Em declarações aos jornalistas após participar num Conselho de Negócios Estrangeiros no Luxemburgo, durante o qual o acordo comercial com o Mercosul foi abordado no quadro da discussão alargada sobre a relação da UE com a América Latina, Augusto Santos Silva revelou que voltou a defender hoje perante os seus homólogos que cabe agora aos europeus dizer aos parceiros latino-americanos que compromissos adicionais deseja, até porque estes já manifestaram abertura.
"Há várias semanas que os países do Mercosul aguardam que a UE diga quais são as propostas que quer fazer, quais são as clarificações adicionais que quer estabelecer. A presidência portuguesa, que não pode fazer essas propostas, porque esse trabalho pertence à Comissão Europeia, tem ao longo destes meses procurado, vamos dizer, 'animar' a Comissão Europeia para realizar esse trabalho e apresentar essas propostas", disse.
Após ter dito que a sua "expectativa" é que Portugal consiga "aproveitar ainda os dias que restam da presidência portuguesa", o ministro admitiu que a resposta não depende de si, mas garantiu que tudo tem feito, e continuará a fazer até 30 de junho, último dia da presidência portuguesa, para contribuir para o relançamento de um processo negocial que até já estava fechado.
"A resposta não depende mim. Isso a que chamei 'animação', tenciono fazê-lo até 30 de junho e ainda hoje fiz com o vigor que as circunstâncias requerem", disse.
Augusto Santos Silva comentou que, "em relação ao acordo com o Mercosul, persistem as divisões entre os Estados-membros, mas também persiste o acordo que existe entre os Estados-membros sobre a necessidade de haver um instrumento adicional ao acordo já negociado, que clarifique os compromissos recíprocos designadamente em matéria ambiental".
"Há disponibilidade da parte dos países do Mercosul. Para usar uma metáfora que é adequada aos tempos que vivemos, a bola está do lado, portanto, da UE, que tem de apresentar as propostas que lhe parecem necessárias para que essa clarificação se faça num instrumento adicional", disse.
Mantendo "a comparação futebolística", o ministro disse que houve um primeiro jogo que durou "20 anos", o tempo necessário para a conclusão das negociações, há dois anos.
"Concluímos essas negociações em 2019 com um acordo que a Comissão Europeia celebrou em nosso nome, cumprindo um mandato que nós todos lhe demos, um mandato que não era da Comissão, mas sim do Conselho. Aí terminou a primeira 'mão' e a segunda nem era necessária porque o jogo terminou com a vitória de ambos", observou.
No entanto, "alguns Estados-membros e algumas famílias políticas no Parlamento Europeu suscitaram questões", que admitiu serem "inteiramente legítimas", que forçam a marcação de "uma segunda 'mão'", dada a "necessidade de clarificação de compromissos de ambas as partes no que diz respeito a questões de natureza ambiental, seja quanto ao cumprimento dos objetivos do Acordo de Paris, seja quanto ao combate à desflorestação e preservação da biodiversidade".
"E neste caso, a bola pertence aos europeus [...] porque se nós dizemos aos latino-americanos que precisamos de clarificar umas questões, é evidente que a primeira pergunta que nos fazem é que questões querem clarificar e como querem clarificar", apontou.
"Designadamente na minha responsabilidade enquanto presidência do Conselho de Negócios Estrangeiros [na vertente de] Comércio, e também sei que o Alto Representante [Josep Borrell] fez a mesma coisa, dirigi-me aos países do Mercosul perguntando se estão disponíveis" para examinar este instrumento adicional, "e a resposta unânime foi 'sim, estamos disponíveis, vamos lá'", notou, reforçando então que cabe agora à UE dar o "pontapé-de-saída".
A conclusão do acordo comercial, alcançado em junho de 2019 entre a UE e os países do Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai), após duas décadas de negociações, está atualmente em fase de tradução e revisão jurídica, finda a qual, com um acordo político dos 27, os países de ambos os blocos deverão ratificá-lo.
Mas vários Estados-membros, entre os quais a Irlanda e a França, além de eurodeputados e organizações da sociedade civil, têm manifestado fortes reservas à ratificação do acordo, invocando preocupações relativas à sua compatibilidade com o cumprimento do Acordo de Paris e ao impacto que terá para o aquecimento global, apontando nomeadamente a desflorestação da Amazónia, tendo a UE decidido solicitar um "instrumento adicional" ao acordo comercial, que não começou ainda a ser negociado com o Mercosul.
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