"A CEDEAO faria bem em mostrar alguma flexibilidade na sua reação ao golpe, porque se adota uma linha dura e impõe sanções que vão prejudicar a população, vai acelerar ainda mais o afastamento dos principais atores da região, que são geralmente liberais e têm um modelo favorável aos negócios, e arrisca-se a tornar-se mais irrelevante", escrevem os analistas num comentário à cimeira extraordinária da CEDEAO, marcada para sexta-feira.
"Há alguns sinais de que a União Africana pode pressionar nessa direção", acrescentam os analistas na nota enviada aos clientes e a que a Lusa teve acesso, apontando que "o Conselho de Paz e Segurança da UA está disponível para dar às autoridades do Mali um prazo de 16 meses para finalizar a transição para um Governo liderado por civis".
A CEDEAO vai realizar esta sexta-feira uma cimeira extraordinária em formato virtual, para discutir a crise no Burkina Faso, na sequência do golpe militar que derrubou o Presidente Roch Kaboré.
A organização, de que o Burkina Faso é um Estado-membro, condenou na segunda-feira a tomada do poder por oficiais do exército, que mantêm Kaboré detido.
"O golpe coloca mais pressão sobre a CEDEAO numa altura já de si sensível; esta entidade procurou ser firme na sua reação às mudanças inconstitucionais de governo na região, mas as sanções contra o Mali viraram a opinião pública contra a CEDEAO, não apenas no Mali, mas também no Burkina Faso e no Senegal, onde contribuiu para a forte votação dos radicais anti-CEDEAO na eleição municipal de domingo", consideram ainda os analistas.
O golpe militar que destituiu o Presidente, conclui a Oxford Economics Africa, "encoraja os adversários do Ocidente, com o influente empresário russo Yevgeny Prigozhin, que se crê ser o dono da Wagner, uma empresa de mercenários que opera na República Centro-Africana e no Mali, a saudar o golpe como sendo parte de 'uma nova era descolonização' em África".
A cimeira virtual extraordinária da CEDEAO terá início às 10:00 GMT de sexta-feira (mesma hora em Lisboa), afirma-se numa declaração divulgada esta semana.
O Presidente do Burkina Faso, Roch Marc Christian Kaboré, foi derrubado por um corpo militar liderado por um tenente-coronel, Paul-Henri Sandaogo Damiba, que lidera agora o chamado Movimento Patriótico para a Salvaguarda e Restauração (MPSR).
A insurreição militar começou no domingo em vários quartéis no país, incluindo na capital, Ouagadougou, a seguir a uma manifestação que fez sair à rua milhares de pessoas que protestavam contra insegurança criada pela violência de vários grupos extremistas islâmicos e pela incapacidade das forças armadas do Burkina Faso responderem a um problema que se agrava desde 2015, precisamente o ano da chegada de Kaboré ao poder.
O golpe no Burkina Faso, que sucede aos golpes no Mali e na Guiné-Conacri, foi condenado pela comunidade internacional, que exige a "libertação imediata" do Presidente derrubado.
Josep Borrell, o chefe da política externa da União Europeia, já advertiu que "se a ordem constitucional não for restaurada", haverá "consequências imediatas na parceria [europeia] com o país".
União Africana e ONU condenaram igualmente o golpe de Estado. O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, disse que "os golpes militares são inaceitáveis".
A cimeira extraordinária da CEDEAO na sexta-feira poderá resultar na imposição de sanções ao país.
Na terça-feira de manhã, centenas de manifestantes desceram à Praça da Nação, no coração de Ouagadougou, em apoio aos golpistas.
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