Ao discursar na abertura de uma conferência de ajuda internacional aos libaneses, o Presidente francês, Emmanuel Macron, voltou a acusar os líderes libaneses de bloquear a formação de um novo Governo e a investigação do incidente, tendo prometido 100 milhões de euros de ajuda direta à população.
No final da conferência, Mácron anunciou que a angariação do valor-alvo do evento -- 300 milhões de euros - foi reunido e será canalizado para a ajuda humanitária necessária ao país.
A conferência virtual de quarta-feira, co-organizada pela França e as Nações Unidas, teve como objetivo mostrar o apoio ao povo libanês, disse o Presidente francês.
Em 04 de agosto de 2020, pouco depois das 18:00 locais (16:00 em Lisboa), centenas de toneladas de nitrato de amónio armazenadas durante anos num armazém degradado e "sem medidas de precaução" explodiram na capital libanesa.
A explosão causou 214 mortes, mais de 6.500 feridos e bairros inteiros destruídos, aprofundando as dificuldades de um país a viver a pior crise socioeconómica da sua história e liderado por uma classe política acusada de corrupção e inércia.
Para exigir justiça, as famílias das vítimas e ativistas organizam hoje manifestações, vigílias à luz de velas e cerimónias religiosas em frente ao porto ou perto do Parlamento.
De bandeira nacional em punho, alguns libaneses juntaram-se em pequenos grupos em direção ao centro de Beirute ou para perto do porto, com o exército e a polícia a multiplicarem barreiras para fechar as principais avenidas da zona ao tráfego, segundo um correspondente da agência de notícias France-Presse.
No quartel de bombeiros do bairro de Karantina, próximo do porto, estavam sentados familiares das vítimas, algumas mulheres vestidas de preto, segurando retratos de parentes mortos.
Na segunda-feira, as famílias das vítimas ameaçaram "partir os ossos" a qualquer pessoa que se opusesse à sua raiva nas ruas.
Entre essas vítimas encontram-se bombeiros, funcionários do porto, automobilistas ou residentes com casas na zona, quando as janelas estilhaçaram e os móveis voaram.
Apesar da dimensão da tragédia que abalou o mundo inteiro, a investigação local não apresentou resultados concretos e nenhum culpado foi julgado, apesar de alguns ex-ministros estarem ainda na mira da justiça.
Os líderes libaneses são acusados de fazerem tudo para sabotar a investigação e evitar as acusações, argumentando uma alegada imunidade.
Mesmo que, um ano depois, algumas feridas tenham cicatrizado, os bairros tenham sido reconstruídos, graças a organizações não-governamentais e voluntários -- o Estado pouco ou nada fez --, a nação continua traumatizada.
Uma em cada três famílias tem filhos que apresentam sinais de "'stress' psicológico", segundo a Unicef, e o caso piora entre os adultos já que afeta um em cada dois.
Após um ano, a investigação não determinou oficialmente as causas da explosão, que aconteceu após um incêndio num hangar, que segundo as fontes de segurança foi provocado por trabalhos de soldadura.
Segundo a Amnistia Internacional, as autoridades "atrapalharam descaradamente a procura pela verdade".
O país espera ainda por um Governo que deve dar início às reformas exigidas pela comunidade internacional em troca da tão necessária ajuda, após a renúncia do então primeiro-ministro Hassan Diab, poucos dias após a explosão.
Praticamente inalterada desde a guerra civil (1975-1990), a classe política é acusada de negligência, corrupção e de estar desligada da realidade.
Enquanto isso, o país afunda: agravamento da pobreza, queda livre da moeda local, restrições bancárias sem precedentes, hiperinflação, combustível e medicamentos esgotados e até ter eletricidade se tornou um luxo.
Como se a situação não fosse suficiente, o Líbano disparou foguetes contra Israel, dois países vizinhos tecnicamente em guerra, resultando em represálias em território libanês, mas sem vítimas.
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