Estado da Nação: Lay-off não pode perpetuar fragilidade dos precários

O investigador Filipe Lamelas considera que o recurso ao 'lay-off' poderá continuar depois da pandemia de covid-19, mas não deverá servir para aumentar as fragilidades dos trabalhadores com vínculos precários.

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Lusa
22/07/2020 23:23 ‧ 22/07/2020 por Lusa

Economia

Filipe Lamelas

"O regime de 'lay-off' não pode colocar os trabalhadores com vínculos precários numa situação de ainda maior fragilidade (como sucede atualmente ao impedir-se a renovação desses contratos quando haja recurso ao 'lay-off')", pode ler-se nas notas conclusivas de um artigo de Filipe Lamelas sobre esta medida laboral, publicado no dossiê do ISCTE "O Estado da Nação e as Políticas Públicas 2020", coordenado por Ricardo Paes Mamede e Pedro Adão e Silva.

O investigador defende que devem "ser criados mecanismos no sentido de aproximar o âmbito de proteção destes trabalhadores aos demais (e não o contrário), nomeadamente procedendo à suspensão da contagem dos prazos dos contratos de trabalho a termo e do período experimental, determinando, paralelamente, a impossibilidade de cessação do contrato nestas situações, tal como sucede com os vínculos permanentes".

O assistente de investigação no CoLabor - Laboratório colaborativo para o Trabalho, Emprego e Proteção Social, considera que "é fácil prever que a massificação do recurso ao 'lay-off' no contexto da presente crise poderá dinamizar, no futuro, a utilização desta figura como efetiva alternativa aos despedimentos por razões objetivas, promovendo assim a proteção do emprego".

Para tal, o também doutorando em Políticas Públicas no ISCTE antecipa que será "imperioso proceder a uma reforma legislativa profunda" quanto ao 'lay-off', "particularmente quando este contexto excecional for ultrapassado", de forma a evitar problemas.

Filipe Lamelas considera ainda que "a aferição da manutenção do nível de emprego não pode ter como referência inicial o momento do recurso ao 'lay-off'", tendo de ser contabilizado num momento anterior, "sob pena de virmos a verificar uma ocorrência substancial de cessações de contratos", por parte das empresas, imediatamente antes da adoção do 'lay-off'.

"É igualmente importante que a proteção do emprego não seja circunscrita a um par de meses após o termo dos apoios relativos ao 'lay-off', sob pena de, na prática, a segurança social estar a financiar futuros despedimentos por razões objetivas", defende o investigador.

Numa nota de diagnóstico anterior ao artigo de Filipe Lamelas, elaborada pelo economista Ricardo Paes Mamede, o professor no ISCTE titula que a "instabilidade continua a ser a característica central" do emprego em Portugal, com "grandes oscilações ao longo das últimas duas décadas".

Se o "momento mais favorável" para o emprego se verificou na viragem do século, com uma taxa de desemprego de 4% em 2000 e 2001 e volume de emprego a abranger 4,9 milhões de pessoas (em 2002), "a partir daí, a situação deteriorou-se gradualmente até 2008".

Com as crises (financeira global, zona euro e implementação do programa de ajustamento em Portugal) verificou-se uma "quebra acentuada do emprego e rápido aumento do desemprego até 2013", ano em que o volume de emprego tinha caído para 4,4 postos de trabalho e 16,2% da população ativa no desemprego, segundo o economista.

Até 2019, a taxa de desemprego baixou até aos 6,5% e o volume de emprego subiu para os 4,9 milhões de pessoas, mas "a retoma dos salários foi mais lenta", e o rendimento médio mensal líquido, em termos reais, "só em 2017 regressou aos níveis do início da década".

"O aumento das remunerações foi mais pronunciado nas profissões onde os salários médios eram à partida inferiores (em especial, no caso dos trabalhadores não qualificados), sugerindo que a política de aumento do salário mínimo a partir de 2015 teve aqui um papel central", refere Ricardo Paes Mamede, assinalando também o aumento dos salários médios em 2018 e 2019, respetivamente, de 2,7% e 2,0%.

No entanto, a percentagem de trabalhadores com contratos permanentes em 2018 (78,0%) era ainda menor à de 2013 (78,6%), o que "sugere que a retoma do emprego verificada a partir de 2013 não se traduziu num maior volume de relações de trabalho mais estáveis", apesar de um aumento para 79,2% em 2019.

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