"Europa será social ou não será de todo", diz investigadora

A investigadora do Instituto Jacques Delors Sofia Fernandes considera que a "Europa será social ou não será de todo", identificando o reforço da dimensão social como "um imperativo" para enfrentar os "desafios socioeconómicos e políticos" atuais.

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Lusa
23/04/2021 06:00 ‧ 23/04/2021 por Lusa

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"A Europa será social ou não será de todo. Existem hoje desequilíbrios sociais importantes entre os Estados-membros que ameaçam o futuro do projeto europeu. Sem uma dimensão social reforçada, o euroceticismo vai continuar a ganhar terreno na União Europeia (UE) e já vimos isso na década passada com a crise na zona euro", frisa Sofia Fernandes em entrevista à Lusa.

A investigadora relembra que a "UE tem vários objetivos que lhe foram atribuídos pelos Estados-membros nos Tratados", entre os quais "a melhoria das condições de vida e de trabalho dos cidadãos, um nível de emprego elevado, a coesão social entre os Estados, a luta contra as exclusões e as desigualdades".

"A UE tem de agir de forma determinada contra os desequilíbrios sociais e alcançar esses objetivos", aponta.

A investigadora ilustra esse desequilíbrio com os dados do desemprego jovem da UE: se a taxa de desemprego juvenil na UE se situa nos 17%, na Alemanha é de cerca de 6% e em Espanha sobe para cerca de 40%.

"Não é viável ter um projeto europeu, um projeto comum, com tais divergências e a UE tem de agir. Sobretudo porque a pandemia atual e vários desafios que os países europeus enfrentam -- tais como as transições 'verde' e digital, o envelhecimento da população ou as migrações -- terão um impacto nos mercados de trabalho e nos sistemas de proteção social dos Estados e poderão, sem medidas de acompanhamento, agravar esses desequilíbrios", destaca.

Nesse sentido, a investigadora considera que a pandemia de covid-19 pode ser um elemento "federador" neste reforço da política social europeia, tal como demonstrado na resposta inicial da UE a esta crise, em que, contrariamente à gestão da crise na zona euro em 2010, procurou "atenuar as consequências sociais".

Entre as medidas que considera traduzirem "uma coerência e um voluntarismo" da UE para "limitar o impacto social da pandemia", Sofia Fernandes destaca a criação do programa SURE -- que visa completar os esforços nacionais de proteção do emprego e dos trabalhadores --, o reforço do programa de ajuda alimentar da UE aos mais carenciados ou ainda o plano de apoio ao emprego jovem.

Reiterando que a UE "fez muito e provavelmente mais do que aquilo que poderíamos esperar", a investigadora relembra, no entanto, que as competências da UE na área social e do emprego "são limitadas" e que os "atores principais para limitar o impacto social" da pandemia "são os Estados-membros".

"As medidas adotadas a nível europeu não são suficientes. Têm de ser completadas por iniciativas a nível nacional que vão na mesma direção", sublinha.

Nesse âmbito, a investigadora espera que a Cimeira Social do Porto, organizada pela presidência portuguesa do Conselho da UE nos dias 07 e 08 de maio, permita "colocar as questões sociais no topo da agenda política europeia" e que os Estados-membros se "comprometam" com o plano de ação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais.

"O que interessa, numa primeira fase, é garantir que pelo menos o que a Comissão propôs seja realmente implementado, porque isso não é um dado adquirido: vai depender, nomeadamente na área da legislação, da vontade ou não dos Estados-membros", sublinha.

Sofia Fernandes espera também que o evento permita "ir além da dimensão das instituições e dos governos nacionais" para induzir uma mobilização "dos sindicatos, das empresas e da sociedade civil".

"Penso que só se todos se implicarem, se todos contribuírem, é que podemos garantir que cada um dos princípios [do Pilar] se tornará uma realidade na vida de cada um dos cidadãos da UE", frisa.

A agenda social é uma das grandes prioridades da presidência portuguesa do Conselho da UE, que espera conseguir a aprovação do plano de ação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, apresentado pela Comissão Europeia em março, e que estabelece três objetivos.

Além de procurar garantir que, até 2030, pelo menos 78% da população europeia está empregada, o Plano de Ação em questão pretende ainda que haja menos 15 de milhões de pessoas em risco de pobreza, e que 60% dos adultos europeus participem anualmente em ações de formação.

Na Cimeira Social do Porto, a presidência portuguesa quer ver aprovado um programa com medidas concretas baseadas no Pilar Social Europeu, um texto não vinculativo de 20 princípios com o intuito de promover os direitos sociais na Europa.

O texto defende um funcionamento mais justo e eficaz dos mercados de trabalho e dos sistemas de proteção social, nomeadamente ao nível da igualdade de oportunidades, acesso ao mercado de trabalho, proteção social, cuidados de saúde, aprendizagem ao longo da vida, equilíbrio entre vida profissional e familiar e igualdade salarial entre homens e mulheres.

Leia Também: Sul da Europa está mais exposto a desemprego que pode atrasar recuperação

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