Ciclo eleitoral em Timor-Leste deve servir para "mudança de rumo"
O ex-primeiro-ministro timorense Rui Araújo defendeu que o próximo ciclo eleitoral em Timor-Leste deve servir para uma mudança de rumo, depois de 20 anos de governação da "geração de 75", com "caras novas" que impulsionem o desenvolvimento nacional.
© Lusa
Mundo Rui Araújo
"O país está num momento em que é preciso haver uma mudança de rumo. Depois de 20 anos o país vai ter que seriamente decidir sobre qual rumo o país deve tomar", disse Rui Araújo, candidato à liderança da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) em entrevista à Lusa.
"Durante os últimos 20 anos houve várias crises políticas, o processo de desenvolvimento deu o que deu, já gastámos cerca de 16 mil milhões de dólares em 20 anos. É bastante. Conseguiu-se muita coisa, mas devia ter-se feito muito mais", insistiu.
Ainda assim, considerou que as próximas eleições continuarão a ser marcadas pelo combate entre dois líderes históricos, Mari Alkatiri, secretário-geral da Fretilin, o seu partido, e Xanana Gusmão, presidente do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT).
"O resultado das próximas eleições ainda vai refletir isso. Eu uso sempre a metáfora da luta do galo em Timor: nas próximas eleições, serão duas as pessoas que apostam mais, Xanana Gusmão e Mari Alkatiri. E nesta minha metáfora eles escolhem os galos", considerou.
Antecipa-se que Timor-Leste possa ter o maior número de candidatos de sempre nas presidenciais de 19 de março, com as legislativas previstas para 2023.
No leque de candidatos estão o atual presidente, Francisco Guterres Lú-Olo, apoiado por Alkatiri, e, previsivelmente, José Ramos-Horta, apoiado por Xanana Gusmão, além do comandante demissionário das Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), Lere Anan Timur, também da Fretilin, e de Mariano Sabino, do Partido Democrático (PD).
Sem querer declarar apoio a qualquer candidato presidencial, insistindo que é necessário "ouvir mais sobre os seus planos e objetivos", Rui Araújo considera "ilusório" pensar que o facto de haver mais que um candidato do seu partido, a Fretilin, representa divisões internas.
"Isto da Fretilin estar dividida talvez seja ilusório, porque no fundo os dois candidatos são independentes. Pelo facto de haver essa mensagem do secretário-geral, não significa que os militantes irão votar nesse sentido", considerou.
"Independentemente de serem ou não membros do partido, apresentam-se ao eleitorado como independentes e o que conta não é apenas o voto do militante, é o voto do cidadão", disse, considerando que é "preciso ainda mais ouvir as candidaturas e as ideias" de ambos.
Sem declarar qual dos dois membros do partido apoia, ou se apoia outro candidato, considerou que Lú-Olo "deu o que deu ao país e foi um Presidente para o período que passou no impasse político", sendo que "para o futuro seria preciso mais abertura, mais diálogo, mais dinamismo na Presidência para apoiar o Governo nas ações de governação".
Rui Araújo faz parte da geração 'que se segue', líderes que cresceram na luta contra a ocupação indonésia, mas mais distantes dos conflitos políticos internos do movimento da independência, outrora definida como a "geração perdida" e que hoje, 20 anos depois da restauração, é a "geração à espera".
"Tem a ver com a forma como a sociedade timorense funciona. É uma sociedade hierárquica com um respeito quase religioso aos mais velhos e isto tem a ver com a tradição das casas sagradas. Mas tecnicamente e profissionalmente, a geração seguinte está preparada para assumir as responsabilidades", considerou.
"Está na altura de agarrarmos as rédeas e a nossa geração está a trabalhar nisso. há pessoas das gerações seguintes à de 1975 que estão a trabalhar, a afirmar-se politicamente na sociedade. mas estamos num país democrático e é o voto que decide", acrescentou o ex-governante.
Daí que considere que haver novos candidatos, especialmente mais jovens, seja um "bom sinal", demonstrativo de que "há mais pessoas convencidas que chegou o tempo de haver novas caras no cenário político do país".
E ainda que os líderes históricos possam optar por fazer uma sucessão, 'escolhendo' os seguintes, Araújo considera que as gerações seguintes é que se devem afirmar.
"Se os mais velhos quiserem fazer essa escolha de sucessão é uma opção deles, mas os da geração seguinte devem estar conscientes de que em Timor-Leste, apesar das características tradicionais da sociedade, os hábitos modernos da democracia devem impulsionar os mais jovens, as gerações seguintes a demonstrar que são capazes e avançar", sublinhou.
Um ano depois de ter anunciado, em entrevista à Lusa, a intenção de desafiar Alkatiri na liderança da Fretilin, Rui Araújo amplia a necessidade de mudança ao seu partido, considerando que essa consciência é hoje maior do que nunca.
"O eleitorado dentro da Fretilin está consciente de que estamos num momento de mudanças, em que o partido vai precisar de novas ideias, novo sangue e novos rostos para avançar com o partido para a frente", considerou.
"Comparativamente há um ano, as pessoas estão mais conscientes disso e esperemos que a oportunidade surja para os militantes se afirmarem também nesse sentido", disse, referindo-se às diretas no partido previstas para meados de 2022 e garantindo que o seu proposta de candidatura com José Somotxo a presidente do partido "continua firme".
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