Falta de reagentes coloca Brasil na lista de países que faz menos testes

A falta de reagentes para concluir testes ao novo coronavírus afastou o Brasil do "cenário ideal" de testes generalizados, disse à Lusa o infecciologista David Urbaez, sobre o país integrar a lista dos Estados que menos exames realiza.

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Lusa
12/04/2020 09:40 ‧ 12/04/2020 por Lusa

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Covid-19

 

De acordo com o portal Worldometer, que compila quase em tempo real informações da Organização Mundial da Saúde (OMS), dos Centros de Controlo e Prevenção de Doenças, de fontes oficiais dos países, de publicações científicas e de órgãos de informação, o Brasil testou menos de 300 pessoas por cada um milhão de habitantes, sendo um dos países que menos testes faz em relação à proporção populacional (210 milhões de habitantes).

Segundo o médico brasileiro David Urbaez, que é também consultor da Sociedade Brasileira de Infetologia, a situação que o Brasil atravessa deve-se à falta de reagentes, uma substância essencial para a realização dos testes ao novo coronavírus, e que é importada.

"Temos vários problemas, um deles é a falta de reagentes, que são as substâncias que usamos para fazer a PCR [sigla para reação em cadeia da polimerase, que é o teste mais complexo à covid-19]. Todo esse material é importado. Até podemos ter todas as máquinas para fazer centenas de milhares de testes, mas se não tivermos essas substâncias, não vamos conseguir", assegurou o especialista.

"Além disso, existe uma corrida internacional atrás desses reagentes. A compra dessa substância é muito complexa, temos tido enormes dificuldades. O problema não é por não sabermos fazer testes, nem por não termos as máquinas necessárias, mas sim por não termos reagentes. Não temos onde comprar mais", acrescentou, em entrevista à agência Lusa.

David Urbaez frisou que o "cenário ideal seria testar o máximo de pessoas possível", tendo em conta as melhores estratégias adotadas por países como a Coreia do Sul e Alemanha, "onde o surto foi sendo controlado através do rastreio de pessoas que estiveram em contacto com infetados pelo vírus".

Contudo, a situação do Brasil está longe de se assemelhar à desses países, com o Governo brasileiro a determinar a testagem apenas de pacientes internados em hospitais, em situação considerada grave, assim como de profissionais de saúde.

O Brasil ultrapassou no sábado hoje os mil mortos em decorrência do novo coronavírus, contabilizando 1.056 óbitos e 19.638 infetados.

Entre sexta-feira e sábado, o país sul-americano registou 115 vítimas mortais e 1.781 novos casos de covid-19, sendo que a taxa de letalidade da doença no Brasil está fixada em 5,4%.

A tutela admitiu, entretanto, que o número real de infetados pela covid-19 no Brasil tende a ser maior do que os números divulgados, porque, além de apenas serem testados pacientes internados em hospitais, há ainda milhares de exames a aguardar confirmação.

De acordo com um relatório divulgado na quinta-feira pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), um dos maiores centros de investigação do Brasil, pelo menos 15.107 casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave já identificados no sistema de saúde do Brasil pela Fiocruz ainda aguardam o resultado que identifique o seu tipo de vírus respiratório.

Já o Instituto Adolfo Lutz - laboratório público estadual de São Paulo - acumula cerca de 30 mil exames ao novo coronavírus ainda sem resultado, segundo informações recolhidas até à passada quarta-feira.

Na visão de Urbaez, a pasta da Saúde do Brasil tem feito o possível para ampliar a realização de testes, "correndo desesperadamente" atrás de reagentes para PCR e garantindo que há máquinas disponíveis para a sua realização.

O infecciologista sublinhou ainda que essa é uma situação transversal a países europeus.

"O diagnóstico é um grande problema no Brasil, porque nem todos os métodos estão disponíveis para nós, nem para países do terceiro mundo, na mesma quantidade em que estão para países privilegiados, com Alemanha, Coreia do Sul e agora os Estados Unidos, que entraram numa corrida louca pelos testes, mas que até há poucos semanas também não tinham", salientou.

"França, Espanha, Itália, e os restantes países europeus, de uma forma geral, não têm muitos testes disponíveis. O Brasil está também nessa corrida, mas agora os testes sorológicos começaram a ter a sua validade", indicou o médico, referindo-se aos testes rápidos para o novo coronavírus que, segundo o próprio, começarão a ser utilizados em grandes quantidades nas próximas semanas.

Vistos como a melhor opção num momento de falta de reagentes, o Brasil tem apostado na aquisição de testes sorológicos, que detetam a presença de anticorpos para o novo coronavírus, e onde se englobam os testes rápidos.

"Com o paciente na nossa frente, vamos poder diagnosticá-lo rapidamente, como já se faz com outras doenças infecciosas. Apesar de ainda não terem uma grande sensibilidade, por agora é a solução que temos, e devem começar a ser executados nesta semana, o que ampliará a testagem e, consequentemente, a deteção de casos. Quanto mais casos detetados, melhor conheceremos as características da infeção", advogou.

Contudo, análises laboratoriais feitas aos testes rápidos contratados pelo Brasil à China apontam 75% de probabilidade de erro em resultados negativos, situação que o Ministério da Saúde classificou de "limitações importantes". Dessa forma, os resultados negativos não são confiáveis, havendo a necessidade de realização de novos exames.

"Os testes rápidos ainda são muito grosseiros, há uma dificuldade muito grande em confiar nos resultados que dão negativo porque não são muito sensíveis. Mas, qualquer coisa neste processo de pandemia, onde estamos a falar de milhões de pessoas acometidas, já ajuda bastante, mesmo não sendo a melhor solução", defendeu David Urbaer, frisando, porém, que se tiverem de repetir testes em 50 mil pessoas será "uma operação de guerra".

Um milhão de testes rápidos, doados pela empresa mineira Vale ao Ministério da Saúde do Brasil, chegaram na sexta-feira a São Paulo, provenientes de China.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já provocou a morte a mais de 100 mil pessoas e infetou mais de 1,6 milhões em 193 países e territórios.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

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