O pequeno território moldavo autónomo fica junto à fronteira da Ucrânia e conta com, pelo menos, dois batalhões militares russos de uma força internacional após os acordos de paz com a província independentista, firmados em 1992.
Cosnita, com as suas duas centenas de habitantes, fica já depois do controlo fronteiriço russo que separa de facto a Transnístria do resto da Moldova.
Em conversa com a Lusa, Albina Bulat diz-se farta de um "país dividido" e pede a unificação total, um desejo que tarda em acontecer.
"Vou a Tiraspol e só se veem casas à venda, toda a gente quer fugir", explicou a moradora, referindo-se à capital do território montanhoso e autoproclamado independente pró-russo.
Victor é voluntário num centro de acolhimento de refugiados em Cosnita e não esconde o ódio aos russos e a quem os apoia, como as autoridades de Tiraspol.
"Moscovo é que nos dividiu há 30 anos", disse, numa referência à guerra civil na então nascente Moldova, que separou aquele território, com uma maioria russófona, do resto do país, mais próximo da Roménia.
Desde então, tropas russas asseguram o controlo das fronteiras, num acordo internacional que junta ainda a Ucrânia e a Roménia. O número de militares não é público e é estimado por analistas em cerca de 400 elementos.
Os moradores da Transnístria "dizem-se russos e não querem ser moldavos, mas todos eles agora também querem ter passaporte romeno e, por isso, europeu", acrescentou à Lusa, num tom indignado, Victor, numa menção à legislação de Bucareste que permite o acesso à nacionalidade caso tenham antepassados da Grande Roménia (que abrangia a maior parte da Moldova).
Mas Victor recusa que Chisinau ceda e permita a independência da Transnístria: "Só vamos entrar na União Europeia (UE) como um único país", outra coisa "seria dar a vitória a [Presidente russo, Vladimir] Putin e criar um precedente".
"Se fizermos isso, o que é que vai acontecer à Gagaúzia?" - questionou, numa referência a outra pequena província moldava que quer ser independente.
Nas últimas semanas, as autoridades de Tiraspol queixaram-se de ataques no seu território. A Ucrânia já confirmou, no início de março, a demolição da ponte ferroviária que atravessava a província independentista, a única ligação deste tipo da Moldova ao leste.
"Foi um objetivo militar porque há um risco real que vem de lá", disse à Lusa o porta-voz da região militar de Odessa, o coronel Serhii Bratchuk. Tratou-se, segundo explicou, de "uma tática militar para prevenir uma situação mais difícil".
"Nunca deixámos de estar em guerra com a Rússia desde 2014 e sabemos que eles querem o Mar Negro" e a "Transnístria é um território não reconhecido, que não tem direito a existir, e é parte da Moldova, um estado vizinho independente", acrescentou o militar.
Na Transnístria, o tempo corre lentamente. "É quase um estado soviético", reconheceu Victor, salientando que a crise económica é "permanente" e "apenas o dinheiro de Moscovo sustenta a máquina do Sheriff", nome de um clube de futebol e o maior conglomerado empresarial do território, que pertence a um oligarca moldavo, com ligações próximas a Putin.
No dia em que os russos invadiram a Ucrânia, em 24 de fevereiro, o Sheriff foi eliminado da Liga Europa pelo Sporting de Braga por grandes penalidades. O Sheriff é o crónico campeão moldavo e fez um brilharete na Liga dos Campeões, com a vitória, esta época, na casa do Real Madrid, mas situa-se num território que não reconhece a autoridade de Chisinau.
Propriedade de Viktor Gu?an, antigo oficial do KGB (os serviços secretos da antiga União Soviética), o clube é o símbolo externo maior da Transnístria, embora o hino nacional que se oiça seja o moldavo.
Sheriff é também quase a única marca quotidiana de quem vive na Transnístria.
"Postos de combustível, bancos, supermercados, clube de futebol. É tudo Sheriff", apontou Natalia Foltea, 65 anos, moradora numa aldeia vizinha de Cosnita, junto ao rio Dniestre, que dá nome à Transnístria.
Em 1992, o território montanhoso serviu de ponto de resistência dos locais face aos militares moldavos, um país então recentemente fundado. Mas hoje, as autoridades de Chisinau recusam retomar a província pela força.
Alexandru Flenchea, antigo vice-primeiro-ministro para a reintegração, explicou à Lusa que a Moldova quer primeiro rever as condições de paz e integrar outros países na mediação.
"Como as coisas estão não faz sentido. Os russos não podem ser parte da divisão e, ao mesmo tempo, apoiar a reunificação" do país, disse.
O Governo liderado pela primeira-ministra Natalia Gavrili?a tem como principal objetivo a integração europeia, tendo já assinado um acordo de associação com a UE que vai injetar no país quase 700 milhões de euros em três anos.
Mas o processo de adesão à UE só será possível se Chisinau controlar as fronteiras a leste, junto à Ucrânia.
Até ao momento, apesar da guerra na Ucrânia e do progressivo isolamento internacional de Moscovo, o Governo da Moldova tem insistido que só irá recuperar a gestão da Transnístria através da negociação, rejeitando qualquer solução armada.
"No fundo temos medo dos russos. Há uma memória que todos temos, das perseguições, da violência, da morte", desabafou à Lusa Natalia Foltea, em plena rua de Cosnita, pouco depois de ter comprado uns bifes de frango num talho local.
A sexagenária recorda bem a violência do regime comunista soviético.
"O meu pai esteve um ano na Sibéria apenas por esconder um saco de milho, que era apenas para garantir as sementes do ano seguinte. E por causa disso, foi levado um ano pelos russos. Parece ridículo, não é?", contou ainda Natalia, ao concluir a breve conversa e seguir caminho até à sua aldeia.
Leia Também: "Desinformação ainda divide moldavos, mas Europa parece ganhar a guerra"