No plenário, o ministro da Agricultura e Pescas, José Manuel Fernandes, explicou que as "pescas são um setor estratégico para Portugal", mas, para tal, é necessário que "as embarcações tenham gente para operar", pelo que o Governo pediu autorização para que possa alterar a legislação do setor.
Caso contrário, este ano, "entre 10 a 15 por cento das embarcações podem ter de parar por não terem tripulações mínimas de segurança", o que iria corresponder a perda de 35 a 40 milhões de euros de receitas, explicou o governante, considerando que a proposta "vai ao encontro das reivindicações das associações do setor".
Hoje em dia, mais de 60% das embarcações de pesca "só consegue ter tripulação com marítimos estrangeiros", explicou.
A atual lei permite que as embarcações operem com um máximo 40% de tripulantes não nacionais, da União Europeia, do Espaço Económico Europeu (EEE) ou de um país de língua oficial portuguesa.
O novo diploma mantém esse limite mas alarga as exceções, após acordos com as autoridades dos países de origem dos imigrantes, facilitando também o reconhecimento das certificações, outro dos problemas atuais.
A proposta do Governo alarga de três para cinco anos o período em que cada tripulante fica na mesma categoria. Atualmente, os tripulantes que não conseguissem transitar de categoria teriam de ser despedidos, segundo o executivo.
No debate, o deputado Paulo Núncio (CDS) admitiu que o setor marítimo "enfrenta uma preocupante falta de mão-de-obra", recordando os dados que apontam para uma diminuição superior a 10 por cento dos 16 mil pescadores que existiam no país em 2018.
Já Nuno Simões de Melo (Chega) criticou a medida, acusando o Governo de ter mostrado a "sua incapacidade em colocar atrativa a atividade" das pescas e reclamou incentivos para contratar portugueses.
"Gostaríamos de ver incentivos de medidas de contratação a nacionais e não a abertura de mais imigrantes neste setor", explicou.
Por seu turno, Carla Barros (PSD) considerou que se o setor "já teria parado há muito tempo" se "não recorresse a mão-de-obra de trabalhadores estrangeiros", principalmente da Indonésia.
"Esta proposta de lei vem desbloquear mão-de-obra de países terceiros" e constitui "uma importante medida que este parlamento além de apoiar tem de aplaudir", disse a deputada social-democrata.
Já Albino Ramos (IL) reclamou a ação das autoridades, alertando para o risco de uma flexibilização da contratação constituir um "alçapão perigoso" para ilegalidades por falta de fiscalização das embarcações.
Na sua intervenção, António Filipe (PCP) criticou a opção de alargar o tempo de presença na mesma categoria profissional dos marítimos, prometendo votar contra esse aspeto da proposta de lei na especialidade.
Se os armadores "pagassem bons salários, tinham trabalhadores nacionais e estrangeiros interessados", disse, recordando que esta medida contraria as restrições impostas aos imigrantes.
"Não vemos os imigrantes como uma ameaça", mas o que "se pretende é alimentar um setor económico à custa de mão-de-obra barata", afirmou.
José Soeiro, do BE, concordou com as críticas e reafirmou que "foi completamente irresponsável acabar com as manifestações de interesse", que permitia a regularização dos pescadores estrangeiros.
Agora, "é preciso que, além de regular, estes marítimos tenham condições e sejam pagos de forma digna", acrescentou.
O coordenador do Livre, Rui Tavares, considera que as pescas são um "caso de estudo em relação à mão de obra estrangeira", porque mostra que uma política de "portas fechadas" e "prioridade aos nacionais" no acesso ao emprego depois "vê-se que não funciona".
Durante a campanha eleitoral, houve "um discurso de ódio muito agressivo precisamente contra os pescadores indonésios" e agora, "afinal, vemos que a pesca portuguesa depende da mão de obra indonésia", porque não é possível atrair jovens das comunidades piscatórias tradicionais.
"Não há dinheiro suficiente que os atraia a fazer aquela atividade", resumiu.
Já o deputado socialista Valter Chicharro disse que "o PS reconhece que esta proposta, ao contrário do que é habitual neste Governo, é uma resposta concreta às necessidades do setor", e vem "assegurar a viabilidade de um setor estratégico".
Para o ministro, esta é a única solução para o setor das pescas: "se não alterarmos a lei ou os barcos vão para o mar e não cumprem a lei ou ficam em terra" e "ficamos sem as quotas [de pescas autorizadas pela UE] que temos disponíveis".
Contudo, o Governo não quer alterar o limite de 40% de tripulantes não nacionais porque quer insistir numa estratégia de "ter esta atividade mais atrativa" para os portugueses.
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