O cessar-fogo foi anunciado esta segunda-feira à noite, depois de as forças leais às antigas autoridades, da Frente Popular de Libertação do Tigray (TPLF, na sigla em inglês), terem entrado na capital estadual, Mekele.
A cidade tinha sido tomada pelo exército federal em novembro de 2020, na sequência da ofensiva lançada pelo primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, para derrubar as autoridades locais da TPLF no dia 04 desse mês.
A operação de imposição da "lei e da ordem" foi decidida por Adis Abeba depois de as forças estaduais de Tigray terem alegadamente atacado bases militares federais em território tigray, de acordo com a explicação então divulgada por Abiy Ahmed, Prémio Nobel da Paz de 2019, em reconhecimento pelo seu papel na reconciliação com a Eritreia e pela abertura reformista que tinha imprimido no país desde a sua chegada ao poder, no início de abril de 2018.
Apesar da vitória proclamada, já após a queda de Mekele, em 28 de novembro último, os combates nunca pararam entre as forças pró-TPLF, denominadas Forças de Defesa de Tigray (TDF, na sigla em inglês), e o exército federal etíope, apoiado por tropas estaduais vizinhas de Amhara e pelo exército da Eritreia, o país fronteiriço do estado de Tigray.
A reentrada esta segunda-feira das TDF em Mekele, depois do exército federal e a administração transitória imposta por Adis Abeba terem fugido no início do dia, representa um ponto de viragem no conflito, que dura há quase oito meses.
Enquanto a população tigray celebrava o evento nas ruas, o Governo de Abiy Ahmed anunciava um "cessar-fogo unilateral" na segunda-feira à noite.
Uma declaração do antigo governo estadual do Tigray divulgada durante a noite saudou os avanços da TDF e disse que Mekele estava totalmente sob o seu controlo.
"O governo e o exército de Tigray farão tudo o que for preciso para garantir a sobrevivência e a segurança do nosso povo", diz a declaração.
"O governo de Tigray apela ao nosso povo e ao exército de Tigray para intensificarem a sua luta até que os nossos inimigos abandonem completamente o Tigray", acrescentou a declaração.
A TDF vinha a tomar várias pequenas cidades tigray desde o início da contraofensiva lançada há uma semana, precisamente no dia das eleições gerais etíopes, que não se realizaram naquele estado, como, de resto, em cerca de um terço das circunscrições do país, esperando-se que o plebiscito venha a ser concluído em setembro.
Os resultados das eleições do passado dia 21 ainda não foram anunciados, mas espera-se uma vitória do Partido da Prosperidade, de Abiy Ahmed. O primeiro-ministro etíope é eleito pelo Parlamento, pelo que o atual chefe do Governo etíope terá que esperar pela nova assembleia para receber finalmente a legitimação de um cargo que exerce desde 2018.
Os oito meses de conflito no Tigray foram marcados por numerosas exações sobre civis (massacres, violações, deslocações de populações) que suscitaram a indignação da comunidade internacional.
Segundo a ONU, pelo menos 350.000 pessoas encontram-se em estado de fome na região, o que o Governo etíope contesta.
O Governo federal afirmou que o cessar-fogo durará até ao fim da atual "estação agrícola" e que tem como objetivo permitir o cultivo de culturas e a distribuição de ajuda humanitária, permitindo, ao mesmo tempo, aos combatentes rebeldes "retomarem um caminho pacífico".
O Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, classificou na segunda-feira os últimos acontecimentos no Tigray como "extremamente preocupantes" e considerou que "demonstram, mais uma vez, que não existe uma solução militar para a crise".
Guterres manifestou ainda a "esperança de que se verifique uma cessação efetiva das hostilidades".
Os Estados Unidos, a Irlanda e o Reino Unido solicitaram uma reunião de emergência do Conselho de Segurança das Nações Unidas, que poderá vir a ter lugar esta sexta-feira.
O Conselho de Segurança nunca analisou o caso do Tigray, uma ordem de trabalhos sistematicamente vetada por africanos, China, Rússia e outros membros do conselho, que alegam que a crise é um assunto interno etíope, de resto, como sempre declarado por Adis Abeba, que a designa como uma operação fundamentalmente policial, de "imposição da lei e da ordem".
O envolvimento de forças estaduais de Amhara e das forças armadas da Eritreia "complicará a implementação global de um cessar-fogo temporário, que neste momento parece ser uma decisão principalmente unilateral do Governo federal", afirmou Connor Vasey, analista da consultoria de risco Eurasia Group, citado pela agência France-Presse.
Se vierem a realizar conversações com o objetivo de um possível acordo político, "é provável que sejam difíceis e muito longas", considerou.
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