Burkina Faso. Thomas Sankara, o 'Che Guevara' africano

Thomas Sankara, conhecido como o 'Che Guevara' africano e simpatizante da Revolução Cubana, é um dos políticos mais admirados da história recente de África pelo carisma e ideias, que anda inspiram a juventude africana.

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Lusa
06/04/2022 16:00 ‧ 06/04/2022 por Lusa

Mundo

Thomas Sankara

Sankara foi Presidente do Burkina Faso entre 1983 e 1987, quando foi assassinado, e cuja morte começou a ser julgada em 11 de outubro passado, mais de trinta anos depois, num tribunal militar em Ouagadougou, capital de Burkina Faso, numa tentativa de se fazer justiça.

O tribunal sentenciou hoje três dos 14 arguidos a prisão perpétua, entre os quais se inclui Blaise Compaoré, Presidente de Burkina Faso entre 1987 e 2014, e Hyacinthe Kafando, chefe da segurança de Compaoré em 1987, condenados "à revelia" por terem fugido do país.

Nascido em 21 de dezembro de 1949, em Yako, que dista 100 quilómetros de Ouagadougou, no seio de uma família cristã e primeiro rapaz de 11 irmãos, Sankara seguiu os passos do pai e iniciou uma carreira militar em Madagáscar, quando tinha 19 anos.

Em 1972 voltou ao seu país, onde lutou na guerra de fronteira entre o Burkina Faso - então designado Alto Volta - e o Mali; e em 1976 conheceu Blaise Compaoré em Marrocos, seu amigo íntimo e companheiro de armas com quem em 04 de agosto de 1983 perpetrou o golpe de Estado com o qual chegou ao poder aos 33 anos.

Influenciado pelas obras de Karl Marx e Lenine, Sankara iniciou uma revolução inspirada na luta do guerrilheiro e político argentino nacionalizado cubano Ernesto "Che" Guevara e do então Presidente de Cuba, Fidel Castro, com quem se encontrou várias vezes.

Apesar de não ter conhecido "Che", Sankara é considerado o "Che Guevara" africano por causa das semelhanças ideológicas e porque ambos foram mortos quando tinham pouco mais de 30 anos.

Encontrou-se pela primeira vez com Fidel Castro em março de 1983 na sétima cimeira dos países não alinhados, realizada em Nova Deli.

"Nesse primeiro encontro compreendi que Fidel tem uma grande humanidade, uma intuição muito aguçada e que tinha consciência da importância da nossa luta, dos problemas do meu país", declarou Sankara anos depois em entrevista a uma emissora de rádio, em Ouagadougou.

Visitou Cuba em 1984 - quando Fidel Castro lhe concedeu a medalha da Ordem de José Martí - e em 1986, tendo estabelecido desde 1983 acordos de cooperação bilateral nos domínios da saúde, agricultura, educação e transportes.

As ideias de Sankara eram anti-imperialistas, pan-africanistas, feministas e ambientalistas, mas era também um patriota comprometido com o consumo local de produtos como tecidos tradicionais feitos de algodão do país africano.

O amor pelo seu país levou-o mudar em 1984 a designação do país de Alto Volta - nome colonial que se referia ao curso superior do rio Volta - para Burkina Faso, que significa "terra (ou pátria) dos homens íntegros" em duas línguas locais.

Quando discursava, Sankara não deixava ninguém indiferente. Um dos discursos mais conhecidos deste político e militar foi o que proferiu em Adis Abeba, em julho de 1987, numa cimeira da Organização para a Unidade Africana (atual União Africana) contra a dívida externa.

"São os colonizadores que endividaram a África aos credores, seus irmãos e primos. Somos alheios a essa dívida. Portanto, não podemos pagá-la", argumentou, deixando muitos líderes africanos sem palavras e provocando risos a alguns.

Conhecido pelo seu despojamento, Sankara conduzia um pequeno Renault 5 e tais gestos, que estavam em sintonia com as pessoas comuns, tornaram-no muito popular, mas também somou detratores e inimigos.

"Ou vou acabar sendo um velho em algum lugar ou será um final violento porque temos muitos inimigos. Uma vez que você aceite isso, é apenas uma questão de tempo", previu.

Depois de admitir que a sua revolução tinha erros, Sankara também criou - como em Cuba - os Comités de Defesa da Revolução em cada bairro, no chamado "tempo de retificação", para resolver problemas, mas muitos usaram estas estruturas na defesa dos seus próprios interesses.

Em 15 de outubro de 1987, então com 37 anos -- juntamente com 12 dos seus companheiros - foi assassinado por um comando golpista liderado por Compaoré, que invadiu o seu gabinete de trabalho.

Os corpos de Sankara e dos seus companheiros foram discretamente enterrados e o médico, coronel Alidou Jean Christophe Diébré, examinou o cadáver e indicou no atestado de óbito que a causa da morte foi "natural".

Acusado de falsificação de documentos, Diébré pediu desculpa ao tribunal, explicando as suas motivações e foi finalmente absolvido.

Na sequência da morte de Sankara, Compaoré assumiu a liderança do Burkina Faso, bloqueando qualquer investigação sobre a morte até que deixasse o poder -- tendo-se refugiado na vizinha Costa do Marfim -- o que sucedeu após protestos populares em outubro de 2014 contra a sua intenção de modificar a Constituição para prolongar o seu mandato na chefia do Estado.

Após a saída de Compaoré, as urnas com os restos mortais de Sankara e os seus companheiros foram abertas para desbloquear a investigação sobre o assassínio do carismático líder africano, mas, após a exumação do corpo, os testes de ADN foram "inconclusivos".

No entanto, os peritos garantiram que o corpo recebeu vários tiros, o que é consistente com o depoimento das testemunhas do assassínio de Sankara e deu esperança de que se pudesse realizar o julgamento que hoje pôs fim a mais de três décadas de impunidade.

Leia Também: Ex-PR do Burkina Faso Blaise Compaoré condenado a prisão perpétua

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