Por cá, pouco ou nada se ouve falar desta terapêutica. Não faz milagres, mas a verdade é que há cada vez mais evidências científicas dos seus benefícios. Cristiano Ronaldo recorre a este tipo de tratamento para acelerar a recuperação de lesões. Mas o caso mais mediático ocorreu em 2019, quando Ângelo Rodrigues foi hospitalizado, na sequência de uma infecção provocada por injeções de testosterona que o próprio ator terá administrado por razões estéticas. Em risco de amputação, a medicina hiperbárica salvou-lhe a perna esquerda.
Maria Gameiro, diretora do Centro Hiperbárico de Cascais, explica, em entrevista ao Lifestyle ao Minuto, que a oxigenoterapia hiperbárica consiste num "tipo de terapia médica não invasiva na qual um paciente é submetido à inalação de oxigénio puro a 100%". O doente é colocado numa câmara pressurizada, para recriar um ambiente de profundidade, como se estivesse a mergulhar. O resultado? Um aumento do oxigénio transportado pelo sangue, que acelera o processo de cicatrização.
O que é a medicina hiperbárica?
A medicina hiperbárica é a área médica que se dedica ao estudo, coordenação e prescrição da aplicação terapêutica, do oxigénio em ambiente hiperbárico, ou seja, em ambiente de maior pressão do que a que sentimos no dia a dia.
Há muito pouca informação em português e a que há é sempre muito técnica!
Em que consiste?
Os tratamentos de oxigenoterapia hiperbárica são um tipo de terapia médica não invasiva na qual um paciente é submetido à inalação de oxigénio puro, a 100% (normalmente respiramo-lo a cerca de 21%), e com uma pressão superior à pressão atmosférica.
Maria Luís Gameiro
E o que trata exatamente?
Há uma grande variedade de aplicabilidades para este tipo de tratamento. O oxigénio inalado a alta pressão é diluído no plasma sanguíneo, chegando a áreas do organismo que de outra forma seria impossível alcançar. Estes níveis elevados de oxigénio produzem um efeito anti-infecioso, anti-inflamatório, anti-edematoso, desintoxicante, contribui para a formação de vasos novos e estimula a formação de colagénio, o que significa um aumento da velocidade de cicatrização, por exemplo.
É uma técnica ainda pouco conhecida em Portugal. Porquê?
Não lhe sei responder exatamente o motivo, talvez porque, antes de nós, não existia um Centro de Medicina Hiperbárica com câmaras monolugares e uma aposta na comunicação e divulgação dos tratamentos. Estes tratamentos começaram por ser realizados em ambiente hospitalar militar para os mergulhadores e, mais tarde, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) começou a recorrer aos serviços militares para os executar para outras patologias. Em 2016, nos Estados Unidos, quando, numa situação pessoal, um médico incluiu estes tratamentos no protocolo de uma cirurgia, percebi e senti as suas vantagens, mas nunca tinha ouvido falar deles, razão pela qual investiguei e estranhei que em Portugal não fosse conhecido nem houvesse disponibilidade fora do SNS. Este foi o mote da criação deste centro e da divulgação do que estes tratamentos têm para oferecer. Há muito pouca informação em português e a que há é sempre muito técnica!
Atualmente, o tratamento é prescrito para que problemas?
Há uma grande variedade de aplicabilidades para este tipo de tratamento, como a surdez súbita, cicatrizações e preparações para vários tipos de cirurgias (pré e pós cirúrgico), feridas do pé diabético, lesões decorrentes de radioterapias, na medicina do desporto, dor e traumatismos. A ciência tem evoluído muito no âmbito da neurologia e há estudos recentes com resultados muito promissores, que referem que os adultos que sofrem de demência evidenciam melhorias com este tratamento. Podem fazer este tratamento pessoas doentes e para as quais é essencial - e muitas vezes vital - , bem como pessoas saudáveis que procuram bem-estar e prevenção futura de demências ou melhorias de desempenho desportivo, por exemplo.
É um procedimento médico muito seguro, embora não esteja isento de contraindicações médicas
Que vantagens oferece?
O oxigénio é vida e as vantagens são enumeras! Este é um tratamento não invasivo e, atuando o oxigénio de forma anti-infeciosa, anti-inflamatória, anti-endemosa e desintoxicante, tem uma ação genérica positiva sobre todo o corpo, ou seja, atua sobre o motivo de tratamento, mas também sobre a nossa condição geral. Temos pessoas que vão para tratar uma infecção e acabam a dormir melhor e a sentir mais energia. É um tratamento muito completo.
Existem perigos?
É um procedimento médico muito seguro, embora não esteja isento de contraindicações médicas, daí a necessidade de controlo médico realizado por especialistas em medicina hiperbárica com o objetivo de minimizar esses riscos. Os pacientes devem certificar-se que os seus tratamentos são sempre acompanhados por enfermeiro e prescritos por médicos com competência em medicina hiperbárica dada pela Ordem dos Médicos.
Que cuidados devem ser tidos?
O tratamento em ambiente hiperbárico é realizado com oxigénio medicinal no seu estado puro a 100% e a altas pressões, pelo que devemos elevar consideravelmente as medidas de segurança. Não se pode entrar com telemóveis ou qualquer outro equipamento eletrónico ou metais. Além disso, a entrada na câmara deve ser feita apenas com roupa 100% algodão, disponibilizada no centro hiperbárico no momento do tratamento. A sala onde as câmaras se encontram também tem de ter especificidades de segurança ao nível da amplitude, isolamento e controlo de oxigénio no ar.
Que mitos importa desmistificar?
Talvez o mito de que é novo. Na realidade, não o é! É um tratamento já usado há muitos anos, felizmente com novas aplicações que a ciência nos tem vindo a beneficiar.
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