Numa audição pública sobre "as necessidades do país, opções políticas e a proposta do Governo de Orçamento do Estado para 2025", organizada pelo PCP na Assembleia da República no âmbito das suas jornadas parlamentares, o economista Ricardo Paes Mamede salientou que a proposta orçamental "tem elementos de tipo populista ou popular".
"Este Orçamento dá resposta a um conjunto de reivindicações, muitas delas justas, que já vinham de trás, e que demoraram muito a ser satisfeitas", reconheceu, mas ressalvou que "um orçamento populista não é essencialmente um orçamento de resposta aos problemas das populações".
"É também fundamentalmente um Orçamento que tem medidas com impactos relevantes do ponto de vista financeiro, que parecem resolver que são reconhecidos mas que, na verdade, não os resolvem, apesar de serem apresentados e terem todo o aspeto de estarem a dar respostas relevantes às populações", disse, dando o exemplo das medidas do IRS Jovem e da redução do IRC, cujo "caráter populista" quis enfatizar.
No caso do IRS Jovem, Paes Mamede salientou que o Governo prevê um acréscimo de 800 milhões relativamente ao valor gasto na medida em 2024, salientando que uma "parte disso" bastaria para, por exemplo, reforçar a rede de creches e jardins-de-infância em Portugal e garantir a "universalidade do serviço público de creche".
"Mas o Governo prefere perder 800 milhões de euros através do IRS Jovem, do que adotar uma medida que teria muito mais eficácia seja naquilo que o IRS Jovem supõe, seja noutras dimensões da vida portuguesa", frisou, acrescentando que o IRS Jovem "vai ter um impacto muitíssimo limitado nos rendimentos da generalidade dos trabalhadores jovens".
Já sobre a redução de 1% do IRC proposta pelo Governo, o economista Eugénio Rosa salientou que essa medida teria "um efeito muito reduzido em Portugal", até porque só beneficiaria realmente 11 grupos económicos, como a EDP ou a Galp.
"Estive a calcular: a redução para eles, de bónus fiscal, de 21% para 20%, e cheguei à conclusão que eles teriam um bónus de 100 milhões de euros por ano. Prevê-se, ou pelo menos diz-se que a redução de um ponto percentual vai reduzir as receitas fiscais em 200 milhões euros. Portanto, quase metade de isso vai para 11 grupos", criticou.
Durante esta audição, foram também vários os economistas que advertiram para a falta de investimento público que está prevista neste Orçamento do Estado, com Eugénio Rosa a defender mesmo que se trata de "um dos problemas mais graves" de Portugal.
Eugénio Rosa acusou o Governo de utilizar "manipulações para enganar a opinião pública" sobre os níveis de investimento público, referindo que tem valores orçamentados que depois não executa, dando o exemplo do SNS que, em 2024, tem um orçamento de 774 milhões de euros, mas, até ao momento, só foram executados 166 milhões, ou seja, 21,5%.
Já o economista Ricardo Cabral também defendeu que o país tem "condições financeiras e macroeconómicos únicas para mudar o seu modelo de desenvolvimento", pedindo que se aumente o investimento público em 5%, designadamente para infraestruturas.
Além de investimento público, Ricardo Paes Mamede defendeu que o Estado não pode abster-se "de tomar uma posição sobre quais são os tipos de investimentos privados que estão mais alinhados com o projeto de desenvolvimento económico e social para o país".
No final desta audição, Vasco Cardoso, membro da Comissão Política do Comité Central do PCP, defendeu que a conversa permitiu "quebrar as regras do pensamento único e dominante" e, a nível fiscal, considerou "que se está a tentar impor em Portugal, e na União Europeia hoje, uma corrida para zero do ponto de vista de tributação dos grupos económicos e financeiros", deixando críticas a PSD, CDS e PS.
"O PS, aliás, fez um convite ao PSD, é dizer-lhes assim: vocês não precisam de baixar a taxa nominal, apostem nos benefícios fiscais e assim ninguém topa. Foi esse o truque que o secretário-geral do PS veio dizer quando colocou a questão de que não era necessário descer a taxa do IRC", criticou.
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