Pelas ruas das principais cidades, a bandeiras de comemoração do 09 de Julho, dia da Independência, tornaram-se bandeiras de protesto. As buzinas das longas caravanas de carros e as panelas a bater das janelas uniram-se num grito por "liberdade" que pretendia chegar ao Governo.
Para terem certeza disso, centenas de pessoas aglomeraram-se em frente à residência presidencial de Olivos, na área metropolitana de Buenos Aires e em frente à Casa Rosada, sede do Governo, na Praça de Maio.
"O Governo aproveita-se da situação económica vulnerável das empresas e do povo confinado para avançar contra a propriedade privada e contra a liberdade de expressão", reclamou Carlos Santoro, um dos manifestantes em frente à residência presidencial.
"Marchamos pela liberdade, pela Justiça e pelo bem-estar dos argentinos. Os comerciantes estão a falir enquanto o presidente empenha-se numa quarentena eterna e insustentável", gritou um manifestante por megafone, disparando gritos de "liberdade, liberdade".
De dentro da residência oficial de Olivos, o Presidente retrucou numa videoconferência com os governadores pelo dia da Independência. "Vim aqui para terminar com os 'odiadores' seriais. Não venho instalar um discurso único. Sei que há diversidade, mas preciso que seja conduzida com responsabilidade", pediu.
"Na polarização social argentina, um terço da população apoia o Governo. Outro terço é contra. Mas há um terço flutuante que, de acordo com as circunstâncias, inclina-se para um lado ou para outro. E essa faixa da população demonstra cansaço porque está angustiada, porque a situação económica e social deteriorou-se muito e porque vê ameaças à liberdade", disse à Lusa o analista político Rosendo Fraga, uma referência no país.
Os manifestantes também protestaram contra o que chamam de 'infetadura': uma mistura de infeção com ditadura. O termo procura ilustrar que Alberto Fernández governa por decretos enquanto o Congresso não se reúne e a Justiça decidiu continuar em quarentena.
A credibilidade de Alberto Fernández, que completa sete meses no cargo, quatro dos quais em quarentena, vem em queda livre. Todas as sondagens apontam para perdas entre 15 e 25 pontos de imagem positiva, voltando ao nível prévio à pandemia.
A consultora D'Alessio Irol & Berensztein, por exemplo, vê na deterioração económica e no avanço contra liberdades os principais motivos para uma queda de 60% a 49% na imagem positiva do Presidente.
Apesar de exibir números que causariam inveja em vizinhos como Brasil, Chile e Peru, a Argentina endurece as restrições. O país tem 1707 mortos num universo de 45 milhões de habitantes e apenas 59,7% das unidades de tratamento intensivo ocupadas.
Mesmo assim, o Governo argentino projeta que, se a curva de contágios chegar ao auge no final de julho, as unidades de tratamento intensivo vão entrar em colapso.
O 'lockdown' argentino vai até, pelo menos, dia 17 de julho na área metropolitana de Buenos Aires, responsável pela metade do Produto Interno Bruto do país. No total 16 milhões de pessoas em confinamento, cerca de 35% da população.
"Este protesto revela o estado de ânimo da população. O protesto também tenta influir na postura do Governo que, na próxima semana, terá de anunciar como a quarentena continua no país", indicou à Lusa o analista Rosendo Fraga.