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Surf no meio dos tubarões? "A maior aventura da minha vida"

Em entrevista exclusiva ao Desporto ao Minuto, Nic Von Rupp relatou a mais recente experiência nos Estados Unidos da América, marcada pela adrenalina de estar a 150 quilómetros da costa da Califórnia, bem como o perigo de estar junto da vida marinha pouco habituada à presença de seres humanos, naquela que foi "a maior aventura" da carreira.

Notícia

© Instagram Nic Von Rupp

Miguel Simões
17/01/2023 07:25 ‧ 17/01/2023 por Miguel Simões

Desporto

Exclusivo

Nic Von Rupp é um nome incontornável no panorama do surf português e, na passada sexta-feira, teve a oportunidade de surfar a mítica Cortes Bank, onda a 150 quilómetros de distância da costa da Califórnia, naquela que considera ter sido "a maior aventura da carreira".

Em conversa com o Desporto ao Minuto, o surfista português detalhou tudo o que presenciou na mais recente experiência nos Estados Unidos da América, numa prova marcada pela adrenalina de estar longe da costa e pelo receio provocado pela presença de vários tubarões junto de todo o núcleo de ação.

Para que tal aventura se concretizasse muito contribuiu o cancelamento de uma prova no Havai, sendo que, na sequência disso, a equipa de filmagens da série "100 foot wave", dedicada às grandes ondas a partir da Nazaré, decidiu embarcar para a tão desejada Cortes Bank.

"Inicialmente fui convidado para o torneio de Eddie Aikau, um campeonato muito prestigiado no Havai. Eles deram luz verde para o campeonato acontecer, focámo-nos no evento e, entretanto, cancelaram tudo. É algo que já existe há 40 anos, mas só ocorreu nove vezes. Estávamos no Havai e essa ondulação grande manteve-se numa altura em que estávamos em filmagens para a segunda e terceira temporada da '100 foot wave' da HBO, que é uma série dedicada às ondas grandes, à procura da onda de 100 pés", começou por descrever, antes de esclarecer o marco da Cortes Bank por comparação à Nazaré: "Acontece que a equipa da HBO organizou esta viagem para Cortes Bank, que é uma onda icónica no mundo do surf. Antes da Nazaré, a Cortes Bank era a maior onda alguma vez surfada, de 166 pés".

Notícias ao Minuto Nic Von Rupp teve a companhia de grandes nomes do surf mundial na viagem até aos Estados Unidos da América.© João Bala  Da logística ao perigo de uma grande aventura

Surfar junto à costa marítima não é o mesmo do que fazê-lo a dezenas ou centenas de quilómetros da terra e, nesse sentido, Nic Von Rupp não hesitou em esclarecer a diferença entre ambas as experiências. 

"Nas ondas grandes da Nazaré, estamos a cinco minutos da costa. A Cortes Bank acontece no meio do mar, em que demoramos dez horas para chegar de barco. Juntou-se uma equipa de filmagens e de segurança que fez com que esta viagem acontecesse e foi uma loucura. Ter nove motas de água, trinta pessoas num barco de dez metros e ainda os custos que isso envolveu é uma viagem que nunca imaginei que pudesse concretizar", detalhou.

"Estando a 150 quilómetros de distância de uma costa, não temos referência de onde estamos muito bem. As ondas estão constantemente a mudar de um lado para o outro. A Cortes Bank é basicamente uma montanha aquática e é isso que forma a onda. Normalmente temos uma referência. Quando estamos no meio do mar torna-se mais difícil fazer a análise", acrescentou de seguida, antes de classificar a onda como um "monstro escondido" no mar: "Para mim, como surfista, é aquela onda que eu apenas sei que existe. É aquele 'monstro escondido' a 150 quilómetros da costa da Califórnia, no meio do mar. Nunca pensei que alguma vez iria surfar essa onda pela logística que requer".

É uma loucura. Olhamos para a esquerda e não vemos nada. O mesmo para a direita. Só se vê ondas e a vida marinha a passar por nós, como os tubarões.

Numa viagem em que esteve acompanhado por grandes nomes do surf como Garret McNamara, "o impulsionador que já tinha estado na zona há dez anos", e ainda Lucas Chumbo e Justin Dupont, outros surfistas que têm passado pela Nazaré, Nic Von Rupp considerou ter sido especial "partilhar emoções" com esses surfistas e detalhou o perigo rodeado pela vida marinha.

"É uma loucura. Olhamos para a esquerda e não vemos nada. O mesmo para a direita. Só se vê ondas e a vida marinha a passar por nós, como os tubarões. Não é o Oceano Atlântico, é o Pacífico, principalmente ali no triângulo encarnado, como eles lhe chamam, como sendo a zona com mais tubarões junto dos Estados Unidos da América", começou por detalhar.

"O barco não tinha capacidade para tantas pessoas, não tinha camas. Muitas pessoas dormiram ao relento, entre as pranchas e as motas de água. Tudo isto para cumprir um objetivo. Quando chegámos lá de manhã, ver a onda à distância sem ventos parecia mesmo que estávamos a viver um sonho. Os primeiros a chegar viram uma cabeça de um atum, do tamanho do meu corpo, que tinha acabado de ser comido por um animal maior que o próprio atum, em que até se via o sangue na água", contou.

Notícias ao Minuto Uma das muitas ondas surfadas pelos aventureiros no passado dia 13 de janeiro.© Bill Sharp  

"Mais tarde ainda vimos um tubarão branco com cerca de seis metros, num momento em que estávamos à espera de mais ondas. É daquelas coisas que realmente assustam. Já estamos assustados com o tamanho das ondas e depois pensamos no perigo de podermos ser atacados por tubarões. É uma aventura e uma descoberta. Lá está, a tal questão da adrenalina e da loucura. Correu tudo bem, graças a Deus. Surfámos das melhores ondas das nossas vidas e voltámos intactos", vincou entre sorrisos.

Adrenalina venceu o medo?

Questionado se chegou a temer pela vida em algum momento, o surfista português de 32 anos não hesitou em responder afirmativamente, em situações em que as pessoas tendem a ficar "com o coração nas mãos", mas destacou que a adrenalina... superou o medo. Daí nasceu "a maior aventura" da carreira.

"Se temi? Sem dúvida. Estamos constantemente a temer pela vida. É uma realidade em que as coisas podem correr mal a qualquer momento. Estamos a lidar com ondas enormes e com uma vida marinha que não está habituada a ter humanos por perto, dado que estamos longíssimo da costa", frisou.

"A última vez que esta onda foi surfada aconteceu há dez anos. Tubarões há em todo o lado, mas quando as ondas são constantemente surfadas a vida marinha acaba por se adaptar. Não é o caso. Ficamos com o coração nas mãos ao surfar ondas daquele tamanho e a lidar com tubarões. Nós tentamos ignorar esse temer. A nossa adrenalina e vontade de superar esse medo é superior ao próprio receio", esclareceu ao assinalar que "foi das maiores ondas surfadas" apesar de presenciar outras ainda maiores na Nazaré.

"Foi sem dúvida a maior aventura da minha vida. Sem dúvida alguma. Isto é uma onda que quebra uma vez a cada década. Acho que poucos surfistas concretizaram tal sonho. O facto de eu ser um dos poucos europeus que alguma vez conseguiu tal objetivo já mostra esse lado da aventura. Vamos lá ver se volta a acontecer", atirou antes de enaltecer a prática de surf em território português.

Portugal com "berço de ouro" para o surf

Desafiado a explicar o gosto pela exploração das maiores e mais pesadas ondas do mundo, Nic Von Rupp ilustrou o célebre exemplo português, realçou "a mina de ouro" para quem pretende explorar tal vertente e descreveu um pouco do seu percurso.

"Nós em Portugal temos uma grande vantagem, dado que temos das maiores ondas do mundo. Crescemos num berço de ouro, por assim dizer. Puxamos constantemente os nossos limites desde infância. O percurso de surfar ondas grandes, para mim, foi sempre muito natural. Desde os 15 anos procurei sempre pelas grandes aventuras. Esta vontade de explorar ondas maiores já se arrasta há muito", afirmou.

"Comecei a surfar ondas maiores na Ericeira e passei para a Nazaré, que acaba por ser o melhor campo de treinos do mundo. Os surfistas que estavam nesta aventura têm como principal base de treino a Nazaré, mesmo sendo brasileiros, franceses ou americanos. Para quem tem vontade de explorar essa vertente, tem ali a mina de ouro", destacou, antes de fazer a associação desse "pormenor" aos participantes da mais recente aventura: "As pessoas que dedicam a vida à Nazaré acabaram por ser convidadas para fazer esta aventura nos Estados Unidos da América".

Notícias ao Minuto Surfista português mantém-se focado depois da grande aventura nos Estados Unidos da América.© Bill Sharp  

Por fim, Nic Von Rupp foi desafiado a mencionar sonhos por realizar na modalidade e a resposta não poderia ter sido mais taxativa.

"No ano passado tive das melhores temporadas da minha vida. Surfei a terceira maior onda do ano e o objetivo continua o mesmo, o de surfar a melhor onda do mundo. E realmente essa onda pode estar à porta de casa. É continuar a fazer estas explorações, em busca da onda de 100 pés, é um mito e um 'monstro' que anda por aí. É esse o objetivo", concluiu.

Leia Também: Surfista portuguesa Francisca Veselko campeã mundial de juniores

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