"A China pretende gradualmente mudar a natureza das relações bilaterais com os Estados africanos", consideram os analistas do Grupo Eurasia, vincando que o objetivo é evoluir, da exportação de matérias-primas para a cooperação em áreas como a segurança, a agricultura e a tecnologia.
Ainda assim, a parte financeira permanece crucial no relacionamento entre os dois blocos, constatam, com a China a prometer investir mais de 50 mil milhões de dólares (45,3 mil milhões de euros) nos próximos três anos em África, incluindo 30 mil milhões de dólares em linhas de crédito para vários países, pelo menos 10 mil milhões de dólares em investimento e 11 mil milhões de dólares em iniciativas de desenvolvimento e ajuda.
Este valor "é superior aos 40 mil milhões de dólares (36,9 mil milhões de euros) anunciados na edição de 2021 do fórum, mas ainda está abaixo dos 60 mil milhões de dólares (54,4 mil milhões de euros) comprometidos em 2015 e 2018, no auge dos fluxos de investimento e empréstimos ao continente", dizem os analistas da Eurásia.
No entanto, alertam, "é importante notar que muitos destes compromissos continuam por realizar, e tendo em conta o menor crescimento económico chinês, a taxa de cumprimento dos mais recentes anúncios vai provavelmente ser ainda menor".
Para o analista político François Conradie, da consultora Oxford Economics, "a natureza fundamental do comércio entre a China e África e o papel de credor vai manter-se inalterada a médio prazo", mas também concorda que haverá evolução da relação económica.
As promessas de investimento no valor de 50 mil milhões de dólares para os próximos três anos deverão "criar empregos em África, transferir conhecimento e tecnologia e mudar o relacionamento comercial de África com o resto do mundo, afastando-se do modelo de exportação de matérias-primas e importação de tudo o resto", o que influencia o relacionamento económico entre o continente e a segunda maior economia do mundo.
Conradie referiu ainda, numa análise feita em declarações à Lusa, que "a promoção do 'soft power' chinês é interessante, e um sinal, como se fosse preciso, da crescente assertividade do Presidente Xi Jinping no cenário global".
O analista Jason Tuvey, da Capital Economics, escreveu que "o foco chinês em fortalecer os laços com África está assente no desejo de Pequim de alargar as suas alianças internacionais e por partes do continente deverem ser cada vez mais importantes na concorrência estratégica por minerais críticos", essenciais para sustentar a transição energética.
Estes esforços chineses "estão a ser recebidos com contestação pelos EUA e pelos seus aliados", afirma o analista, exemplificando com os investimentos norte-americanos no Corredor do Lobito e pela importância dada pela Europa aos projetos de energia, nomeadamente em Moçambique.
"As relações entre o Ocidente a China vão inevitavelmente estar ligadas ao ambiente político" em cada um dos países africanos, afirma o analista, considerando que "os países que deverão alinhar mais de perto com a China são os que têm democracias e instituições mais fracas e mercados de capital mais pequenos, o que inclui muitos dos países de baixo rendimento que são produtores de matérias-primas".
O 9.º Forúm de Cooperação China-África (FOCAC) decorreu na semana passada em Pequim, reunindo dezenas de chefes de Estado e de governo africanos, de um lado, e os principais líderes políticos chineses, incluindo o Presidente, que reuniu bilateralmente com 26 presidentes africanos, quase metade do total dos países no continente.
Leia Também: Reunião do BCE? "Parece certo que resultará em corte das taxas de juro"