"Embora existam casos muito evidentes de instabilidade territorial e de incumprimento de promessas internacionais, a situação em que nos encontramos atualmente pode ser descrita como um contexto de erosão dos princípios basilares do relacionamento internacional. Não é um contexto de desabamento desses pilares do sistema, mas antes de fragilização", afirmou o ministro.
Gomes Cravinho deixou esta mensagem no encerramento da 5.ª Conferência de Lisboa e centrando o seu discurso no titulo do evento: "Rumo a uma Nova Ordem Mundial?".
A invasão da Ucrânia pela Rússia representa "um atentado à ordem internacional vigente, codificada na Carta das Nações Unidas, mas representa também a convicção de que essa ordem não tem força suficiente para penalizar o infrator", afirmou o chefe da diplomacia portuguesa.
A progressiva fragilização da ordem internacional "representa um profundo perigo para a humanidade, seja por causa da existência de armas de destruição maciça, seja por causa da dificuldade acrescida em gerar consensos em torno do combate às alterações climáticas, que já não são uma ameaça longínqua para as próximas gerações, mas um desafio imediato para os dias que vivemos", alertou contudo o ministro.
Reconhecendo que estamos longe de "conhecer o percurso da guerra nos próximos meses", o ministro diz que este meio ano de conflito mostra que "houve um grande erro de cálculo russo quanto a sua perceção de uma reação frouxa em defesa da ordem internacional", já que "a reação foi poderosa, e a Rússia sairá sem dúvida muito penalizada" por violar os princípios basilares da Carta das Nações Unidas.
O ministro defendeu por isso que, existindo "fortes razões de preocupação quanto à estabilidade e a própria sobrevivência de uma ordem internacional que ainda orienta boa parte do nosso relacionamento global", seria contudo "um erro profundo deixar de investir nesta ordem internacional antes de haver qualquer tipo de ordem alternativa consolidada".
Atendendo ainda ao título da conferência, "Rumo a uma Nova Ordem Mundial", o ministro disse que comporta "a noção de atravessarmos uma transição epocal" e que "a turbulência que vivemos é de natureza estrutural e não conjuntural, na medida em que uma mudança de época nunca acontece de forma suave e programada, como se fosse uma transição pactuada".
"Aconteceu de facto há três décadas, em que o final da Guerra Fria e o desmantelamento do império soviético aconteceu de forma rápida e bastante tranquila, mas de algum modo assistimos hoje a aspetos dessa transição que acabaram por não ser resolvidas à época", considerou ainda João Gomes Cravinho.
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