Os governos orçaram no total cerca de 589 mil milhões de dólares (496 mil milhões de euros) para proteção social na atual crise, o que representa cerca de 0,4% do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, mas a análise do relator, hoje divulgada, considera que essas iniciativas não vão impedir o aumento da pobreza.
Esse aumento pode chegar a 176 milhões de pessoas, se a linha de pobreza for considerada para rendimentos abaixo de 3,2 dólares (2,7 euros) por dia, avisou Olivier De Schutter, um académico jurídico belga nomeado pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU como relator especial sobre pobreza extrema e direitos humanos.
De Schutter também indicou que muitas comunidades necessitadas podem estar a ser excluídas dos planos de proteção, devido a pormenores como o facto de muitos programas solicitarem que os beneficiários se registem pela internet, meio a que muitas famílias de baixos rendimentos não têm acesso.
Outros programas colocam "condições impossíveis de satisfazer" por pessoas em condições de trabalho precárias ou sem residência permanente, como é o caso de muitos trabalhadores migrantes ou do setor informal (61% da força de trabalho mundial), denuncia o relator belga.
"As piores consequências da crise sobre a pobreza ainda estão por vir", previne o relator das Nações Unidas, que também lamenta que muitos dos programas de proteção social já estejam a ser abandonados ou não possam ser renovados caso o partido político dos governos mude em futuras eleições.
Face à situação e nas vésperas da Assembleia-geral das Nações Unidas, que reunirá vários líderes mundiais em teleconferência, o relator pediu aos representantes dos vários países para que reforcem os planos de ajuda aos grupos mais vulneráveis "com base em princípios de direitos humanos".
O relator considerou ainda que a desaceleração económica resultante da pandemia não tem precedentes em tempos de paz desde a Grande Depressão da década de 1930.
"As famílias pobres já esgotaram todas as reservas que possuíam e venderam os seus ativos", disse, sublinhando que "os piores impactos da crise sobre a pobreza ainda estão por vir".
A pandemia de covid-19 já provocou mais de 904 mil mortos e quase 28 milhões de casos de infeção em 196 países e territórios, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.
A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de dezembro, em Wuhan, uma cidade do centro da China.
As medidas para combater a pandemia paralisaram setores inteiros da economia mundial e levaram o Fundo monetário Internacional (FMI) a fazer previsões sem precedentes nos seus quase 75 anos: a economia mundial poderá cair 4,9% em 2020, arrastada por uma contração de 8% nos Estados Unidos, de 10,2% na zona euro e de 5,8% no Japão.