteúdo. Mas foi e fiquei contente por isso.
E quais é que são os próximos passos na tua carreira?
Vou andar a tocar aí todo o verão, a solo, e com o meu projeto com o Mike El Nite. Por isso, a seguir a isto é aproveitar a reabertura dos concertos para tocar a sério, que é uma coisa que faz falta aos músicos. E mais para a frente vou continuar a lançar mais álbuns a solo.
Onde é que vais apresentar este álbum?
Ainda não sei… Mas eu gosto muito de alguns destes temas e gostaria de os incluir no meu 'line-up' [alinhamento] ao vivo nos concertos normais e talvez os consigam ouvir no Primavera Sound, em junho, ou no Festival Bons Sons, em Tomar, que são os dois maiores concertos que eu vou ter nos próximos tempos.
Alguma mensagem que queiras deixar sobre o futuro e para quem vai ouvir este trabalho?
O meu desejo é que as pessoas, mesmo que não tenham um Samsung, mesmo que tenham iPhones e Xiaomis, Alcatel, o que quer que seja, que cheguem a sua casa e desfrutem do álbum, porque isto é claramente um álbum para se ouvir em casa, para contrariar estes tempos muito conturbados só de más notícias e de tragédia que tem existido nos últimos tempos.
Mesmo que não se tenha um Samsung vamos conseguir identificar-nos com o álbum?
A 100%, isso não é um entrave nenhum. É um álbum para todas as idades e para qualquer pessoa.
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