"Esta posição do senhor Presidente da República veio reforçar a continuação do debate público e é bom que o Governo e o Partido Socialista tenham em conta esse mesmo debate e participem nele", afirmou o secretário-geral da AIL, António Machado, referindo-se ao veto presidencial a medidas do programa Mais Habitação.
Em declarações à agência Lusa, o representante dos inquilinos lisbonenses disse que a decisão do Presidente da República de devolver ao parlamento, sem promulgação, o decreto que aprova medidas no âmbito da habitação "recoloca o assunto na discussão pública", pelo que a expectativa é que possa sofrer alterações, embora o grupo parlamentar PS já tenha anunciado que vai confirmar o diploma vetado.
"Para nós, justificar-se-ia que o PS tivesse atenção a algumas notas que o Presidente da República coloca na sua nota e que voltasse a ouvir os parceiros, para procurar melhorar um pouco o diploma", apontou António Machado.
Entre os aspetos que a AIL considera que devem ser alterados está a utilização dos imóveis públicos devolutos, que estão sob gestão de vários ministérios e institutos públicos, para os colocar ao serviço da população e "permitir o alojamento de mais pessoas".
No aumento da oferta habitacional devem também entrar os imóveis devolutos de propriedade de instituições de caráter social, designadamente de IPSS [Instituição Particular de Solidariedade Social], fundações e Santa Casa da Misericórdia, "que têm benefícios fiscais elevados, mas também têm muita coisa devoluta", indicou secretário-geral da AIL.
A associação acrescenta ainda os imóveis devolutos dos bancos e dos fundos de investimento, transformando os ativos tóxicos em ativos rentáveis, para permitir a disponibilização de casas no mercado.
A AIL reivindica também "uma intervenção mais musculada do ponto de vista do investimento público em habitação, quer em reabilitação dos devolutos públicos quer em construção nova, no sentido de aumentar a oferta, com rendas comportáveis para as famílias, o mais depressa possível", referindo que esse desígnio não pode ser assegurado apenas com verbas europeias do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), mas sim com verbas regulares do Orçamento do Estado.
O reforço do investimento público em habitação deve ser acompanhado da dotação do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) de competências e de capacidades para intervir dessa forma, indicou o responsável da AIL.
Sobre o impacto do veto presidencial na vida dos inquilinos lisbonenses, António Machado disse que tal resulta no "atraso na manutenção dos contratos antigos e na sua não transição para o NRAU [Novo Regime do Arrendamento Urbano]", medida que está incluída no programa Mais Habitação.
O secretário-geral da AIL alertou ainda para "o problema do pagamento das prestações da aquisição de casa, que aumentaram 50 a 100% nestes últimos tempos", defendendo que os bancos deviam ser obrigados a "reduzir as suas comissões e as outras alcavalas para compensar o aumento das taxas de juro".
"Não percebemos porque é que ainda não houve uma intervenção decente por parte do Estado ou do Banco de Portugal relativamente a esta matéria", frisou, acrescentando que o veto do diploma sobre o Mais Habitação pode ser uma oportunidade para refletir sobre este problema.
O Presidente da República vetou hoje o decreto que reunia as principais alterações à legislação da habitação - com mudanças ao nível do arrendamento, dos licenciamentos ou do alojamento local -, aprovadas no dia 19 de julho no parlamento pela maioria PS, que já anunciou que irá confirmar as propostas no início da próxima sessão legislativa.
As medidas mais polémicas e contestadas do Mais Habitação são a suspensão do registo de novos alojamentos locais fora dos territórios de baixa densidade e uma contribuição extraordinária sobre este negócio, e também o arrendamento forçado de casas devolutas há mais de dois anos.
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