'Mein Kampf': O 'livro maldito' 92 anos depois

O livro que foi uma das pedras basilares da propaganda nazi foi publicado há 92 anos. Sobreviveu a proibições e atualmente continua a ser um 'best seller'.

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Notícias Ao Minuto
18/07/2017 14:30 ‧ 18/07/2017 por Notícias Ao Minuto

Cultura

Efeméride

É um dos livros que mais interesse suscita a nível mundial e em alguns países está mesmo entre os mais vendidos. 'Mein Kampf' (A Minha Luta), de Adolf Hitler, foi publicado exatamente há 92 anos, no dia 18 de julho de 1925.

O tempo não apagou nem vai apagar o horror perpetrado por Hitler e pela ideologia nazi, e a necessidade de compreender e saber mais sobre um dos períodos e uma das figuras mais marcantes da história tem gerado um renovado interesse em 'Mein Kampf', que é considerado por muitos como o livro mais odiado do mundo.

'Mein Kampf' não foi o título original escolhido por Adolf Hitler. O primeiro título era demasiado extenso, '4 anos e meio de Luta contra Mentiras, Estupidez e Cobardia. Uma Opinião'. Compreensivelmente foi alterado para um mais curto 'Mein Kampf'.

O livro está dividido em dois volumes. O primeiro volume de 'Mein Kampf' começou a ser escrito em 1924 na prisão de Landsberg am Lech, onde Hitler ficou preso na sequência da tentativa fracassada de um golpe de Estado conhecida como o 'putsch da cervejaria'.

Adolf Hitler não escreveu o primeiro volume do livro, ditou-o a Rudolph Hess, um dos seus companheiros da tentativa do 'putsch' e mais tarde uma das figuras mais relevantes do partido Nacional Socialista. O primeiro volume centra-se nas origens de Hitler e nos problemas que, de acordo com o seu autor, afetam a Alemanha: a derrota na Primeira Guerra Mundial e a subsequente "humilhação" sofrida pelos alemães às mãos dos Aliados que saíram vitoriosos. Um dos principais alvos de Hitler é a França, que desejava desmembrar a Alemanha, segundo o autor de 'Mein Kampf'.

Aqui surge uma das expressões que marca a ideologia nazi e o racismo que Hitler tencionava expandir, e que justificou a invasão dos países em redor da Alemanha e a expansão para o leste da Europa: lebensraum, o 'espaço vital', que Hitler considerava ser fundamental para a raça ariana poder viver. É neste primeiro volume que Adolf Hitler expõe a sua visão de uma liderança autoritária, que mais tarde marcaria o Terceiro Reich.

O primeiro volume foi publicado em 1925. As vendas não foram inicialmente positivas. No primeiro ano, foram vendidas mais de nove mil cópias.

O segundo volume de 'Mein Kampf' foi publicado em 1927, tendo sido escrito já depois de Adolf Hitler ter saído da prisão. Intitulado 'O Movimento Nacional Socialista', elabora o programa político do partido de Hitler, incluindo os métodos terroristas, que o nacional-socialismo deveria levar a cabo para subir ao poder e exercê-lo depois numa nova Alemanha, a do Terceiro Reich.

O livro continuou a não ser um 'best seller'. Uma situação que só se alterou com a ascensão do Partido Nazi em 1930. Dois anos depois, 'Mein Kampf’' já tinha vendido quase 230 mil cópias e foi fundamental para a propaganda nazi. Entre a ascensão ao poder de Hitler e 1944 já tinham sido vendidas mais de 12 milhões de exemplares.

Na Alemanha nazi, tornou-se obrigatório para os seguidores do Führer ter uma cópia de 'Mein Kampf'. Era um presente comum para se oferecer, uma prenda frequente até em casamentos.

Depois da vitória aliada na Segunda Guerra Mundial, os Aliados quiseram retirar 'Mein Kampf' de circulação e proibir novas publicações do livro. Acabaram por transferir os direitos do livro para o governo da Bavária, que usou os meios legais para impedir que fosse novamente publicado na Alemanha, com exceção das versões inglesas. No entanto, o livro foi publicado em diversas línguas e pode ser facilmente encontrado na internet.

Proibição ajuda a explicar interesse no livro

No último dia de 2015, o governo bávaro perdeu os direitos sobre 'Mein Kampf' e o Instituto de História Contemporânea de Munique decidiu publicar uma edição crítica da obra, que contextualiza as ideias de Hitler e o papel que a ideologia nazi teve no Holocausto. Mas a distribuição da edição original continua a ser ilegal.

O livro continua a ser dos mais vendidos atualmente. No primeiro ano em que voltou a ser publicado na Alemanha foram vendidas cerca de 85 mil cópias. Também em Portugal, a Guerra & Paz decidiu lançar uma nova edição (publicado em conjunto com outros dois 'livros malditos', o 'Manifesto Comunista', de Karl Marx e de Friedrich Engels, e o 'Pequeno Livro Vermelho', de Mao Tsé-tung), que foi um sucesso de vendas na Feira do Livro do ano passado, tendo mesmo esgotado.

Para Manuel S. Fonseca, administrador editorial da Guerra & Paz e autor de uma análise extensa a esta edição do 'Mein Kampf', o enorme interesse no livro pode ser explicado pela decisão de proibir a sua publicação. "Deu-lhe uma aura mais mitificadora, que o livro não merece, mas que ganhou através da proibição. Todas as proibições acabam por se tornar o fruto mais apetecido".

Manuel S. Fonseca considera que é sempre preferível a "discussão e a publicação" de temas tão relevantes como os gerados por 'Mein Kampf'. "Não é proibindo livros e proibindo opiniões ou tentando calá-las que elas desaparecem", dando o exemplo do que se passou em Inglaterra. "O livro nunca esteve proibido em Inglaterra, e lá não se verificou o que se verificou noutros países onde o livro surgiu após a proibição: não se verificou a conversão do livro num best seller".

O responsável editorial da Guerra & Paz também corrobora uma das opiniões mais comuns sobre o estilo de escrita de Hitler. "Não estamos no caso de Hitler perante um escritor de méritos no domínio da língua, nem no domínio da imaginação, nem da argumentação", ressalvando que os argumentos utilizados por Hitler na obra "não têm fundamentos de carácter económico, nem de carácter sociológico, nem de carácter antropológico".

"O livro é repetitivo, é nalguns casos extremamente maçador, muito menos brilhante do que aquilo que se dizia", afirma Manuel S. Fonseca. O oposto da retórica de Hitler que justifica em parte a sua ascensão. "A sua retórica forte levou-o de um soldado anónimo a um militante que chegou à liderança do Partido Nacional Socialista. Isso não é visível, no entanto, na escrita que é apagada, maçadora e monótona".

A História já nos ensinou por diversas vezes como é fácil repetirmos e cairmos nos mesmos erros do passado. Por isso, nem que seja por uma questão de compreensão e de melhor entender o que originou um dos períodos mais negros da nossa História, é de prever que o 'livro maldito' de Hitler continue a ser dos mais procurados e requisitados.

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