"A economia cresce de forma frágil e excessivamente concentrada no setor extrativo, e apesar de a prioridade ser gerir os efeitos da pandemia e resolver a insegurança em Cabo Delgado, a médio prazo são necessárias reformas estruturais nas infraestruturas para melhorar o crescimento e sustentar a recuperação económica", disse a economista Helena Afonso, do Departamento das Nações Unidas para Assuntos Económicos e Sociais (UNDESA).
Em entrevista à agência Lusa na sequência da divulgação do relatório sobre a Situação e Perspetivas Económicas Mundiais deste ano, na quinta-feira, Helena Afonso afirmou que "as restrições da pandemia e a situação em Cabo Delgado continuam a limitar o crescimento económico, mas tem sido mitigado pelas exportações de matérias-primas".
O país lusófono africano deve ter crescido 2,1% em 2021 e o UNDESA prevê uma aceleração para 3,8% este ano, "fruto do aumento da produção de gás natural, exportações de carvão e alumínio e projetos de infraestruturas em mineração e energias".
No entanto, acrescenta, o país enfrenta "pressões inflacionárias relativamente fortes devido ao preço das matérias-primas importadas, como os combustíveis, disrupções nas cadeias de abastecimento, mas poderá haver um desenvolvimento do gás e alguma retoma do consumo privado, contando com diminuições nas restrições de combate à pandemia, com a vacinação a avançar".
Sobre a questão da dívida pública e dos impactos das 'dívidas ocultas', Helena Afonso considera que "o país ainda sente os efeitos dos problemas da dívida de 2016, que tem limitado o investimento públicos", mas aponta que "os doadores internacionais regressaram ao envolvimento com Moçambique dadas as necessidades da pandemia e o conflito no norte".
A dívida pública está em 120% do PIB, muito acima da média da África subsaariana, e é considerada insustentável pelos padrões das instituições económicas internacionais, uma situação que é agravada pelo fim da iniciativa para a Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI) do G20, da qual Moçambique beneficiava.
"Moçambique teve algum alívio da dívida pública através da DSSI, mas a iniciativa terminou em dezembro e, por isso, os custos do serviço da dívida vão aumentar", alerta a economista, acrescentando que "o país enfrenta riscos de insegurança no norte, muito rico em matérias-primas, e neste sentido o investimento aumentará se a paz se consolidar", o que garantiria os "grandes planos" do governo para a região.
Para além da insegurança, também as alterações climáticas são um dos principais riscos identificados pela UNDESA em Moçambique: "Outro risco importante são as tempestades tropicais, que se têm intensificado e ficado mais destrutivas devido às mudanças climáticas", concluiu Helena Afonso.
O UNDESA melhorou na quinta-feira a estimativa de crescimento para as economias africanas, antevendo uma expansão de 3,8% no ano passado e uma aceleração para 4% este ano.
"A atividade económica em África continua a recuperar dos eventos sem precedentes de 2020, mas a um ritmo frágil, com a previsão de crescimento a ser marcada pela elevada incerteza e exposição a repetidas vagas de infeção por covid-19, como se viu recentemente com a variante Ómicron", escrevem os analistas do UNDESA.
No relatório sobre a Situação e Perspetivas Económicas Mundiais para 2022, que melhora a previsão de crescimento do ano passado de 3,4% para 3,8%, o UNDESA aponta que as medidas de mitigação da pandemia, como os confinamentos e proibições de viagens, foram os principais instrumentos usados pelos governos, mas tiveram um impacto importante na atividade económica.
O continente africano "teve uma das recuperações mais lentas em 2021, ficando atrás da média de crescimento das economias em desenvolvimento e do mundo, respetivamente 6,4% e 5,5%", diz o UNDESA, que alerta que "para regressar à trajetória de crescimento antes da pandemia, África precisaria de crescer aproximadamente 6% neste e no próximo ano, ou seja, mais rápido que a Ásia".
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