Morreu o cineasta Jean-Luc Godard. Pai da Nouvelle Vague tinha 91 anos
Nascido em Paris, em 1930, Godard passou os primeiros anos da sua formação na Suíça, tendo estudado Etnologia na Sorbonne.
© The Image Gate/Getty Images
Cultura Jean-Luc Godard
O cineasta franco-suíço Jean-Luc Godard morreu, esta terça-feira, em Paris, França, aos 91 anos - a mesma cidade que o viu nascer. É considerado o 'pai' da Nouvelle Vague e um dos mais importantes cineastas em todo o mundo. A notícia foi avançada pelo Libération, que cita fontes familiares.
Parte fundamental da 'Nouvelle Vague' francesa, movimento que revolucionou o cinema a partir dos anos 1950, Godard tem uma longa carreira premiada, que vai desde o galardão de melhor realizador, em Berlim, logo por 'O Acossado', até um Óscar honorário, entregue em 2010 numa cerimónia à qual não compareceu. Godard venceu esta estatueta pela "paixão" e "confrontação" da sua arte, considerando-se que criou uma "nova forma de cinema".
Autor de obras influentes sobre várias gerações de realizadores como 'O Desprezo' (1963), com Brigitte Bardot, 'Bando à Parte' (1964), 'Pedro, o Louco' (1965) ou os mais recentes 'Filme Socialismo' (2010) e 'Adeus à Linguagem' (2014), Jean-Luc Godard ficou conhecido "pelo seu estilo de filmar iconoclasta, aparentemente improvisado, bem como pelo seu inflexível radicalismo", como recorda o The Guardian no obituário do cineasta.
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— Libération (@libe) September 13, 2022
Realizadores como o norte-americano Quentin Tarantino, que chegou a ser cofundador de uma produtora intitulada 'Bando à Parte', referiram-se a Godard como um "libertador": "Para mim, Godard fez aos filmes aquilo que Bob Dylan fez à música. Ambos revolucionaram as suas formas", disse Tarantino, numa entrevista de 1994 com a Film Comment.
Controverso em termos políticos e artísticos, a sua obra estava longe de consensual no meio: por exemplo, Paula Rego detestava o seu trabalho e Ingmar Bergman dizia-se incapaz de compreender os seus filmes, uma vez que os considerava "feitos para críticos".
O texto do Libération sobre Godard abre com uma citação do português Manoel de Oliveira (1908-2015), com quem Godard dialogava em abundância, que dizia que o cinema do autor de 'O Maoista' "é a saturação de signos magníficos que se banham à luz da sua falta de explicação".
Nascido em Paris, em 1930, Godard passou os primeiros anos da sua formação na Suíça, tendo estudado Etnologia na Sorbonne, em Paris, onde "conversas de café com estudantes e um trabalho manual numa barragem" constituíram grande parte da sua aprendizagem, que inspirou a primeira curta-metragem, 'Opération Béton', de 1954, lembra a biografia disponível na Enciclopédia Britânica.
Os estudos em Etnologia vieram a entroncar no trabalho de Jean Rouch, que estava precisamente a misturar a área da antropologia com o cinema num estilo designado 'cinema vérite'.
"Ele começou a escrever sobre os filmes que via na [revista] 'Cahiers du Cinema' e formou alianças com artistas que se tornariam no núcleo da Nova Vaga francesa. Embora moldada a partir dos filmes de 'gangsters' de Hollywood, a estreia de Godard, 'O Acossado', desafiou as convenções do cinema e espantou críticos, cineastas e públicos com o seu estilo de improviso, trabalho de câmara 'handheld' impulsivo e saltos intencionais", pode ler-se na biografia disponível na página da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
Godard esteve na criação de um coletivo intitulado Dziga Vertov, que, mais do que produzir "filmes políticos", radicais em termos estéticos, tinha o propósito de "fazer filmes politicamente", o que impunha a perspetiva em "todo o processo", da produção à rodagem, citava a Cinemateca Portuguesa, na apresentação de um ciclo sobre o grupo, em 2018.
As reações à morte de Godard não se fizeram esperar: o britânico Edgar Wright escreveu, no Twitter, que, apesar de iconoclasta, o realizador "reverenciava o sistema de Hollywood, já que, provavelmente, nenhum outro cineasta inspirou tantas pessoas a pegar numa câmara e começar a filmar".
A Cinemateca Francesa lembrou Godard através de uma frase: "O cinema não está ao abrigo do tempo. Ele é o abrigo do tempo".
[Notícia atualizada às 11h30]
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