O inquérito realizado em 130 países fornece os primeiros dados globais que mostram o impacto devastador da covid-19 no acesso aos serviços de saúde mental e realça a necessidade urgente de um aumento do financiamento.
O inquérito, que foi realizado entre junho e agosto deste ano, em 130 países das seis regiões da Organização Mundial da Saúde, avalia como a prestação de serviços mentais, neurológicos e de uso de substâncias mudou devido à covid-19, os tipos de serviços que foram interrompidos e como os países estão a adaptar-se para superar esses desafios.
Mais de 60% dos países reportaram perturbações nos serviços de saúde mental para pessoas vulneráveis, incluindo crianças e adolescentes (72%), idosos (70%) e mulheres que necessitam de serviços pré-natais ou pós-natais (61%).
Segundo o estudo, 67% viram interrupções no aconselhamento e psicoterapia, 65% nos serviços de redução de danos.
Quase um terço (35%) reportou interrupções nas intervenções de emergência, incluindo pessoas que sofrem de convulsões prolongadas, síndromes de retirada de uso de substâncias severas, e delírio.
Houve 30% que relataram perturbações no acesso a medicamentos para distúrbios mentais, neurológicos e de uso de substância e quase três quartos reportaram pelo menos perturbações parciais nos serviços de saúde mental escolar e no local de trabalho (78% e 75%, respetivamente).
Enquanto muitos países (70%) adotaram a telemedicina ou a teleterapia para superar as interrupções dos serviços presenciais, existem disparidades significativas na adoção destas intervenções, adianta o estudo.
Mais de 80% dos países de alto rendimento reportaram o desenvolvimento de telemedicina e teleterapia para colmatar as lacunas na saúde mental, em comparação com menos de 50% dos países de baixos rendimentos.
A investigação é divulgada dias antes da realização de um grande evento da OMS a 10 de outubro, Dia Mundial da Saúde Mental, um evento virtual de 'advocacy' da OMS que reunirá líderes mundiais, celebridades e defensores da saúde mental para apelar ao aumento dos investimentos nesta área na sequência da pandemia.
A OMS já salientou o subfinanciamento crónico da saúde mental: antes da pandemia, os países gastavam menos de 2% dos seus orçamentos nacionais de saúde nesta área e lutavam para satisfazer as necessidades das suas populações.
Agora, a pandemia está a fazer aumentar a procura destes serviços. "O luto, o isolamento, a perda de rendimento e o medo estão a desencadear condições de saúde mental ou a exacerbar as já existentes", salienta.
"Muitas pessoas podem estar a enfrentar um aumento do consumo de álcool e de drogas, insónias e ansiedade". Enquanto isso, o próprio vírus SARS-CoV-2 pode levar a complicações neurológicas e mentais, como delírio, agitação ou ataque.
As pessoas com distúrbios pré-existentes mentais, neurológicas ou derivados de consumo de substâncias também são mais vulneráveis à covid-19 e podem ter um maior risco de resultados graves e até mesmo de morte, adverte.
A OMS afirma, em comunicado, que emitiu orientações aos países sobre como manter os serviços essenciais - incluindo os serviços de saúde mental - durante a covid-19 e recomenda que os países aloquem recursos à saúde mental como componente integrante dos seus planos de resposta e recuperação.
Também insta os países a monitorizarem as mudanças e perturbações nos serviços para que possam abordá-los conforme necessário.
Embora 89% dos países tenham comunicado no inquérito que a saúde mental e o apoio psicossocial fazem parte dos seus planos nacionais de resposta à covid-19, apenas 17% têm financiamento adicional total para cobrir estas atividades
"Tudo isto sublinha a necessidade de mais dinheiro para a saúde mental", diz, sublinhando que "à medida que a pandemia continua, será ainda mais procurada em programas nacionais e internacionais de saúde mental que sofreram anos de subfinanciamento crónico".
Os financiadores internacionais também precisam de fazer mais: a saúde mental ainda recebe menos de 1% da ajuda internacional destinada à saúde, sublinha, salientando que os que investem em saúde mental vão "colher recompensas".