A manhã de hoje na comissão parlamentar de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto foi dedicada às audições a pedido de vários partidos, para ouvir no parlamento diversas personalidades ligadas ao CCB.
Os vários requerimentos foram interpostos pelos partidos no dia 11 de dezembro, após uma audição da ministra da Cultura, Dalila Rodrigues, que acusou o seu antecessor, Pedro Adão e Silva, de ter feito um "assalto ao poder" no CCB, garantindo "que acabaram os compadrios naquela instituição".
Na mesma ocasião, a ministra disse que Paula Fonseca (ex diretora de Artes Performativas) e Margarida Serrão (ex coordenadora de Operações) foram afastadas de funções para justificar a contratação de Aida Tavares para o cargo de diretora artística para as Artes Performativas e Pensamento, criado após a tomada de posse de Francisca Carneiro Fernandes.
Aida Tavares foi a primeira a ser ouvida, e contou que quando chegou ao CCB "o ambiente laboral era bastante difícil".
"Aquela equipa estava bastante desmotivada. Em termos de direção acontecia pouca partilha e a construção de projeto artístico era feita sem participação da equipa, algo que me parece fundamental", afirmou.
De acordo com Aida Tavares, essa relação "tem vindo a crescer e a ser melhorada", até porque, alegou, "a reestruturação [levada a cabo por Francisca Carneiro Fernandes] teve em conta o que os trabalhadores achavam que era preciso para o seu trabalho".
Vários trabalhadores do CCB, numa carta dirigida em outubro à ministra da Cultura, davam conta de "diversas queixas" apresentadas contra Paula Fonseca "por desconsideração, bullying, assédio moral aos trabalhadores que trabalham diretamente com ela".
Na missiva, afirmavam ainda que "foram vários os episódios de desrespeito presenciados por quem diariamente trabalhava com ela [a então diretora de Artes Performativas]".
Confrontada hoje pelos deputados sobre o alegado mau ambiente na instituição, Paula Fonseca disse não ter conhecimento de "situações de assédio, nem de mau tratamento", acrescentando que "há problemas em todos os locais de trabalho" e "havia uma série de situações que estavam a ser solucionadas", nomeadamente "questões de promoções e reorganização de equipas".
"Havia problemas, mas nada que justifique o que está a ser dito", afirmou, referindo-se a notícias que vieram a público nos últimos meses.
Paula Fonseca lembrou que Francisca Carneiro Fernandes lhe fez "um convite para ficar" no CCB, enquanto coordenadora geral executiva da unidade orgânica de Artes Performativas e Pensamento, salientando que "se houvesse situações extremadas isso não tinha acontecido".
Esse convite tinha sido referido por Aida Tavares. "No momento em que entro foi proposto a Paula Fonseca que assumisse um cargo dentro da nova reestruturação, muito semelhante ao que ela tinha". Entretanto, "decidiu sair" do CCB. "Não foi posta na rua", declarou.
Mais tarde, Paula Fonseca reiterou a afirmação de Aida Tavares, mas dizendo que acabou por sair porque "a situação tornou-se insuportável"
"Rescindiram-me a comissão de serviço enquanto estava de baixa, nomearam a Cláudia Belchior para o lugar que me tinham proposto. Fiquei no mesmo cargo que a Margarida Serrão [o cargo que ocupava originalmente]. É verdade que não fui posta na rua, mas criou-se uma situação bastante complicada que me levou a tomar a decisão que tomei", afirmou.
Paula Fonseca alegou que no contrato enquanto diretora de Artes Performativas "estava a coordenação de programação do CCB".
"Eu tinha objetivos concretos relacionados com a programação do CCB. Não era uma diretora artística, não programava, reunia com os programadores e o conselho de administração e tentava unificar, fazer uma programação conjunta. Havia agregação desse trabalho, feito por mim", disse.
Já Margarida Serrão referiu ter sido informada que o seu cargo de coordenadora de Operações (direção de cena e produção), para o qual tinha sido nomeada em janeiro de 2020, "tinha sido extinto, devido a uma reestruturação".
"Aida Tavares disse que não é apologista de chefias intermédias, porque gosta de lidar diretamente com as equipas", referiu.
Questionada sobre se teria havido "interferências externas" relativas à sua saída, Margarida Serrão afirmou acreditar que não.
"Não tinha expressão ao nível de grandes decisões estratégicas da fundação. Seguia direções dadas pela direção. Não me parece que o cargo chame atenção ao Ministério da Cultura para que interfira na minha saída ou de outro coordenador qualquer", afirmou.
De acordo com Paula Fonseca, "havia mau estar na equipa de direção de cena, relacionada com a sua coordenadora".
A nomeação de Margarida Serrão foi contestada em 2020 pela equipa, nomeadamente através de uma carta dirigida ao conselho de administração do CCB, à data presidido por Elísio Sumavielle.
Na carta, escrita quase um ano após a nomeação, que também inicialmente tinha sido contestada, a equipa defendia: Margarida Serrão "não tem perfil nem reúne as competências necessárias para assumir funções".
Já o diretor de Edifícios e Instalações Técnicas do CCB, António Ribeiro referiu que a instituição, onde trabalha há 30 anos, "sempre teve uma relação franca e fácil entre todos os trabalhadores".
"Não havia qualquer problema que eu tenha sentido, e na minha direção, até à chegada de Francisca Carneiro Fernandes", afirmou.
O trabalho de António Ribeiro com a ex-presidente "foi caracterizado por falta diálogo", assim como "desconfiança pessoal e técnica".
A nomeação direta de Aida Tavares, sem concurso, foi também abordada hoje, com a diretora artística do CCB a lembrar que "os concursos não são obrigatórios por lei".
"Alguns teatros fazem e outros não fazem. No [Teatro Municipal] São Luiz [de Lisboa] fui nomeada diretamente", afirmou.
Hoje foi também ouvido o diretor Financeiro e Administrativo, Francisco Sacadura, que considerou que não lhe competia "opiniar" sobre a contratação de Aida Tavares, visto não se tratar da sua área.
O Ministério da Cultura exonerou, em 29 de novembro, Francisca Carneiro Fernandes da presidência da Fundação CCB, anunciando a nomeação para o cargo de Nuno Vassallo e Silva, decisão justificada com a "necessidade de imprimir nova orientação à gestão da fundação", "para garantir" que assegure "um serviço de âmbito nacional, participando num novo ciclo da vida cultural portuguesa".
Francisca Carneiro Fernandes, que foi exonerada nas vésperas de completar um ano como presidente da Fundação CCB, avançou, entretanto, com uma impugnação administrativa da exoneração e vai interpor uma ação judicial.
Os pedidos de vários partidos para ouvir no parlamento diversas personalidades ligadas ao CCB incluem o ex-ministro da Cultura Pedro Adão e Silva, Francisca Carneiro Fernandes e a Comissão de Trabalhadores do CCB.
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