Um número que a representante do Grupa Granica -- iniciativa que reúne 14 organizações não-governamentais (ONG) que trabalham na área dos direitos humanos e apoiam refugiados e migrantes na Polónia -- acredita ser maior, mas que é impossível de contabilizar com precisão.
Apesar de se tratar de um grupo muito grande, Natália Gebert defende que seria perfeitamente gerível para a Polónia acolher todos estes migrantes e refugiados e acabar com a crise que se tem desenrolado na fronteira.
"Não estamos a falar da crise migratória de 2015 nem sequer dos números de pessoas que normalmente chegam à Grécia ou a Itália", afirmou em entrevista à Lusa, frisando que estes migrantes concentrados na zona fronteiriça estão a viver sem condições mínimas.
"Mesmo que sejam mais de 10 mil pessoas, trata-se de um número perfeitamente gerível para um país europeu grande como a Polónia", garantiu a ativista, criticando a opção do Governo polaco de "não deixar entrar ninguém".
Embora as organizações que representa, assim como todas as ONG e os jornalistas, estejam proibidas de se aproximarem da zona onde estão os migrantes -- a Polónia declarou uma zona de emergência que abrange cerca de cinco quilómetros além da fronteira e que impede a visita de ativistas ou repórteres -, Natália Gebert não tem dúvidas: a vida destas pessoas é extremamente difícil e tende a piorar.
"Está muito frio e a zona da fronteira é um terreno muito difícil, repleto de florestas e pântanos", explicou.
"E se conseguem atravessar a fronteira, ainda têm de enfrentar a zona de emergência, que tem cerca de três a cinco quilómetros de largura e onde as ONG não podem ir", lembrou.
Por isso, neste momento, as únicas pessoas que ajudam estes migrantes são as que vivem realmente na zona.
"E estão a ajudar! Na generalidade das situações, a resposta das pessoas é incrível. Muitas pessoas locais largam as suas vidas e afazeres para irem ajudar, isso é surpreendente e vale a pena sublinhar", disse.
"O que nós [ativistas dos direitos humanos] podemos fazer é ajudar as pessoas que vivem na zona de emergência para que eles ajudem os refugiados. Podemos dar coisas, podemos dar formação básica sobre a lei de asilo, mas temos muitas dificuldades", admitiu a representante do Grupa Granica.
"As pessoas que vivem na floresta, sem condições e permanentemente aterrorizadas, têm medo de que os guardas fronteiriços tomem conhecimento de que estão do lado polaco e as expulsem", contou à Lusa via telefone, acrescentando que teve casos em que os migrantes se recusaram a chamar uma ambulância, apesar de precisarem urgentemente de cuidados médicos, "com medo de que os guardas viessem atrás".
Admitindo sentir uma grande dose de frustração, Natalia Gebert acusa os dois países em causa -- Polónia e Bielorrússia -- de tratar muito mal os migrantes e refugiados "justificando (as ações) com questões políticas".
"Aqueles que estavam na floresta, mas tinham dinheiro para pagar um transportador para irem para a Alemanha, já o fizeram. Por isso, os que lá estão são aqueles que não têm hipótese de sair dali. Estão encurralados entre as forças bielorrussas e as forças polacas. Cada lado empurra-os para o outro e quando digo empurra é no sentido de que tanto um lado como o outro usam muita brutalidade", afirmou a ativista, contando alguns casos concretos.
"Tivemos um caso de uma mulher do Congo que atravessou a fronteira e foi expulsa. A forma como os soldados polacos o fizeram foi atirá-la por cima da vedação para o lado bielorrusso. Ela estava grávida de 3 meses na altura. Ela ficou bem, mas o bebé não", lamentou a ativista.
Segundo a representante do Grupa Granica, também há muitas famílias que acabam separadas.
"Por exemplo, a mulher chegou à Polónia em muito más condições de saúde e teve de ir para o hospital e o marido e os filhos foram expulsos para o outro lado", relatou.
Apesar de tudo, reconheceu a ativista, "os guardas, tanto de um lado da fronteira como do outro, são seres humanos" e, embora "os mais antigos, que vieram do topo da hierarquia, expulsem o maior número de refugiados possível, alguns sentem-se desconfortáveis".
Por isso, Natália Gebert tem alguma esperança de que a situação se altere.
"Não é que estejamos à espera de uma revolução entre os guardas de fronteira porque, apesar de tudo, fazem parte de uma formação militar, mas a voz da contestação está, sem dúvida, a crescer", concluiu.
Esta nova crise migratória nas fronteiras externas da UE eclodiu nas últimas semanas, com Varsóvia e Bruxelas a acusarem Minsk de orquestrar o fluxo migratório, um "ataque híbrido" contra o bloco europeu, como retaliação às sanções ocidentais impostas ao regime do Presidente Alexander Lukashenko.
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