'Elena', nome fictício, é uma das pessoas que foi obrigada a abandonar a sua casa devido à invasão das tropas russas na Ucrânia. A ucraniana, que é casada com um militar e vivia em Kherson, conseguiu escapar para Zaporizhzhia, mas não sem antes passar por uma situação traumatizante. "Não quero viver mais", contou à agência France-Press (AFP).
Enquanto esperava por um autocarro que a terá levado até ao centro da Ucrânia, onde estão os seus quatro filhos, 'Elena', contou que, depois de um ucraniano a ter 'denunciado', foi violada durante horas por dois soldados, em sua casa, a 3 de abril. A ucraniana estava sozinha na cidade porque quis reunir o maior número de coisas antes de se mudar.
"Por volta das 15h fui à merceria. Enquanto estava na fila, alguns soldados russos entraram e começaram a falar com os clientes", disse, explicando que não conseguia perceber sobre o que falavam. "Mas percebi que um dos habitantes de Kherson estava a apontar para mim e dizia: 'Ela é uma banderovka!'".
O termo está relacionado com Stepan Bandera, que foi o líder da Organização dos Nacionalistas Ucranianos, e colaborou com a Alemanha nazi na luta contra a União Soviética. 'Banderovka' é uma expressão frequentemente utilizada pelas autoridades russas quando se referem a nacionalistas ucranianos.
Para além de apontar para 'Elena' e 'denunciá-la' com recurso à expressão ultranacionalista, o homem fez questão de não deixar dúvidas às autoridades russas: "Ela é a mulher de um soldado", disse, logo depois de gritar que "é por causa deste tipo de pessoas que o conflito começou".
Apercebendo-se de que os soldados russos, que na altura estavam a controlar a cidade, estavam a observá-la, 'Elena' decidiu fugir o mais rápido possível para casa. "Só tive tempo de chegar a casa. Os dois soldados russos entraram em minha casa. Não tive sequer tempo de chegar ao telefone para pedir ajuda", contou, explicando que os militares não lhe disseram nada e a empurraram para cima da cama. "Encostaram-me uma espingarda e despiram-me", contou em lágrimas.
"Não disseram muita coisa. Às vezes chamavam-me 'banderovka' ou diziam 'é a tua vez', entre os dois", contou à AFP. Os militares russos ficaram em casa de 'Elena' até às 4h. "Foram embora porque o turno deles ia começar", referiu.
Para além de não ter vontade de viver, 'Elena' diz ainda que se sente "enojada" consigo, mas que não foi preciso ser consultada por um médico, tendo já "tratado" de si. "Vou encontrar tudo aquilo de que preciso assim que chegar ao meu destino. Só quero ver os meus filhos", explicou.
Recorde-se que depois de os militares russos deixarem Bucha o governo da Ucrânia disse que havia relatos e provas de que mulheres tinham sido violadas e torturadas pelas tropas. Para além das centenas de cadáveres de civis ucranianos, terão sido descobertos cadáveres de mulheres e jovens queimadas com indícios de violação.
Para além dos crimes de guerra, a comunidade internacional já referiu que a violência sexual está a tornar-se uma arma de guerra contra a Ucrânia.
Leia Também: "Há fortes indícios que vamos ter mais revelações de atrocidades"