Cabo Verde. Consumidores contra aumentos nos transportes marítimos
A Associação para Defesa do Consumidor (ADECO) de Cabo Verde contestou hoje o aumento das tarifas dos transportes marítimos, face à atual conjuntura, e considerou, entre outros pontos, que a medida pretendeu atender às reclamações dos armadores.
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Economia Cabo Verde
"A DECO emitiu um parecer consultivo e não vinculativo sobre o assunto, não negando a legitimidade e legalidade do Governo a nível da atualização de tarifas, mas a nossa perspetiva é que foi feita para atender às reclamações dos armadores e à alegação do Governo de aumento e de segurança da frota, e não tendo totalmente em conta qual é a real situação dos consumidores", afirmou à Lusa Nelson Faria, secretário e membro do conselho diretivo daquela organização não-governamental.
Conforme atualização decidida pela Direção Nacional de Política do Mar, que entra em vigor em 20 de abril, as tarifas dos transportes marítimos interilhas em Cabo Verde vão subir 80% para cidadãos não residentes e 20% para residentes.
O despacho que aprova, através do Ministério do Mar, a alteração, refere que a última atualização dos preços no setor dos transportes marítimos "remonta a 2006, no tocante às tarifas de carga movimentada por embarcações de cabotagem, e a 2012, no que tange aos preços aplicados ao transporte marítimo de passageiros".
De acordo com o membro da ADECO, os consumidores cabo-verdianos estão a atravessar um momento difícil, com redução dos rendimentos e aumento do custo de vida, logo a disponibilidade de aceder a serviços de transportes é limitado e condicionado por isso.
"Somos um país arquipelágico, as pessoas precisam de transportes marítimos interilhas", salientou a mesma fonte, enfatizando ainda as reclamações dos consumidores em relação aos serviços.
"Ora, não tendo um serviço de reconhecida qualidade, esse aumento, neste momento, é duplamente penalizador para os consumidores", disse ainda Nelson Faria, para quem a atualização poderá vir a aumentar o nível de insatisfação relativamente ao serviço.
"Neste contexto e na realidade do país, neste momento nós somos contra", concretizou o membro da ADECO, que foi consultada e manifestou essa sua posição no parecer enviado ao Ministério do Mar.
Nelson Faria frisou ainda que a ADECO desconhece a existência de estudos que estão na base dos aumentos, insistindo que foram motivados pela análise dos armadores.
O aumento de 80% abrange os turistas, atividade que representa 25% do Produto Interno Bruto de Cabo Verde, e os cidadãos nacionais que não residem no arquipélago.
Sobre isso, chamou a atenção para casos de cabo-verdianos com dupla nacionalidade e para como será feita a diferenciação sobre se é residente ou não.
"Vai aumentar a insatisfação e o sentimento de exclusão e de não pertença de alguns cidadãos cabo-verdianos", alertou.
Depois do parecer enviado ao Ministério do Mar, Nelson Faria avançou à Lusa que a ADECO vai continuar a publicitar a sua posição, embora reconheça a necessidade de haver a diferenciação de preços entre nacionais e estrangeiros.
Apelou à responsabilidade social, voltando a sublinhar a conjuntura "extremamente difícil" por que passam os consumidores cabo-verdianos e entendendo que, a haver aumentos, deveriam ser menores e noutro contexto.
No despacho, o Governo justificou o aumento com a "presente conjuntura demanda uma ponderação ao nível das tarifas aplicadas, por força da inflação acumulada desde a última atualização, devido aos efeitos da crise económica, causada pela pandemia do covid-19, à guerra no leste europeu e ao aumento significativo no custo dos transportes, que ditaram uma subida substancial do preço dos combustíveis, agravando a níveis insustentáveis a estrutura dos custos das empresas armadoras nacionais".
Acrescenta que existe "uma necessidade premente de renovação da frota nacional e o aumento de frequências, segurança, regularidade e previsibilidade em todas as linhas", o que "reclama uma justa rendibilidade dos operadores face aos investimentos feitos no setor, bem como atualizações tarifárias que garantam a sustentabilidade da concessão dos serviços públicos de transporte marítimo interilhas".
A concessão do serviço público de transporte marítimo interilhas de passageiros e carga foi entregue, após concurso público internacional, à CV Interilhas, detida em 51% pela portuguesa Transinsular (Grupo ETE), por um período de 20 anos.
Só a CV Interilhas transportou cerca de um milhão e meio de passageiros em três anos de operações no arquipélago, segundo dados divulgados em agosto à Lusa pela empresa, que na linha São Vicente -- Santo Antão tem a concorrência de outro armador.
Nesta atualização verificam-se igualmente aumentos na tarifa base da carga geral, na ordem dos 17%, bem como de 20% no transporte de mercadorias em câmaras frigoríficas e no transporte de animais vivos.
O aumento de todas as tarifas é ainda justificado face aos "últimos aumentos de combustível ocorridos", que representam "um acréscimo substancial do preço dos combustíveis, estimado em 38,5% entre janeiro 2022 e janeiro 2023, que oneram os custos de funcionamento das empresas armadoras nacionais".
A medida é justificada ainda com "a solicitação dos armadores ao Governo com vista à necessária atualização das tabelas de preço em vigor, de modo a refletir aos aumentos dos custos operacionais ocorridos por força desses aumentos de combustíveis e a justa rendibilidade dos operadores face o risco dos investimentos feitos no setor, em linha com a melhoria dos serviços prestados", acrescenta-se.
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