A falta de semicondutores já levou a paragens de produção na Bosch, em Braga, ou na Autoeuropa, só para citar alguns exemplos.
Os semicondutores abrangem um espectro muito alargado de coisas, que vão desde o pequeno sensor do automóvel que apita até ao processador que está dentro de um 'smartphone', entre outros.
A cadeia de fornecimento global de semicondutores divide-se, essencialmente, em dois pontos: os Estados e a Europa são os "locais onde é feito muita da investigação e desenvolvimento, o desenho do circuito, toda a componente do design", enquanto a produção - já que é um negócio de escala - está concentrada na China (baixa e média complexidade), Coreia do Sul e, em particular, em Taiwan, onde estão os 'chips' mais avançados, explicou o responsável da Boston Consulting Group (BCG).
"Taiwan tem a particularidade importante" de ter a TSMC - Taiwan Semiconductor Manufacturing Company, que "é reconhecidamente uma empresa que tem 10 anos de avanço em termos tecnológicos face a qualquer produtor de semicondutores", acrescentou.
Ora, neste aspeto, existe uma "questão geopolítica em termos de semicondutores", uma vez que a China tem uma "visão de 'one-China', da qual Taiwan faz parte", prosseguiu. Isto significa que se Pequim invadisse Taiwan - "apesar de pouco provável, é possível" -, os Estados Unidos "ficariam geograficamente reféns de uma super potência numa área que é absolutamente crítica".
Taiwan é responsável pela produção de 92% dos semicondutores avançados e a Coreia do Sul pelos outros 8%.
No que respeito à procura de semicondutores, José Ferreira adiantou que a pandemia de covid-19 foi um dos fatores que levou à escassez, com o aumento de aquisição de 'laptops', de consolas, aquisição de dispositivos inteligentes para a casa, entre outros.
Outro dos fatores foram as 'bitcoins' (criptomoedas). "Para minar 'bitcoins' é preciso processadores e com esta especulação houve uma procura brutal por processadores", prosseguiu.
E, portanto, "'chips', que eram usados em veículos elétricos, consolas de jogos, computadores, começaram a ser montados para fazer 'mining bitcoin' e isso está a fazer pressão na cadeia" de fornecimento, apontou.
Aliás, a pressão é tal que houve alguns produtores de semicondutores para consolas que implementaram restrições nos seus 'chips' para evitar que sejam utilizados em outras operações, contou.
O terceiro fator, acrescentou José Ferreira, "tem a ver com uma procura estrutural que está a aumentar", impulsionada pleas 'smart cities' [cidades inteligentes], IoT [Internet das Coisas], veículos elétricos, entre outros.
Por último, a procura de semicondutores também foi afetada por um "fator puramente logístico: a cadeia de fornecimento está sob pressão por questões de tarifas e o tráfego marítimo teve problemas devido à covid-19".
A curto prazo, "vai aumentar um aumento de preços, os carros ou os 'smartphones' vão ficar mais caros", considerou, admitindo que o efeito preço devido ao desequilíbrio entre a procura e oferta vai "provavelmente ser absorvido pelo consumidor".
E com o advento da quinta geração (5G), a pressão sobre a procura vai continuar.
No entanto, José Ferreira espera que possa haver um alívio nesta pressão da procura, nomeadamente porque "o efeito 'bitcoin' é mais temporário", o transporte marítimo irá normalizar-se e também porque já está a acontecer uma recuperação da capacidade de produção de semicondutores.
Por outro lado, os Estados Unidos criaram um programa de incentivos - 50 mil milhões de dólares - para atrair a indústria de 'chips'.
"Por causa do tema geopolítico, os Estados Unidos, em particular, e a Europa provavelmente irá seguir, estão a tentar trazer alguma capacidade produtiva para o seu território", salientou.
"Estamos a ver uma escassez que conjuga vários fatores ao mesmo tempo, mas acho que vão ser eliminados naturalmente", rematou.
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