"Nunca esperei ser conhecida. Foi difícil ler barbaridades sobre mim"
Teresa Guilherme é a entrevista de hoje do Vozes ao Minuto.
© Global
Fama Teresa Guilherme
Quem olha para Teresa Guilherme no pequeno ecrã está longe de imaginar as peripécias por que a apresentadora já passou ao longo da sua carreira com mais de duas décadas. Ora, são precisamente estes segredos dos bastidores que a comunicadora revela no seu mais recente livro - 'O Avesso do Direto'.
Porque o direto pode ser, de facto, matreiro, Pode pregar partidas (esperadas ou não) e deixar qualquer pessoa com os nervos em franja, mesmo Teresa Guilherme.
Estivemos à conversa com a apresentadora que lembrou alguns episódios marcantes desta caminhada, não só enquanto 'rainha dos reality shows', mas em muito mais. Como a própria defende, é redutor este título. Porque mais do que uma mulher dos sete ofícios, dentro e fora da caixinha mágica, Teresa provou ser uma verdadeira bombeira de serviço, pronta a apagar qualquer incêndio em direto.
O que nos traz com este livro?
São as surpresas que normalmente as pessoas não vêem na televisão. Não sabem o que está na nossa cabeça, o que teve de se fazer antes, as voltas que se teve de dar para se chegar àquele resultado. Nos diretos tem de parecer que está tudo bem, mesmo quando não está. Contado é muito divertido, vivido nem sempre. Os telespectadores não percebem o que está previsto, como não têm o guião não sabem se houve ali uma mudança. É suposto ser entretenimento. O que desmonto aqui é como se constrói um programa e o que se faz em imprevistos.
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Diz que imagina o futuro da televisão como uma espécie de Netflix. Os canais generalistas não têm os dias contados tendo em conta o desinteresse da nova geração?
O generalismo são outras pessoas a escolherem por nós. Claro que dá para puxar para trás e para a frente [na box], mas há alguém que acha que àquela hora o programa da manhã deve começar, depois o jornal, etc. A Netflix divide tudo por estilos. Reality shows é um deles, pode até haver um canal só com isto. Quem gosta vai ali e não precisa de ficar à espera que um canal generalista faça isso. Eles apostam em muita gente a pagar pouco, mas depois temos este naipe de coisas para ver.
O conceito da televisão como um móvel em casa, com toda a gente reunida à volta dela, já não existe A televisão vai tornar-se numa plataforma, vai deixar de ser decidida por outros. O conceito da televisão como um móvel em casa, com toda a gente reunida à volta dela, já não existe. Mas acho que isso não começou na Netflix, mas sim no YouTube. Lá é que era a televisão do futuro. Sou uma grande consumidora de Netflix, zero consumidora de televisão a não ser no YouTube.
“A excelência deixou de ser a regra para passar a ser exceção”. Excelência em que sentido?
Quando falo é em termos de exigência. Não se pode exigir que uma coisa seja perfeita quando não há dinheiro para a pagar. Ou seja, o dinheiro investido nas produções é menor, porque há menos gente a ver. Enquanto a Netflix tem todo o dinheiro do mundo para fazer a excelência, as televisões têm orçamentos mais curtos. Faz-se o que se pode. Mais vale feito do que perfeito.
E é fácil trabalhar com a Teresa Guilherme?
Acho que para umas pessoas será mais fácil e para outras será mais difícil. Sou intempestiva, exigente, tenho opinião. Penso que se as pessoas tiverem o bom senso de pesar aquilo em que eu as ajudo e quanto as chateio, então é fácil trabalhar comigo. Mas se olharem só para a exigência, então aí não será muito fácil. Sou exigente comigo e com os outros.
Vejo coisas escritas sobre mim que pergunto "como é que é possível as pessoas inventarem uma coisa que é tão longe da realidade?"No programa 'Ousadias' a Teresa desconcertava os entrevistados com as perguntas mais inimagináveis. Alguma vez se viu assim numa situação? Como é que reagiu?
Muitas. Especialmente notícias. Vejo coisas escritas sobre mim que pergunto "como é que é possível as pessoas inventarem uma coisa que é tão longe da realidade?". Pessoas que não sabem nada sobre nós ou que têm uma ideia baseada em coisas que não são verdade.
O mundo maravilhoso dos reality shows... ou será que não?
Quanto aos reality shows, ouvimos diversas opiniões de que agora não se pode dizer nada sem que haja uma condenação ou polémica em público. Estas opiniões são justas?
Há muitos carimbos que se foram pondo em coisas que já existiam mas que ninguém se dava ao trabalho de encarar como graves. Por exemplo, no bullying, sabemos o efeito que provoca nas pessoas ao longo das suas vidas, é normal que haja uma atenção a isso. Também foi chamada a atenção para coisas que eram consideradas incómodas para muitas mulheres. Isso tem de se respeitar nos reality shows como na vida. Está em aberto, as pessoas estão com atenção. [Agora] Dá-se atenção a várias formas de agressão.
Por outro lado, também há acusações de que as votações são manipuladas. Estes rumores têm fundamento ou nunca fizeram sentido?
Há um vídeo que está no YouTube em eu digo "esteja calado seu idiota" para uma das pessoas do público. Eu gostava daquela concorrente, achava que fazia falta ao programa, desejava que o público não a expulsasse e aquela pessoa estava a dizer que era manipulação. Estava a lidar com os meus próprios sentimentos e ainda me estava a acusar. A minha reação aí diz tudo...
Quanto ao Zé Maria, a entrada dele no ‘BB’ estava traçada no destino…
Ele não teria entrado porque não havia aquele lugar. Foi à última hora porque o José Eduardo Moniz decidiu que tinha de haver logo uma expulsão e se isso acontecesse iria faltar um no fim. Sabemos que algum tempo depois de ter saído da casa passou por uma fase menos boa.
Entrou Zé Maria e saiu uma pessoa que não sabia quem era. Foi perturbador para ele Considera que ele soube lidar com aquela fama espontânea ou pelo contrário ainda existia uma grande ingenuidade na altura?
Acho que para todos é complicado, sendo que ninguém teve a fama do Zé Maria. Primeiro porque ele não estava à espera de fama nenhuma, nem nenhum dos que estavam lá dentro. Ele era adorado, ou seja, as pessoas inventaram um ideal, criaram um boneco à volta dele e queriam que ele se encaixasse nesse boneco. Quando ele saiu, quis encaixar-se nessa opinião das pessoas. De repente, ele, que tinha vivido uma vida pacata na sua terra, tem todo o mundo à volta a dar-lhe importância. Entrou Zé Maria e saiu uma pessoa que não sabia quem era. Foi perturbador para ele. Ainda hoje não dá entrevistas e como ele há outros concorrentes que não querem voltar àquela exposição, porque se magoaram nessa mudança de anónimos para famosos.
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A pessoa fica ao serviço daquela figura pública que se torna. A vida muda, mas não para melhor Mas quando se entra num programa destes inevitavelmente essa será uma das consequências...
Mas as pessoas não sabem o que é ser famoso. Não sabem a quantidade de obrigações, acham que só tem vantagens - que terá algumas -, mas tem muito mais desvantagens. A pessoa fica ao serviço daquela figura pública que se torna. A vida muda, mas não para melhor. Ele não sabem o que é existir com toda a gente a ter uma opinião sobre eles. E como é uma figura pública, toda a gente tem o direito de falar e é preciso estar-se preparado para isso. Aqueles que voltam para a sua vida no seu dia a dia normal têm a sua estrutura familiar e têm onde se refugiar. Mas muitas vezes há outros que levam anos para se endireitar.
Nunca esperei ser conhecida, fiquei conhecida muito rapidamente no 'Eterno Feminino'No caso da Teresa foi simples a adaptação a essa realidade?
Não, não foi simples, mudei a minha vida toda. Nunca esperei ser conhecida, fiquei conhecida muito rapidamente no 'Eterno Feminino'. Tinha 35 anos, já era uma adulta, mas mesmo assim foi difícil. Publicamente mudei a minha maneira de ser, mantive sempre um espaço fechado e foi muito difícil ler barbaridades sobre mim a vida inteira. Não leio nada do que se escreve sobre mim, nem nunca li. Quando começo um reality show deixo de ler os comentários do meu Instagram e do meu Facebook. Essas coisas colam-se a nós como cartas anónimas. Nunca mais fui a uma praia em Portugal e eu adorava ir. Não era uma pessoa muito paciente e passei a respeitar que as pessoas venham a falar comigo e comecei até a gostar disso. Faz parte do compromisso com o público. Se não se está disponível para isso, fica-se em casa.
Porque é que a Fanny 'bateu tão forte' no coração da Teresa?
Sempre tive muito carinho e ainda tenho. Continuo a achar que ela é uma figura. É muito engraçada. Deu muita volta na vida dela. Desde que foi mãe e está com este namorado encontrou um porto de abrigo.
Em relação ao famoso pontapé do Marco, acha que se tivesse acontecido hoje teria uma exposição diferente?
O público em si bateu-lhe palmas, tanto que depois expulsaram a Sónia. Não sei se hoje as coisas seriam resolvidas assim. Naquela altura falava-se menos em homens que batiam em mulheres e considerava-se que as mulheres teriam tanta culpa como eles, porque os agressores eram provocados. Acho que esse não é um assunto resolvido [a violência doméstica], há sempre coisas a falar. Naquele caso o Marco estava de cabeça perdida, bateu na Sónia, mas poderia bater noutro homem, mas calhou ser ela a dizer isso. Ele na altura foi criticado. Lembro-me que o critiquei imenso.
Não deixa de ser feio, mas o maior desastre de todos é como o público a seguir expulsou a Sónia Mas é caso para dizer que um bom chá é capaz de resolver as piores desavenças...
Debati-me sempre a favor dos meus concorrentes: dentro da casa as pessoas não estão no seu normal, estão debaixo de pressão e todas as situações são criadas. No caso do Marco - e isto não é para o desculpar - houve uma prova em que eles fizeram não sei quanto quilómetros, estavam todos cansados, e ele estava furioso porque tinha feito muito mais do que os outros. Eu teria sempre de lhe puxar as orelhas. Estando cá fora, ele quis conversar comigo e eu conversei com ele. E é verdade que hoje em dia somos amigos. Não deixa de ser feio, mas o maior desastre de todos é como o público a seguir expulsou a Sónia.
Muito se fala em jogo nos reality. A imagem que os concorrentes passam cá para fora é real ou é possível dar vida a uma personagem?
Lá dentro é relativo. Este programa é diferente porque as câmaras estão todas à vista. Antes havia outras que pareciam espelhos e esqueciam-se mais facilmente. Eles jogam na estratégia de chegar ao fim, de ganhar, mas não quer dizer que sejam pessoas diferentes. Jogam um trunfo que têm. Não conseguem passar três ou quatro meses a fingir que são muito bonzinhos e que vivem na paz e no amor se não forem assim. Mas ninguém é só intriguista ou só bom. Eles usam o que vão podendo dentro daquele jogo. O maior jogo de todos nem é ganhar, é conseguir viver numa casa fechado com gente que não se conhece de lado nenhum.
Quando mostrava mais carinho por um concorrente, era o primeiro a sair. As pessoas achavam que eles eram beneficiadosÉ fácil ser-se imparcial ou há aqueles concorrentes por quem se tem sempre mais carinho?
Quando mostrava mais carinho por um concorrente, era o primeiro a sair. As pessoas achavam que eles eram beneficiados. Tenho ouvido muito dizer que a Carina [expulsa na gala deste domingo] é a minha favorita, gosto dela é verdade, mas não é a minha favorita. A figura dela é que me desperta carinho, por ser nova, pelo passado que ela teve, revejo-me nela porque tem o pavio curto. Não vou explodir como ela aos gritos agora, mas com 20 anos se calhar era dentro da mesma linha. A minha mãe toda a vida me dizia "oh filha, ao menos não dês opinião quando não te pedem".
As pessoas ainda continuam a ser preconceituosas quanto aos reality?
Têm preconceito com os concorrentes e com o programa. Mesmo no primeiro, toda a gente via, mas acha que as pessoas diziam que viam? Não diziam também. Eu também não vejo, eu só apresento [diz a rir-se]. Já contra os concorrentes acho uma coisa muito feia, porque eles são só concorrentes. As pessoas não têm direito de julgar de uma forma tão feroz. Isso tem sido uma luta... A coisa mais chocante que ouvi foi quando houve aqueles incêndios enormes há três anos. Lembro-me que estava a entrar num teatro e há um jornalista que me pergunta: "Então o que é que me diz de um concorrente do reality show ser bombeiro voluntário?" Nem queria acreditar, passados 20 anos havia o preconceito contra o Telmo porque achavam que ele não podia ser bombeiro voluntário...
Acha que o seu regresso ao programa estava destinado ao lado do Cláudio Ramos?
Não acho coisíssima nenhuma. Tenho trocado mensagens com ele, mas nesta época de grandes desafios do dia a dia não me consigo projetar para janeiro. Sempre que falo com o Cláudio é a dizer que vai ser giro e que nos vamos divertir, é sempre uma coisa no vago. Quando chegar a dezembro lá nos preocupamos com isso, de como vamos dividir o trabalho...
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E quanto àquela história da Luciana Abreu que lhe mentiu para conseguir cantar?
Foi uma manipulação. Ela não tinha sido escolhida [para o 'Cantigas na Rua'], injustamente, porque a rapariga era muito boa. Então chegou lá, contou-me uma historinha de que o pai estava no hospital, eu caí logo que nem uma patinha e fiquei com muita pena. E acabou por ganhar a final. Ainda bem que ela contou aquela história. Quando a escolhi para fazer a Floribella nem a reconheci. Gosto muito da Luciana, é uma miúda muito talentosa.
Podemos concluir por esta história que há meios que justificam os fins?
Acho que há determinações. O que a televisão tem de diferente das outras profissões, não de todas, é que se está lá alguém a cantar não está lá outra. É uma coisa de exclusão. O que ela fez foi chegar-se à frente. Há poucos lugares, por isso é que é tão competitivo. Quando os meus alunos hoje me dizem que é muito difícil, eu digo: "Oh amigos, estejam lá caladitos. Quando eu comecei só havia a RTP2 e a RTP1". Eram pouquíssimos apresentadores e para entrar gente nova era difícil.
Na onda do vintage, se pudesse recuperar um dos seus antigos programas qual seria?
É difícil dizer o 'Escova de Dentes', porque não há orçamentos que hoje aguentem. Um que adorei produzir e que se pode fazer sempre é o 'Cantigas da Rua', porque são milhares de pessoas. Agora, nem isso. A nível de dinheiro esse dava para fazer. As pessoas iam lá para conviver.
Aos 65 anos, estava à espera de descobrir o seu novo propósito de vida agora como palestrante?
Era convidada regularmente para dar aulas a alunos de comunicação e achei que devia às pessoas que tinham o sonho de apresentar programas de televisão falar da minha experiência. Na pandemia isso tomou proporções maiores, porque as pessoas precisavam que falar dos seus produtos online. Explico o que fui aprendendo a fazer regularmente para não me deixar levar por aquela imaginação de horror. Acho que as pessoas reconhecem a autoridade, porque lhes digo para fazerem uma coisa que fiz e que continuo a fazer. Comunicar é um prazer, não pode ser uma aflição. Tem de ser chegar ali e abrir o coração.
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