Nas ruas da capital Minsk quase que passa despercebido o regime autoritário liderado há 26 anos por Lukashenko, mas essa presença faz-se sentir no apressar do passo, no desviar do olhar e na recusa das pessoas em ceder falar de Protasevich, quando abordadas pela Lusa.
Roman Protasevich, 26 anos, que está detido em Minsk desde 23 de maio, tornou-se num alvo de Lukashenko ao ser a principal fonte de informação dos protestos antigovernamentais através dos canais NEXTA na rede social Telegram, logo após as eleições presidenciais de agosto de 2020.
O tema é sensível para os bielorrussos, principalmente para os opositores de Lukashenko, pelo que a relutância na sua abordagem vai muito além da dificuldade linguística e levou a quase totalidade dos entrevistados a ter solicitado reserva de identidade.
Lisa., "apenas Lisa.", pediu a estudante, acedeu a uma breve troca de palavras em inglês e deu conta à Lusa, ao ritmo lento de um abanar desaprovador de cabeça, do desconforto com a situação, com um contido desagrado para com o Presidente Lukashenko.
"É uma situação inacreditável que me envergonha. E não falo só por mim, pois tenho muitos amigos que pensam da mesma forma", admitiu Lisa., que faz parte da ínfima percentagem de bielorrussos que usa máscara de proteção anticovid-19.
Com cerca de 9,5 milhões de habitantes (dos quais quase dois milhões em Minsk), distribuídos por 207.600 km/quadrados (2,2 vezes maior do que a área de Portugal), o país, que regista menos de três mil mortos por covid-19, convive com a pandemia sem tomar especiais medidas de precaução.
"Uso máscara para me proteger a mim e aos outros. Mas há muita gente que ainda hoje não acredita na existência da covid-19. Não acreditam no que não se vê", justificou a resignada aluna de línguas, com um involuntário encolher de ombros.
Janna K., após declinar inicialmente com um educado "net, spasibo" (não, obrigado), foi outra das exceções que acedeu falar sobre o caso Protasevich, enquanto esperava num banco de jardim pelo filho, a recrear-se com uma trotineta elétrica.
"É uma situação complicada. Dizem [os canais oficiais estatais] que estava em causa a nossa segurança, mas há muita gente que não acredita nisso", referiu Janna K. com visível desconforto entre olhares controladores à procura do filho.
O diálogo com Serhiy, na casa dos 40 anos, abriu de forma efusiva com Cristiano Ronaldo e passou do tom ameno da situação da covid-19 para o quase sussurro na questão da detenção de Protasevich, que fez o receoso conversador baixar o tom.
"É uma questão política. Acho que a União Europeia não está correta [ao impor sanções}, porque nós [bielorrussos] não temos culpa. E não acredito que assim consiga resolver a situação", considerou, dando por encerrada a curta entrevista com um "do svidanija" (adeus).
Para Diyanna P., que colabora com uma empresa de autocarros que faz visitas guiadas a Minsk, as pressões externas "não se fazem sentir no país", embora reconheça que a detenção de Protasevich, e da forma como aconteceu, cria "algum embaraço e vergonha".
Kanstantsin, abordado pela Lusa nos festejos dos 75 anos da fábrica de tratores de Minsk (Belarus), a admirar um modelo do pós-guerra, dá o benefício da dúvida a Lukashenko, mas também discorda da forma como aconteceu a detenção de Protasevich.
Protasevich, colaborador próximo da líder da oposição bielorrussa no exílio, Svetlana Tijanovskaya, está acusado de "atividade terrorista" pelo KGB e foi detido quando o avião da Ryanair em que seguia com a namorada, que voava de Atenas para a capital da Lituânia, Vílnius, foi intercetado e desviado para Minsk.
As presidenciais de 09 de agosto de 2020 na Bielorrússia deram a vitória a Aleksandr Lukashenko, com 80 por cento dos votos, um escrutínio contestado pela oposição e que não é reconhecido pelos países ocidentais.
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