"Em 1993, tinha eu 18 anos, ouvi a voz da Eunice no palco do antigo Teatro Aberto. Estava sentado na plateia a assistir a um espetáculo extraordinário, 'O Tempo e o Quarto', de Botho Strauss, dirigido por João Lourenço. No centro de cena, marcando o cenário, como que sustentando todo o teatro, estava uma coluna. De dentro dessa coluna, saía a voz da Eunice", recorda Pedro Penim, numa declaração publicada na sua página no Facebook, reconhecendo na atriz a capacidade de alicerçar o próprio teatro em Portugal.
"Na minha cabeça esta imagem nunca mais se iria descolar de como olho para Eunice. E foi na primeira coisa que pensei quando hoje acordei com a tristíssima notícia do seu desaparecimento".
"Eunice é de facto a coluna, sustentáculo de uma carga estrutural imensa e maravilhosa que é o teatro português, parecendo ora demasiado esbelta no seu prumo para tanto peso, ora robustíssima e capaz de ser base, fuste e capitel desta herança", escreve Penim.
O diretor artístico do Teatro D. Maria II recorda ainda como a atriz se estreou nesta sala, aos 13 anos, no dia 28 de novembro de 1941, na peça "Vendaval", de Virgínia Vitorino. "Em novembro passado, 80 anos depois dessa data, tivemos o privilégio de voltar a recebê-la e homenageá-la".
"Era sempre especial para o teatro receber a Dona Eunice, esperar que ocupasse o seu camarim. Foi lá que a vi pela última vez, feliz, recebendo os seus convidados, sorrindo para todos, confortando-nos com a sua existência basilar", lembra Pedro Penim.
"Quando Eunice vinha ao Dona Maria, havia um rumor jubilante no ar, os trabalhadores estremeciam, o teatro zunia, os dourados trepidavam. Porque Eunice é a coluna. Para sempre alicerce do teatro português, para sempre eixo da nossa história contemporânea", conclui o diretor artístico deste teatro nacional.
Eunice Muñoz morreu hoje, no Hospital de Santa Cruz, em Lisboa, aos 93 anos.
O percurso de 80 anos da atriz, no teatro, soma mais de 120 peças, em perto de três dezenas de companhias, depois da estreia, em 28 de novembro de 1941, aos 13 anos, em "O vendaval", de Virgínia Vitorino, no Teatro Nacional D. Maria II.
No cinema e na televisão, o seu nome está associado a mais de 80 produções de ficção, entre filmes, telenovelas e programas de comédia.
Recebeu mais de uma dezena de prémios, seis condecorações oficiais, que culminaram na Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada, em 2021. Em 1990, foi-lhe atribuída a Medalha de Mérito Cultural.
O luto nacional será decretado no dia do funeral da atriz, anunciou o Governo.
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