"O que dá segurança quando tudo o resto falha é o dinheiro no bolso"

Entrevistámos o administrador da Unicâmbio, Carlos Lilaia.

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Patrícia Martins Carvalho
06/08/2019 08:50 ‧ 06/08/2019 por Patrícia Martins Carvalho

Economia

Entrevista

 

A Unicâmbio nasceu há 27 anos e logo conquistou o mercado português. Agora, a aposta da empresa portuguesa é a internacionalização da marca, até porque já não há muito mais margem para crescer em território nacional.

A operar em Angola desde 2016, a mais antiga agência de câmbio portuguesa chegou este ano a Marrocos, mais precisamente ao Aeroporto Mohammed V, em Casablanca. Mas não pretende ficar por aqui.

Carlos Lilaia, o administrador da empresa portuguesa, não quer revelar quais os próximos destinos de implementação da marca, pois ainda decorrem os respetivos concursos, mas deixou claro que o objetivo é o de continuar a crescer fora de Portugal.

Quanto ao Brexit, o responsável confessa que a decisão em torno da saída do Reino Unido da União Europeia tem estado a prejudicar a atividade da Unicâmbio, não só no que à compra e venda da libra diz respeito, como também à abertura de atividade em solo britânico, pese embora a empresa já esteja “criada e devidamente licenciada”.

Por fim, Carlos Lilaia deixou ainda conselhos aos portugueses que viajam para países que não pertencem à zona euro. 

A Unicâmbio foi criada em 1992. Como é que surgiu esta ideia há 27 anos?

Surgiu quando fui desafiado para constituir uma empresa na área dos câmbios na sequência da abertura aos privados da atividade de câmbios, que até aí estava interdita desde as nacionalizações de 1975. É no fundo a resposta a uma oportunidade criada por um decreto-lei que voltou a liberalizar a atividade de câmbios em Portugal.

Num mercado de permanente mutação, na Europa e no Mundo, qual é a estratégia da Unicâmbio?

Quando criámos a empresa orientámo-nos para zonas turísticas e foi por isso que abrimos a primeira localização no Algarve, mais propriamente na ponte sobre o Guadiana onde, de um lado comprávamos e do outro lado vendíamos pesetas. Continuámos a expandir no sentido das zonas turísticas do Algarve e em 1995 fomos para o Funchal, na Região Autónoma da Madeira.

Há depois um ‘salto’ com o Banco de Portugal a permitir a transferência de dinheiro às agências de câmbio.

Sim. Em 2002, começámos a atividade de transferência de dinheiro como agentes da Western Union e é nesse momento que começamos a entrar também noutras localizações que complementavam o câmbio com as transferências de dinheiro.

As transferências de dinheiro também terão tendência para diminuir e desacelerar o seu processo de crescimento, porque a entrada de imigrantes chegará a um ponto que ficará limitada e esse ponto não está muito distanteQuando foi aberto o primeiro balcão da Unicâmbio?

Em 1998 na Gare do Oriente em plena Expo’98 e, uns meses mais tarde, abrimos também na Praça da Figueira que ainda hoje é um ícone e um dos nossos balcões mais importantes. Depois dá-se a expansão a Norte. Atualmente temos o Litoral mais ou menos coberto com uma rede de 80 balcões que vai desde a Póvoa de Varzim até Olhão, incluindo a Região Autónoma da Madeira.

Quando é reconhecido que é o momento de avançar para uma internacionalização da empresa?

Em 2014, quando lançámos o cartão pré-pago de múltiplas divisas – que é possível carregar simultaneamente com cinco divisas (dólar, euro, real brasileiro, franco suíço e libra). Nessa altura percebemos que havia poucas possibilidades para os produtos internacionais da Unicâmbio continuarem a crescer em Portugal em termos de câmbios e de transferência de dinheiro. Aí, naturalmente, começámos a pensar em novos mercados, até porque as transferências de dinheiro também terão tendência para diminuir e desacelerar o seu processo de crescimento, porque a entrada de imigrantes chegará a um ponto que ficará limitada e esse ponto não está muito distante.

Qual foi o primeiro mercado internacional a ser explorado?

O angolano. Angola foi o primeiro país onde abrimos uma empresa e começámos a atividade, mais concretamente no ano de 2016.

E mais recentemente chegaram a Marrocos.

Sim, em 2018 ganhámos o concurso internacional no Aeroporto de Casablanca e a partir de finais de março deste ano iniciámos a atividade em Marrocos. Agora estamos a ver outras possibilidades dentro deste quadro de internacionalização.

Quais serão as novidades deste ano?

É possível que haja surpresas até ao final do ano. Neste momento estamos em fase de outros concursos internacionais que ainda não sabemos se se concretizarão até ao final deste ano.

Quais são os próximos mercados que pretendem atingir?

Temos sempre uma orientação que está sujeita a alguns vetores importantes. O primeiro é o dos países de expressão portuguesa, que naturalmente está muito ligado às transferências de dinheiro e são mercados nos dois sentidos. Depois, são os outros países da diáspora portuguesa, como é o caso da Suíça e do Reino Unido e outros; e há a oportunidade que se abriu com o ganhar do concurso em Marrocos que é um país que está neste momento com um forte crescimento no turismo e mesmo em termos globais.

Nós temos duas ou três empresas nesta área com significativa importância mas, de facto, a Unicâmbio é a incontestável líder de mercadoComo está a correr o negócio com a Worldwide, que vos permitiu entrar no mercado de turistas chineses?

Tem corrido muito bem e até está um bocadinho acima das nossas expetativas, porque temos neste momento um mês de atuação e temos estado a firmar alguns contratos com grandes operadores. Portanto acho que é um projeto de futuro, para ficar e para dar um contributo muito importante naquilo que é o conjunto das atividades da Unicâmbio.

A expansão ao continente asiático é um objetivo?

A Ásia não está nas nossas preocupações mais imediatas. A nossa relação com a Ásia faz-se muito aqui dentro de Portugal, por isso é que criámos essa possibilidade com a Worldwide. Temos tido uma boa recetividade relativamente aos clientes que vêm do continente asiático e que se repercute ao nível dos aeroportos, mas também muito associado ao turismo de compras porque nós, para além das trocas cambiais, fazemos também um reembolso do IVA.

O que tem a vossa solução de inovador em relação ao que já existe no mercado em termos de terminais de pagamento digitais?

Tem particularidades muito interessantes. Por um lado, a aceitação dos cartões Alipay que abrange o mercado chinês e também a atitude de partilha com as margens cambiais relativamente aos nossos clientes, o que é de facto uma novidade sobretudo com a generosidade com que o fazemos.

A concorrência preocupa-o?

Nós temos duas ou três empresas nesta área com significativa importância mas, de facto, a Unicâmbio é a incontestável líder de mercado e essas questões de concorrência não nos afetam.

Porquê? Estão um passo à frente dos concorrentes?

Por exemplo, o cartão pré-pago fomos nós que o introduzimos em 2014 e só agora recentemente é que uma empresa dessa área lançou um cartão muito idêntico ao nosso. Relativamente aos sistemas de pagamento também é mais uma atitude inovadora da Unicâmbio.

Basta andar pelo Algarve para vermos que começa a haver sérias dificuldades, particularmente com os turistas ingleses e aqueles que eram residentes cá e os que não eram e que adiaram a decisão de viremQue análise faz do Brexit em termos de consequências para o negócio?

Para a Unicâmbio Portugal eu diria que tem sido uma má experiência com consequências a vários níveis. Por um lado, esta indecisão em relação ao Brexit leva a que não sejam tomadas decisões atempadamente. Por outro, e decorrente do próprio Brexit, estamos a verificar que se tem acentuado nos últimos dias uma desvalorização da libra.

Quais são as consequências diretas desta situação?

Isto retrai as trocas e naturalmente pesa na decisão de quem nos visita, criando dificuldades porque os preços da hotelaria em Portugal ficam cada vez mais caros para cidadãos britânicos. Estas questões afetam a nossa atividade e devo dizer que neste momento estamos a sentir isso. Basta andar pelo Algarve para vermos que começa a haver sérias dificuldades, particularmente com os turistas ingleses e aqueles que eram residentes cá e os que não eram e que adiaram a decisão de virem. Há um conjunto de aspetos que não são nada positivos, nem para a nossa atividade, nem para a economia em geral.

É por isso que ainda não iniciaram atividade no Reino Unido?

Nós temos constituída uma empresa no Reino Unido devidamente licenciada e pensamos iniciar atividade brevemente, mas é uma decisão que está um pouco dependente de como vai evoluir esta situação do Brexit e de todas as consequências que daí podem advir.

Para mim tenho que existirá pouca adesão da área da compra e venda de moeda às moedas virtuais, mesmo que se resolvam todos esses problemas de regulação que ainda estão pendentesTemos assistido a um crescente aumento do número de moedas virtuais. Qual é o posicionamento da Unicâmbio em relação à moeda digital, como a Bitcoin ou a Libra do Facebook?

Isso é algo que, muito sinceramente, nos passa completamente ao lado. Não vamos entrar nesse campo nos próximos tempos enquanto elas não estiverem devidamente regulamentadas por quem de direito, o Banco de Portugal. Mas para mim tenho que existirá pouca adesão da área da compra e venda de moeda às moedas virtuais, mesmo que se resolvam todos esses problemas de regulação que ainda estão pendentes.

Mas acha que pode vir a ser uma ameaça à atividade da Unicâmbio?

Sinceramente, não.

Podem inventar-se todas as soluções possíveis no âmbito da economia digital, mas a única coisa que de facto dá segurança quando tudo o resto falha é o dinheiro que temos no bolso O caminho passará pela extinção do dinheiro vivo?

Acho que não. Naturalmente que, seguindo as tendências, é óbvio que o peso vai sendo sucessivamente reduzido, mas chegar-se-á ao momento em que o peso não baixa mais.

Por que não?

Porque podem inventar-se todas as soluções possíveis no âmbito da economia digital, mas a única coisa que de facto dá segurança quando tudo o resto falha é o dinheiro que temos no bolso.

No verão aumentam as viagens para o estrangeiro. Com base na troca de moeda, quais são os destinos para fora da zona euro mais procurados?

Temos as moedas tradicionais que se vendem sempre ao longo do ano e que são o dólar, a libra, o franco suíço, o real brasileiro e o dólar canadiano e mesmo nestes períodos de verão têm mais peso do que as outras. Depois, ao nível das compras que nos fazem das outras moedas e, nomeadamente das moedas exóticas, o que notamos é que tem havido um crescimento de compra de divisas de Marrocos, República Checa, Hungria, Croácia, Cabo-Verde. Mas o que notamos também é que nos últimos dois ou três anos há destinos que estão muito em alta.

Que destinos são esses?

A Indonésia, o Vietname, o Cambodja, os Emirados Árabes Unidos e Singapura. Nestes notamos acréscimos muito significativos. Pese embora que todas as outras moedas vão tendo um peso também interessante nesta altura do verão e das férias.

Que cuidados devem as pessoas ter quando viajam para países de fora da zona euro?

A sugestão que eu daria é levarem sempre algum dinheiro de bolso da moeda desses países porque, muito embora possam levar os cartões de débito e crédito, nunca se sabe se o cartão funciona, se há algum problema com esses meios de pagamento. É uma forma de se prevenirem para qualquer eventualidade.

Consegue quantificar a moeda trocada ao longo de um ano?

São centenas de milhões de euros. 

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