É um dos nomes mais recentes da música nacional, mas apesar de ter uma carreira ainda curta, já atuou em vários festivais, como no NOS Alive ou no Vodafone Mexefest. Fez um EP homónimo em 2015 e mais recentemente lançou o single ‘Canção para ti’, para apresentar o álbum novo que está programado para sair este ano.
Agora com 23 anos, agarra um novo desafio: o de competir no Festival da Canção 2018, a convite do vencedor do ano passado, e seu amigo próximo, Salvador Sobral.
Desde o seu amor à música - revelando as suas influências que vão do rock à bossa nova ou ao jazz - à surpresa que foi o convite para o Festival da Canção, passando pelo seu novo álbum e por um dos seus novos projetos, uma web series no YouTube chamada ‘Janeiro Sessions’, o Notícias ao Minuto foi conhecer Janeiro, não o mês, mas o cantor.
O teu nome é Henrique Janeiro. Porquê a escolha de ‘Janeiro’ apenas para nome artístico?
Tentámos encontrar algo mais impactante, um bocadinho mais marcante do que o nome completo e do meu nome todo achei que o nome mais sonante ali era Janeiro. Por exemplo, para cá vinha a ouvir [António] Zambujo e toda a gente lhe chama 'Zambujo' só, apesar de o nome profissional dele ser António Zambujo. Mas com o Rui Veloso por exemplo, isso já não acontece. Não sei, acho que acabou por ser uma escolha.
Como surge a música na tua vida?
Surge pelos meus pais, pela via da educação, de estar em casa e estar a ouvir o Caetano [Veloso], estar a ouvir Maria Bethânia, aí mais pela mãe. Diana Krall, também ouvia. O meu pai ouvia muito Rui Veloso, muito jazz, muita bossa nova, imenso rock. Ouviam os dois muito GNR.
Eu pedi uma guitarra. Mas não tinha noção de que tinha uma Fender na mão... na altura era um miúdo
Ainda tens a guitarra Fender Stratocaster que o teu pai te deu com 17 anos?
Sim, lembro-me perfeitamente que não quis ir à viagem de finalistas e o meu pai perguntou-me se havia outra coisa que me pudessem oferecer. Eu pedi uma guitarra e é aí que aparece a 'Strat'. Mas não tinha noção de que tinha uma Fender na mão... na altura era um miúdo, era uma guitarra igual à do John Mayer, mas agora dá-me jeito, aliás até gravei a canção do Festival com essa guitarra.
Quem são as tuas influências?
Oiço muita música internacional, apesar de escrever em português. Em termos nacionais, as minhas influências são mais na parte da lírica e das letras, o António Variações, e na parte das melodias, o Rui Veloso, que acho que é quem faz as canções mais bem feitas até agora em Portugal.
Mas internacionalmente oiço muito hip-hop, muito R&B. Sou completamente viciado em Frank Ocean, oiço muito John Mayer também. Depois tenho todas as referências do jazz mais antigas, a Ella [Fitzgerald], o Louis [Armstrong]..
© Arlindo Camacho
Estudaste musicologia na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) e Jazz no Hot Club, como é que isso acontece e como é que se misturam os dois na tua música?
Isto vem com ajuda da minha mãe. Quando ainda pensei em ir estudar economia ou gestão, disse-me: “não, tu vais estudar música”. Quando cheguei ao 12.º ano sabia tocar guitarra, fazia umas músicas e de repente os meus pais perceberam que eu precisava de ter ali um empurrão no sentido da música. Aí começámos a pensar que se calhar fazia sentido seguir essa via. Ainda fui ter aulas de música particulares para conseguir entrar na Escola Superior de Música de Lisboa (ESML), tive aulas de guitarra jazz, ainda em Coimbra, mas acabei por não conseguir, fiquei em quinto e só entram os três primeiros.
De repente, vim para Lisboa e tinha de ter um Plano B. Acabei por encontrar o curso de Musicologia, que me abriu imensas portas, que me fez estar em contacto com vários géneros diferentes e música de vários países. A música clássica foi importante para perceber a origem das coisas, mesmo querendo fazer pop temos de saber de onde veio tudo. Como o curso era muito teórico, quis ir estudar também noutro sítio onde pudesse continuar a estudar guitarra jazz. E como sou louco, pus-me a fazer os dois cursos ao mesmo tempo: o curso completo no Hot Club e o curso completo na FSCH.
Festival da Canção.. “Como lidas com tal coisa? O coração parou?”
Não, não parou, mas ficou surpreso, ficou muito surpreso, não estava à espera que ele [Salvador] me convidasse, fiquei muito admirado.
A minha reação foi: "Porra, ele [Salvador Sobral] está-me a convidar para o Festival da Canção. Têm noção da importância disto?!"Onde estavas quando o Salvador te disse que eras a escolha dele? Como foi?
Estava na Arrábida com uns amigos, alguns amigos dele também. Ele liga-me e a minha reação foi: “Porra, ele está-me a convidar para o Festival da Canção. Têm noção da importância disto?!”
E tu tinhas essa noção?
Tinha, porque o acompanhei no Festival anterior e comecei a perceber. Não tinha antes de ver o Festival de 2017, como não afetou a minha geração não percebia a relevância. Mas depois aceitei logo.
Inicialmente ias apenas compor. Porque é que decidiste ser também o intérprete da música?
Foi a canção em si. Compus a canção quando estava de férias no sul de França com os meus pais, foi uma experiência ótima, super paradisíaca e isso também me inspirou. A canção surge aí e depois começou a puxar para que eu a cantasse e se a canção está a pedir não vale a pena contrariar.
Sentes haver uma responsabilidade acrescida por teres sido o compositor escolhido do Salvador Sobral, o vencedor da Eurovisão do ano passado?
Acho que é óbvia, acho que toda a gente sente um bocado a responsabilidade e o peso que ele criou ali. Porque além de ter ganho a própria Eurovisão, conseguiu juntar muita coisa bem, falou muito bem sempre, não deixou que nada lhe passasse por cima, a própria canção era super sofisticada. Tudo super genuíno e isso consigo dizer com certeza, porque acompanhei tudo com ele. Por isso, claro que é uma responsabilidade grande. Mas não estou preocupado, estou a deixar a coisa acontecer, porque quero é que ele fique orgulhoso da minha canção.
Já teve hipótese de a ouvir?
Já, já. Ficou super surpreendido, gostou imenso.
O que se pode esperar de ‘(sem título)’?
É uma canção assim... tranquila. Que promove muito a união entre as pessoas.
Porquê o nome ‘(sem título)’? Foi composta especialmente para o Festival?
Preferia explicar isso mais à frente, depois de a cantar. Mas sim, fiz a canção de propósito para o Festival, não queria pegar numa canção que já tivesse. Claro que posso ter pegado em motivos melódicos que já tinha de arranjos anteriores, mas queria criar uma canção especialmente criada para aquele momento.
Quero mostrar exatamente o que sou enquanto artista, apesar de ser difícil, porque eu ramifico-me imenso, em coisas muito variadasAtuas na primeira semifinal, que Janeiro vamos encontrar no Festival da Canção? Como estás a preparar-te?
Bem, estou a preparar tudo, o cenário, a roupa, a canção. E vamos encontrar o Janeiro igualzinho. A minha ideia é fazer algo que me identifique ao máximo, quero mostrar exatamente o que sou enquanto artista, apesar de ser difícil, porque eu ramifico-me imenso, em coisas muito variadas. Mas isso é bom, porque vivo assim também, sem nunca perceber bem o que quero, com as mulheres, com a vida e com tudo. Por isso até acho estranho haver músicos que consigam estar a fazer discos todos muito iguais. Eu não consigo, de repente tenho de ir fazer um ‘beat’, juntar um instrumento diferente ou juntar uma banda.
Dizem que o teu registo tem semelhanças com o do Salvador, achas que isso desempenhou um papel importante para que te escolhesse?
Não sei, eu acho que ele não sente isso. Obviamente que ele conhece as minhas referências, mas acho que não foi determinante. Claro que depende da perceção auditiva de cada um, mas fazemos música muito diferente, ele faz jazz mais pop e eu faço pop.
Disseste numa entrevista que gostavas muito de atuar e encher o Altice Arena, se conseguires chegar à Eurovisão, consegues fazer com que isso se concretize. É uma motivação extra para ganhares o Festival da Canção?
Acho que o sonho é tocar para muita gente. Claro que tenho esse sonho estar com uma guitarra ou com um piano num palco e toda a gente estar a cantar a minha canção comigo, deve ser a melhor sensação. Adorava sentir isso. As pessoas todas conhecerem uma obra que tu fizeste e que tu criaste, uma coisa tua, refletida nas pessoas todas. A Eurovisão pode dar-me isso, claro, mas não sei se será da forma que eu quero. Era bom, mas gostava de conquistar as pessoas pelas minhas canções e ir fazendo o meu caminho também. Não deixa de ser um ‘fast line track’, mas não é uma motivação extra. A motivação está na canção e na forma de fazer as coisas, no poder transformativo da arte, que é poder tocar as pessoas de uma forma que se calhar nunca o foram antes, quer estética, quer musicalmente. Esse é o objetivo.
Não tenho nada o sonho de ir à Eurovisão, nem de ganhar o Festival da Canção. Se não ganhar não é uma coisa que me entristeçaA Eurovisão era um sonho ou tornou-se num sonho inesperado?
Não tenho nada o sonho de ir à Eurovisão, nem de ganhar o Festival da Canção, agora estou preocupado com o meu álbum. Claro que é importante ir lá e não retiro nada a importância do Festival, para a minha carreira até pode ser bom, mas se não ganhar não é uma coisa que me entristeça. Claro que se acontecer vou abraçá-lo da melhor forma que conseguir, mas não é uma vontade, não é um objetivo.
Mas agora agora que estás no Festival da Canção e que sabes que se ganhares vais ter de ir representar o teu país à Eurovisão, há uma esperança de ganhar ou não?
O objetivo não é ganhar. É ir mostrar a canção como ela é e ir mostrar quem sou enquanto artista. Agora se as pessoas agarram a canção, se gostam dela, se a canção 'explode' no Spotify ou se ‘rebenta’ no YouTube, não me interessa. O resultado é um bocado irrelevante. Quanto ao peso de defender o meu país na Eurovisão, vou pensar como vou lidar com isso na altura, como faço com tudo na minha vida, tudo a seu tempo.
Como é compor para competir ao lado de nomes da música portuguesa como Fernando Tordo, Jorge Palma ou José Cid, entre outros?
Não tem peso nenhum, não tem relevância nenhuma. A canção foi feita sem pensar em nada disso. Obviamente que tenho sempre vontade de ter fatores de diferenciação, mas isso também acontece com o meu álbum e com a minha forma de ser como artista, porque sou 'puto' e tenho essa coisa de querer fazer diferente das outras pessoas, de fazer novo e fresco. Mas fiz a canção como faria para um álbum meu, não há qualquer peso associado. Claro que depois quando lá estiver com eles já vai ser diferente, mas isso não pode influenciar o processo de composição, nem de interpretação, pelo menos espero que não.
© Arlindo Camacho
Depois de teres lançado um EP em 2015, o teu primeiro álbum, de onde faz parte o single ‘Canção para ti’, está previsto para este ano. Já há previsão de quando o vais lançar?
Acho que o EP era muito mais para dentro, muito mais introspetivo e com o single mostro muito mais de mim. O álbum ainda não está terminado, está quase, em princípio sai depois do Festival. Não sei quando ainda, mas no primeiro semestre vai ser de certeza.
A minha ideia é que mesmo que alguém oiça um blues e depois uma balada clássica a seguir, consiga sentir a minha marcaO que esperas trazer com esse álbum?
O novo álbum, vai ser desfragmentado, vai ter uma linha condutora, mas vai ser muito variado. A minha ideia é que mesmo que alguém oiça um blues e depois uma balada clássica a seguir, consiga sentir a minha marca. Quero uma abordagem fresca às canções, músicas pop em português, com letras que expressam vivências minhas, com instrumentos novos. Mas o meu objetivo é chegar ao máximo de pessoas e que as pessoas gostem.
Como surgiu a ideia de criar uma web series no Youtube, as ‘Janeiro Sessions’?
Sinto que quando se lança um single, com um videoclipe, as pessoas ficam com aquela imagem apenas. Uma imagem que não representa tudo o que tu és, é apenas uma pequena parte. Então queria criar um porto de abrigo, um sítio onde posso mostrar como sou genuinamente, juntar pessoas que admiro para estarem comigo no sofá, numa conversa natural, estar o máximo à vontade, estar tranquilo e acho que isso é uma boa forma de mostrar quem sou.
Toda a sociedade cria limites em nós, jaulas, que nos dizem o que temos e não temos de fazer. Quanto mais puder quebrar essas barreiras melhor
Já lançaste três episódios e os primeiros convidados foram de luxo (Miguel Araújo, Ana Bacalhau e Salvador Sobral). O que podemos esperar para os próximos?
É esperar. Ainda não tenho data para o próximo, não quero ter essa responsabilidade acrescida. Gosto de não ter datas, sinto que quando se cria uma data isso vai influenciar o processo natural, faz com que se forcem as coisas. Inicialmente pensei lançar um por mês, mas depois percebi que não tinha de o fazer. Criamos barreiras, toda a sociedade cria limites em nós, jaulas, que nos dizem o que temos e não temos de fazer e realmente não pode ser assim. Por isso quanto mais puder quebrar essas barreiras melhor.
Veja abaixo o videoclipe do single 'Canção para ti':