O ministro falava aos jornalistas antes da visita às novas exposições montadas para a inauguração oficial do museu prevista para durar até domingo, com entradas gratuitas, e um programa cultural com música e performance.
"Estávamos conscientes da possibilidade de José Berardo exercer o seu direito de compra das obras adquiridas em conjunto com o Estado", disse Pedro Adão e Silva sobre os dois milhões de euros, que são provenientes de um pagamento do colecionador e empresário sobre obras adquiridas em conjunto para o anterior Museu Coleção Berardo, no âmbito do acordo que vigorou até ao final de 2022.
O jornal Público noticiou hoje que Berardo acionou a opção de compra garantida pelo acordo de 2006, recorrendo à Associação de Coleções, sediada no Funchal, que integra as entidades controladas pelo empresário, para ficar com 214 obras adquiridas nos primeiros anos do Museu Berardo com verbas de um fundo de aquisição cofinanciado pelo empresário e pelo Estado português.
Pedro Adão e Silva disse hoje que o Ministério da Cultura estava "absolutamente consciente" da possibilidade de o colecionador exercer o seu direito de compra quando, há cerca de um ano, anunciou que o Estado iria denunciar o protocolo de comodato da coleção, e depois o Governo ter decidido pela extinção Fundação de Arte Moderna e Arte Contemporânea - Coleção Berardo.
O acordo inicial firmado entre o Ministério da Cultura e Berardo, em 2006, cedia 862 obras da coleção de arte do empresário ao Estado, prevendo a sua renovação a cada seis anos e, mais tarde, a dez, no caso de nenhuma das partes o denunciar nos seis meses antes do término.
No acordo original também existia uma cláusula que obrigava ambas as partes a investir anualmente 500 mil euros cada, em novas aquisições de obras de arte, tendo sido adquiridas 214 peças nos primeiros dois anos, surgindo uma outra coleção, a Coleção Estado/Berardo, e sobre essa Berardo ficou com o direito de preferência de compra, que agora exerceu.
"As partilhas foram feitas de acordo com o que estava previsto. Aliás, em todos os momentos deste processo. E tem corrido dentro de tudo do que nós prevíamos e antecipávamos. Cumprimos estritamente o que estava previsto, incluindo essa possibilidade", comentou o ministro.
José Berardo "exerceu o seu direito de preferência [para comprar as 214 obras] e depositou a verba correspondente de aquisição, que reverteu para o Ministério da Cultura", indicou o ministro, acrescentando que fez a opção de entregar essa verba ao MAC/CCB.
"Com os 1,8 milhões de euros do pagamento das obras, e os 200 mil adicionais que ainda estavam na Fundação [de Arte Moderna e Arte Contemporânea - Coleção Berardo), somaram dois milhões de euros, e eu tomei a decisão que reverterão para o MAC/CCB para investir no museu, mas essencialmente para a criação de um fundo de aquisições, retomando uma política de aquisições que o CCB teve nos anos 1990 e que ficou suspensa", disse Adão e Silva aos jornalistas.
Durante os anos iniciais do Museu Berardo, e de acordo com o protocolo assinado em 2006, ambas as partes contribuiriam com 500 mil euros anuais - ação que depois suspenderam - para aquisição de novas obras para o museu, nomeadamente de artistas portugueses como Jorge Molder, Rui Chafes e Pedro Cabrita Reis.
"Qualquer interpretação de que o MAC/CCB não tem coleções não corresponde à verdade. O Estado português vai colocar aqui em depósito a Coleção Ellipse e a Coleção Teixeira de Freitas -- ambas com cerca de duas mil peças -, e com a possibilidade de usar também a Coleção de Arte Contemporânea do Estado (CACE)" para exposições, vincou Pedro Adão e Silva.
Questionado pelos jornalistas sobre a possível intenção de José Berardo reaver o museu, o Pedro Adão e Silva disse que não fazia interpretações sobre "as vontades" do empresário: "É um tema do passado que foi resolvido quando denunciámos o protocolo e extinguimos a fundação. Estou, sim, preocupado com o novo início do museu, e que o CCB possa gerir este espaço e articulá-lo com o centro de artes performativas".
"Tudo o resto é tema de um processo entre o senhor Berardo e os três bancos, ao qual o Estado é estranho", comentou o ministro, referindo-se ao processo que está a correr na justiça, na sequência de um processo interposto em tribunal pelo Novo Banco, pela Caixa Geral de Depósitos e pelo BCP, que reclamam uma dívida de cerca de 1.000 milhões de euros que dizem ter do empresário.
No âmbito desse processo, a Coleção Berardo que se encontrava no museu foi arrestada pela justiça em julho de 2019, e determinou o CCB como seu fiel depositário até surgir uma decisão do tribunal.
Também questionado sobre qual será o papel do MAC/CCB face à existência de um Museu Nacional de Arte Contemporânea situado no Chiado, Adão e Silva reiterou que "haverá uma articulação entre ambos, porque têm coleções distintas, com perfis complementares".
O MAC/CCB vai ser oficialmente inaugurado na sexta-feira com a exposição permanente "Objeto, Corpo e Espaço - A revisão dos géneros artísticos a partir da década de 1960" e "Coleção Berardo do Primeiro Modernismo às Novas Vanguardas do Século XX", num percurso com núcleos dedicados às principais vanguardas históricas da primeira metade do século XX, como o cubismo, o dadaísmo e o surrealismo.
A exposição permanente inclui ainda algumas peças da Coleção de Arte Contemporânea do Estado e da Coleção Teixeira de Freitas, e será inaugurada uma nova exposição temporária, intitulada "Atravessar uma ponte em chamas", da artista belga Berlinde de Bruyckere.
Criado depois da extinção da Fundação de Arte Moderna e Arte Contemporânea -- Coleção Berardo, o MAC/CCB foi anunciado após a denúncia, pelo Ministério da Cultura, de um protocolo de comodato assinado entre o Estado e o colecionador de arte José Berardo, que passou a vigorar a partir de 01 de janeiro deste ano, sempre com a oposição do empresário.
[Notícia atualizada às 15h58]
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