A doença valvular cardíaca é uma patologia ligada ao envelhecimento que está a aumentar rapidamente. Atualmente, afeta uma em cada oito pessoas com mais de 75 anos em todo o mundo. Em Portugal, estima-se que existam cerca de 32 mil casos. Mas a perspectiva é que este número duplique até 2040 e triplique até 2060, e numa população envelhecida, como a portuguesa, pode mesmo vir a tornar-se a próxima epidemia cardíaca.
A propósito da Semana Europeia da Sensibilização para a Doença da Válvula Cardíaca, que se assinala esta semana, até dia 18 de setembro, a organização Global Heart Hub lançou a campanha #OuçaOSeuCoração, que se une à iniciativa Valve For Life e à campanha Corações de Amanhã, da Associação Portuguesa de Intervenção Cardiovascular. Esta tem como objetivo sensibilizar a população para a doença valvular cardíaca e os seus sintomas, promovendo a melhoria do diagnóstico, do tratamento e da gestão da patologia na Europa.
Rui Campante Teles© DR
Rui Campante Teles, cardiologista e coordenador da iniciativa Valve For Life, sublinha a importância da avaliação médica regular. "Uma simples auscultação com estetoscópio a partir dos 50 anos para que o doente possa ser encaminhado de imediato para um cardiologista, que poderá realizar exames complementares para confirmar o diagnóstico inicial, pode evitar desfechos mais graves", explica ao Lifestyle ao Minuto. Até porque, sublinha, "alguns doentes não apresentam sintomas durante muitos anos ou nunca chegam a apresentá-los".
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A doença valvular cardíaca é frequente, mas poucos a conhecem. De que se trata?
O coração é constituído por quatro cavidades: as aurículas, esquerda e direita, e os ventrículos, esquerdo e direito. Entre as aurículas e os ventrículos, tal como à saída de cada ventrículo, existe uma válvula cardíaca. As quatro válvulas cardíacas fazem com que o sangue dentro do coração flua em sentido único, impedindo o seu refluxo. A doença valvular cardíaca é causada por desgaste, doença ou dano de uma ou mais das quatro válvulas do coração, afeta o fluxo de sangue e divide-se em dois tipos principais: a estenose aórtica (estreitamento da válvula aórtica) ou a regurgitação mitral (degenerescência da válvula mitral).
Alguns doentes com doença valvular cardíaca não apresentam sintomas durante muitos anos ou nunca chegam a apresentá-los, mesmo que a doença seja grave
Esta falta de informação sobre a patologia faz com que os sintomas acabem por ser menosprezados?
Os principais sintomas desta doença (aperto ou dor no peito, falta de ar, fadiga, batimentos cardíacos irregulares e desmaios) são comuns em pessoas acima dos 65 anos, sendo muitas vezes desvalorizados e isto faz com que esta doença represente uma barreira para o envelhecimento ativo.
Existem quantos casos diagnosticados globalmente e, mais especificamente, em Portugal?
No total, a doença valvular cardíaca afeta pelo menos uma em cada oito pessoas acima dos 75 anos. Este é um valor que está a aumentar rapidamente, tendo em conta o envelhecimento da população. Os números globais mostram que este número poderá duplicar até 2040 e triplicar até 2060.
É uma condição comum que pode ser grave, resultando inclusivamente na morte do doente
Que grupos são mais afetados?
São precisamente as pessoas acima dos 75 anos, uma vez que esta é uma doença que está ligada ao envelhecimento. Por isso, é crucial estar atento aos principais sintomas e fazer regularmente uma simples auscultação com estetoscópio a partir dos 50 anos para que o doente possa ser encaminhado de imediato para um cardiologista, que poderá realizar exames complementares para confirmar o diagnóstico inicial, pode evitar desfechos mais graves. Alguns doentes com doença valvular cardíaca não apresentam sintomas durante muitos anos ou nunca chegam a apresentá-los, mesmo que a doença seja grave, o que pode dificultar o diagnóstico.
De que riscos estamos a falar?
Esta é uma condição comum que pode ser grave, resultando inclusivamente na morte do doente. Ainda assim, é importante frisar que esta é tratável. Procurar ajuda especializada facilita assim o diagnóstico precoce e, consequentemente, a adoção do melhor tratamento.
Atualmente, a doença valvular cardíaca mais comum é a estenose aórtica. Em que consiste exatamente?
A aorta é a principal artéria do nosso corpo que transporta sangue para fora do coração e a válvula aórtica tem como função evitar que o sangue bombeado pelo coração volte para trás. Na presença de estenose, a válvula aórtica não abre completamente e vai ficando cada vez mais estreita, impedindo o fluxo sanguíneo para fora do coração.
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Qual é a prevalência desta doença no país?
Esta doença afeta cerca de 32 mil portugueses, sobretudo acima dos 75 anos.
E quais são os principais sintomas?
Os mais comuns são o cansaço, a dor no peito e os desmaios. Caso sinta algum ou vários destes sintomas, é fundamental procurar ajuda especializada. Depois disto, o diagnóstico pode ser confirmado com recurso à auscultação, ecocardiografia com doppler, seguindo-se muitas vezes um cateterismo cardíaco para completar o estudo quando se considera que é necessário efetuar um tratamento invasivo.
Além desta, a insuficiência mitral é também motivo de preocupação. O que é?
A insuficiência mitral é a segunda doença valvular mais comum, em todo o mundo ocidental. Carateriza-se por um refluxo de sangue pela válvula mitral. À medida que o ventrículo esquerdo se contrai, bombeando o sangue para a aorta, um pouco de sangue retorna em direção à aurícula esquerda, aumentando o volume de sangue e a pressão nesse local. Este aumento da pressão arterial na aurícula esquerda aumenta a pressão do sangue nas veias dos pulmões. Consequentemente, é bombeado menos sangue para a circulação e os pulmões ficam com excesso de sangue , o que gera a falta de ar e cansaço.
Como se manifesta?
Os principais sintomas desta doença, como acontece com a estenose aórtica, são comuns em pessoas de idades mais avançadas. Pessoas acima dos 65 anos devem estar atentos a falta de ar e cansaço.
É fundamental educar a população para esta doença
Sendo patologias comuns e que podem ser graves, é também importante sensibilizar a população para o facto de serem tratáveis.
No caso da estenose aórtica não tratada, grave e sintomática, por exemplo, a taxa de mortalidade é elevada, pois varia entre 25% e 50% por ano. Este valor que pode facilmente ser revertido através do tratamento adequado, que passa pelo implante de uma nova válvula cardíaca, que pode ser feito através de uma cirurgia convencional ou de tratamento percutâneo. O procedimento é realizado através de um cateter introduzido por uma artéria (geralmente na virilha), sem necessidade de parar o coração. Esta é uma técnica minimamente invasiva que assinalou este ano o seu vigésimo aniversário e é, para muitos especialistas, o grande avanço da cardiologia no século XXI.
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No caso da insuficiência cardíaca, a cirurgia da válvula mitral, para reparar ou substituir a válvula cardíaca danificada, pode ser o tratamento mais indicado nos casos mais graves. No entanto, metade dos doentes encaminhados para cirurgia não são operados, por razões relacionadas com outras doenças concomitantes, pela disfunção do ventrículo esquerdo ou pela idade avançada. Nos últimos anos, têm sido desenvolvidas inovações importantes no campo do tratamento e já existem em Portugal vários dispositivos percutâneos minimamente invasivos.
Como sensibilizar a população para esta doença e para a importância do diagnóstico precoce?
Essa é a primeira ação a realizar quando falamos de estratégias a adotar para evitar desfechos mais graves em relação à doença valvular cardíaca. Para o fazer, é fundamental educar a população para esta doença, uma vez que, segundo um estudo realizado em 2017 pela empresa Spirituc, 85% da pessoas com mais de 70 anos sabe que o coração tem válvulas, mas apenas 18,3% já ouviu falar de estenose aórtica e 19,7% ouviu falar de insuficiência mitral. Campanhas como a #OuçaOSeuCoração (#ListenToYourHeart), lançada esta semana pela organização Global Heart Hub para assinalar a Semana Europeia da Sensibilização para a Doença Valvular Cardíaca (12 a 18 de setembro), têm como objetivo contrariar estes números. Com o apoio da iniciativa Valve For Life e da campanha Corações de Amanhã, da Associação Portuguesa de Intervenção Cardiovascular, o objetivo passa por aumentar a conscientização da população para a doença valvular cardíaca e os seus sintomas, promovendo a melhoria do diagnóstico, do tratamento e da gestão desta na Europa.
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