O rap de Lamar chegou ao Parque da Cidade com ímpeto, conquistando a multidão que nem sob a chuva copiosa arredou pé. Era, incontestavelmente, o nome mais aguardado do primeiro dia do festival Primavera Sound, que este ano assinala dez anos.
Perto das 00h30, quando o recinto já se deixava dominar pelo cheiro a terra molhada, e os fãs que guardavam lugar na primeira fila desde a tarde já desesperavam pelos primeiros acordes, Kendrick Lamar foi recebido com uma ovação da legião que o aguardava entre guarda-chuvas e gabardines.
"É uma ocasião especial. Há muito que não pisava este palco", recordou a certa altura o rapper norte-americano, que já tinha atuado na edição do festival de 2014.
Desde então, editou três álbuns, foi galardoado com um Pulitzer e consagrou-se como um dos nomes mais importantes do hip-hop mundial, depois de vencer 14 grammys.
Com pequenos ajustes ao alinhamento que levara, na semana passada, ao Primavera Sound Barcelona, Kendrick mostrou por que é um dos melhores rappers da sua geração e viajou do mais recente 'Mr. Morale & The Big Steppers' (2022) aos temas mais antigos dos álbuns que o catapultaram para a fama.
Depois de uma primeira parte praticamente sozinho em palco, um grupo de dançarinos vestidos de forma idêntica juntou-se ao espetáculo e deu ritmo ao espetáculo - que o artista não deixou fotografar.
Do alinhamento fizeram parte temas como 'ELEMENT.', 'Bitch, Don't Kill My Vibe' e 'Alright'. Já na reta final, juntou-se a Kendrick o seu primo Baby Keem - que antes já tinha atuado no palco Porto para apresentar o seu álbum 'The Melodic Blue' - para o dueto de 'Family Ties'.
Num festival de 'cara lavada' - com recinto maior e alterações na localização dos palcos - a sensação que fica é que a transição do palco principal para perto da ‘rotunda da anémona’ pode até acolher mais pessoas, mas não favorece o espetáculo: por questões de distribuição do público e de acústica.
Antes, enquanto os festivaleiros aguardavam por Lamar, o cocktail musical já tinha sido servido em bandeja de prata, com The Comet is Coming no Palco Vodafone. A banda londrina provou que Jazz, Eletrónica e Rock podem funcionar bem em conjunto.
Quanto a chuva já caía amiúde, o saxofone de Shabaka Hutchings, aliado às teclas de Dan Leavers e à bateria de Max Hallett, prova que o jazz está vivo e recomenda-se, é dançável, e até casa bem com um festival de verão.
A clássica Goldfrapp trouxe nova vida e novos passos para abrir a pista
Alison Goldfrapp tem uma carreira mais do que estabelecida no mundo da música eletrónica e eletropop, conhecida há décadas como uma das presenças mais fortes do estilo. Em 2023, Goldfrapp anunciou que iria lançar uma carreira a solo e o novo álbum, ‘The Love Invention’, foi lançado a dois meses do Primavera Sound.
A nova vida da britânica não demorou muito a entranhar e, numa noite em que o hip-hop foi protagonista, Goldfrapp colocou a fasquia bem elevada com uma performance que também recordou os grandes sons dos Goldfrapp (o duo que era composto pela artista e por Will Gregory).
Alison Goldfrapp © Hélio Carvalho/Notícias ao Minuto Começando pelo tema que dá o nome ao novo disco, Alison Goldfrapp surgiu toda de azul, eloquente e metódica em cada movimento, mostrando a intensa e sedutora presença que a tornaram tão conhecida. O concerto saltitou de clássicos como ‘Train’ ou ‘Rocket’, a temas mais novos, como ‘Gatto Gellatoo’ e ‘So Hard So Hot’. Já perto do final, não ficou esquecido o icónico tema de dance ‘Ooh La La’.
Mas, se Goldfrapp aperfeiçoou os passos de dança no Primavera Sound, Georgia foi a responsável por aquecer o público. Por todo o recinto, muitos foram os festivaleiros que, sentados na relva e desconhecendo a compositora, se mostraram surpreendidos pela sua atuação contagiante. E não foram poucos os que se levantaram e foram dançar para a frente do palco Vodafone. Sozinha com a sua percussão e um teclado, Georgia chegou e falou sempre de forma genuína, e aproveitou as réstias de sol e de céu limpo para arrancar com energia a ronda de concertos de pôr-de-sol.
O primeiro dia do Primavera Sound de 2023 começou com voz portuguesa, com influência brasileira. Apresentando o seu álbum ‘Prazer Prazer’, lançado em março, Beatriz Pessoa trouxe uma sonoridade intimista, descomprimida e alegre, e temas como ‘Dona da verdade’ (com letra da própria e de dois nomes grandes da música brasileira da última década, Mallu Magalhães e Marcelo Camelo) acolheram calorosamente os primeiros festivaleiros do ano.
O Primavera Sound Porto continua esta quinta-feira, com Rosalía a encabeçar o segundo dia de festival. Rosalía voltará a um palco que já pisou em 2019, quando ainda era altamente influenciada pelas origens no flamenco, e desta vez vai ser a cabeça de cartaz de um ‘lineup’ que contará com Bad Religion, …Fred Again, Japanese Breakfast, Arlo Parks, Alvvays, The Beths, Núria Graham, e ainda com os portugueses Fumo Ninja e Quadra, entre muitos outros.
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