Direitos de mulheres serviram para captar "simpatia feminista"

A investigadora Saadia Toor, considera que a tese de que a intervenção militar no Afeganistão protegeu as mulheres desse país serviu essencialmente para atrair a simpatia de feministas liberais para a causa do Governo dos EUA no Médio Oriente.

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© Aykut Karadag/Anadolu Agency via Getty Images

Lusa
25/08/2021 18:38 ‧ 25/08/2021 por Lusa

Mundo

Afeganistão

 

"O estatuto da mulher afegã ficou substancialmente diminuído na última década, sobretudo por causa da ocupação norte-americana no Afeganistão", disse à Lusa Saadia Toor, professora da City University of New York (CUNY) e investigadora especializada em economia política internacional e estudos de género.

Num artigo intitulado 'Feminismo Imperialista Redux', publicado em 2012, a investigadora lançou a provocação de acusar o movimento feminista de se estar a deixar iludir com as vantagens para as mulheres afegãs de uma intervenção militar internacional no Afeganistão, onde se pretendia fazer crer que essa invasão as protegeria de regimes que não respeitavam os seus direitos fundamentais.

"Como se comprova agora, com a retirada das tropas norte-americanas, as mulheres afegãs são as mais vulneráveis vítimas de um processo que não resultou", explica Saadia Toor, referindo-se às ameaças que pendem sobre os milhões de mulheres e jovens raparigas que permanecem no país, no momento em que o movimento talibã tomou o poder em Cabul.

Toor defende, contudo, que a campanha da NATO e das forças militares norte-americanas no Afeganistão foi, sobretudo, benéfica para "as mulheres afegãs que continuam a dominar a corrente liberal dominante nos Estados Unidos".

Ou seja, a investigadora considera que a esquerda política nos EUA se deslumbrou com a possibilidade de proteger as mulheres afegãs do regime fundamentalista islâmico, esquecendo que, no terreno, as mulheres continuavam a ser as principais vítimas da guerra que prendeu uma coligação internacional no Afeganistão durante 20 anos.

Saadia Toor prefere colocar o problema numa outra perspetiva e alertar para o facto de as mulheres afegãs, e a sua alegada proteção, terem servido de argumento para a "retórica imperialista" que procura legitimar a intervenção ocidental "benevolente" no Médio Oriente.

"A situação das mulheres afegãs, em particular das mais jovens, foi muitas vezes cinicamente utilizado para legitimar conflitos regionais e locais", explica a professora da CUNY, falando mesmo em "oportunismo do feminismo imperialista", que ficou agora denunciado, perante a falta de cuidado do Governo de Washington em salvar muitas dessas mulheres, incluindo aquelas que estiveram ao lado das forças internacionais.

A investigadora realça que o regime talibã é "homofóbico e misógino" e não lhe faltam adjetivos para condenar o fundamentalismo do novo regime afegão, mas não deixa de apontar o dedo à falta de uma estratégia coerente por parte do Ocidente relativamente ao futuro da população afegã, em particular no que diz respeito às suas franjas mais vulneráveis, que agora enfrentam sérias ameaças.

Também não ficam de fora de reparos às organizações não governamentais internacionais que, segundo Toor, muitas vezes foram condescendentes com as "estratégias imperialistas" que usaram valores feministas e a defesa de direitos humanos para justificar uma intervenção militar que escondia outras intenções, mais "materialistas e muito pouco éticas".

Leia Também: EUA darão prioridade à saída das suas tropas nos últimos dias

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