"Gostaríamos de conseguir entender na totalidade as seguintes declarações, atribuídas ao senhor ministro Pedro Nuno Santos: 'Houve um conjunto vasto de razões, mas a razão para o cancelamento de alguns voos não teve a ver com a razão que foi apontada'", sustenta a direção do SPAC num comunicado interno a que a agência Lusa teve acesso.
Para o sindicato, com estas declarações, feitas na passada sexta-feira, o ministro tentou "desmentir o SPAC através de jogos de palavras que não esclarecem o motivo real dos cancelamentos e do incorreto planeamento da empresa (ao nível da frota atual e do quadro de tripulantes), onerando os contribuintes portugueses".
Em causa estão afirmações feitas em Melgaço pelo ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, em reação a um comunicado do SPAC que apontava o cancelamento de 30 voos da TAP na Páscoa, "muitos relacionados com inexistência de pilotos disponíveis".
"Não temos esse problema [falta de pilotos] e, se ele vier a existir, se houver necessidade, a TAP rapidamente consegue colmatá-lo", afirmou então o governante, acrescentando: "Os voos não foram cancelados por falta de pilotos. Houve um conjunto vasto de razões, mas a razão para o cancelamento de alguns voos não teve a ver com a razão que foi apontada".
Ainda sobre estas declarações do governante, o SPAC salienta que "os pilotos são mão de obra especializada, não se formam em dias ou meses e não estão disponíveis de imediato".
"Relembramos que, em 2019, não houve praticamente interessados nos 'roadshows' no estrangeiro, precisamente pelas reais condições de trabalho na TAP, ao nível da sufocante carga fiscal em Portugal e da real remuneração face às congéneres. Nas condições atuais, ainda menos interessados haveria", afirma.
"A experiência, a competência técnica e, em geral, a qualidade dos pilotos TAP reconhecida mundialmente não podem ser ignoradas e descartadas a este nível", acrescenta.
Segundo o sindicato, "a situação atual do quadro de pilotos TAP começa a causar algumas dificuldades de perceção", com a companhia a apontar "insistentemente" o "sobredimensionamento do quadro atual em cerca de 150 pilotos", a presidente (CEO) da empresa, Christine Ourmières-Widener, a dizer "em entrevista gravada que o quadro está ajustado à operação" e a TAP e o ministro das Infraestruturas a garantirem que há pilotos em número suficiente para assegurar voos.
"No entanto, cancelam-se voos por não haver pilotos para os operar. Basta haver um único cancelamento por este motivo para a conjugação dos pontos anteriores não fazer qualquer sentido", sustenta.
Segundo argumenta o SPAC, "havendo pilotos a mais, ou até em número ajustado à operação, é estranho que os mesmos estejam a realizar horas extra mensais (não pagas, por sinal) em meses tipicamente menos intensos ou não estejam pilotos suficientes escalados para serviços de assistência".
"Por outro lado -- continua - se o quadro está adequado à operação, não há razão para a manutenção do corte salarial suplementar, já que deixa de fazer sentido a proteção de emprego dos pilotos em excesso, argumento apresentado no Acordo Temporário assinado em 2021. Algo está errado!"
Na comunicação interna a que a Lusa teve acesso, o sindicato relembra que "afirmou terem existido cancelamentos por não haver pilotos disponíveis no conjunto dos voos cancelados, em dois fins de semana", mas "nunca disse que houve 20 (ou 30) cancelamentos por falta de pilotos".
Escusando-se a voltar a dar exemplos de voos cancelados por falta de pilotos, o SPAC diz ser "do conhecimento de todos os associados quais foram os voos cancelados por não haver pilotos disponíveis e quais foram as manobras para viabilizar voos contra o Acordo de Empresa".
O sindicato salienta, contudo, que se "cancelam voos por falta de pilotos" quando "há mais de uma dúzia de pilotos, despedidos no final de 2021 num processo pouco transparente e já muitos reintegrados por decisão judicial, a ser pagos para não realizar voos por opção da TAP".
Paralelamente, diz, "aplica-se 'lay-off' aos pilotos quando "o nível de prestação de trabalho (horas de voo mensais e dias de trabalho efetivo) está ao nível de 2019 e, em vários casos, acima de 2019, estando os pilotos a ser pagos com redução direta de 45% somada à indireta nas senioridades congeladas, entre outras parcelas".
"As condições de trabalho dos pilotos e dos restantes trabalhadores da TAP SA em geral não podem ser apontadas como justificação para más opções de gestão da TAP", sustenta, lembrando que, conforme consta do Relatório e Contas de 2021 da companhia, "a própria TAP assumiu que a TAP SA foi capaz de fornecer, ao longo dos últimos anos, quase 1.000 milhões de euros a fundo perdido para financiar a VEM/ME Brasil".
Defendendo que "os pilotos e os restantes trabalhadores merecem mais respeito, mais reconhecimento e menos afrontas diárias por parte da gestão e da tutela, com inverdades e justificações vagas, ausentes de racional e facilmente rebatidas com factos", o SPAC reitera que "os pilotos são a solução, e não o problema".
Finalmente, alerta os seus associados: "Voar em folga/férias ou aceitar convites de qualquer tipo com as atuais condições laborais distorce a realidade e enfraquece a classe, num momento em que os pilotos continuam a ser vistos como descartáveis".
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