Pandemia é trunfo perigoso da extrema-direita na Alemanha
A pandemia de covid-19, que tem precipitado a queda de apoiantes da Alternativa para a Alemanha (AfD), pode ser apresentada como trunfo do partido de extrema-direita no congresso deste fim de semana.
© Reuters
Mundo Covid-19
A menos de seis meses das eleições que vão escolher o sucessor de Angela Merkel na chancelaria, politólogos alemães ouvidos pela agência Lusa concordam que as sondagens não são para levar muito a sério e que no meio de uma pandemia, com uma campanha de vacinação a decorrer, tudo pode mudar, inclusive os resultados que apontam uma queda das intenções de voto para a AfD.
O partido, que reúne em congresso presencial este fim de semana, na cidade de Dresden, não vai além dos 10% nas intenções de voto, segundo a mais recente sondagem publicada na quarta-feira pelo instituto Forsa.
"O partido perdeu parte dos seus apoiantes desde as últimas eleições em 2017. Mudou, é agora mais radical, com os serviços secretos federais (BfV) muito mais atentos ao que se passa, o que não dá uma boa imagem à AfD", revelou à Lusa Wolfgang Schroeder, do Centro de Ciências Sociais de Berlim (WZB).
"Cerca de 25% dos apoiantes do partido está satisfeito com a atuação do Governo durante a crise provocada pela pandemia de covid-19 (...) Muitos destes apoiantes são mais velhos e não concordam com políticas 'abertas' no combate ao vírus", acrescentou, adiantando ainda assim, que isso pode mudar.
"Agora entramos num período em que se debate o confinamento. E nesse assunto, há vários grupos que são as vítimas desta estratégia, nos setores da cultura, trabalhadores independentes. Se o partido conseguir a aceitação destes grupos, poderá conseguir um melhor resultado", sustentou o politólogo.
Para Thomas Gschwend, professor na Universidade de Mannheim, os resultados mais fracos da AfD prendem-se sobretudo com a falta de "políticas alternativas". Em vez disso, "passam o tempo em conflitos internos", acrescentando que, sem a pandemia de covid-19, o partido deverá "enfraquecer ainda mais".
Na abertura do "super ano eleitoral" na Alemanha, a AfD perdeu nos dois estados federados que foram a votos: em Bade-Vurtemberga caiu 5,4 pontos até aos 9,7% dos votos e na Renânia-Palatinado perdeu 4,3 até aos 8,3%.
Mas "muito ainda pode mudar" nos próximos meses, acredita Lucas Constantin Wurthmann, professor na Universidade Heinrich-Heine de Dusseldorf.
"A vacinação, a decisão sobre quem será o principal candidato dos democratas-cristãos, ou mesmo uma crise económica. Os alemães só votaram num Governo completamente novo em 1998. A estabilidade geralmente é bem-sucedida ao nível nacional", sustentou em declarações à Lusa.
O politólogo considera muito provável que a Afd tente "combinar as posições anti-imigração com a narrativa de um sistema político corrupto que não é capaz de resolver a situação de pandemia".
"Além do partido dinamarquês minoritário SSW, a AfD é o único que está no parlamento, mas não num governo [dos 16 regionais]. Acredito que joguem essa carta de 'outsider' sempre que for possível", antecipou.
Para Thomas Gschwend é certo que o congresso do fim de semana será tudo menos aborrecido.
"Vamos poder assistir a um confronto entre o líder, Jörg Meuthen, que é considerado um moderado (pelos padrões da AfD), e a ala mais à direita do partido", revelou o professor na Universidade de Mannheim.
"Se nos recordarmos do último congresso do partido, em Kalkar, na Renânia do Norte-Vestefália, Meuthen atacou publicamente os direitistas do partido num discurso altamente divulgado, e criticou duramente a sua retórica radical. Talvez seja a hora de pagar as consequências. Irritações e lutas internas vão estar sempre em primeiro lugar, políticas construtivas vão surgir em segundo", apontou.
O politólogo Wolfgang Schroeder que folheou o programa eleitoral da AfD, partido com oito anos, que está presente nos parlamentos dos dezasseis estados federados alemães e no Bundestag, assume que ele contrasta com as ideias defendidas por um possível governo formado pela União Democrata-Cristã (CDU) e pelos Verdes.
"É mais orientado para os assuntos nacionais, para a família (...) é um partido de protesto e, neste caso, não precisa de explicar o que vai fazer, mas sim o que não quer fazer. Não quer a Europa, não quer políticas ambientais, com os carros elétricos, não quer uma sociedade multicultural, mas sim uma sociedade tradicional."
Se as eleições fossem hoje, e de acordo com as últimas sondagens, a CDU venceria com 27% dos votos (em 2017 obteve 32,9%), os Verdes ficariam em segundo lugar com 23% (no último escrutínio obtiveram 8,9%) e o Partido Social Democrata alemão (SPD) não iria além dos 15% (há quatro anos conseguiu 20,5%).
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