Combater má nutrição em Timor-Leste exige soluções estruturais, diz ONU

Combater a má nutrição em Timor-Leste exige "vontade política clara" e um trabalho claro e integrado do Governo, sociedade civil e parceiros internacionais, apostando em soluções estruturais e que evitem programas avulso, disse hoje uma responsável das Nações Unidas.

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Lusa
01/12/2022 07:34 ‧ 01/12/2022 por Lusa

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"Há que trabalhar em conjunto. A má nutrição não é apenas a responsabilidade da ministra da Saúde. Envolve educação, agricultura, pescas, proteção social, desenvolvimento económico e social e água", disse à Lusa Greda Verburg, secretária-geral adjunta das Nações Unidas e coordenadora do Movimento Global para a Melhoria da Nutrição (SUN Movement, em inglês), de que Timor-Leste faz parte desde 2020.

Lidar com o problema, referiu, envolve ações preventivas, trabalhar com as mães -- "só uma mãe saudável e bem nutrida pode dar à luz um bebé saudável" -- promover a amamentação e desenvolver políticas integradas de sensibilização e educação, de fortalecimento da merenda escolar, de diversificação da produção agrícola.

 "Deve-se trabalhar na alimentação pré-escolar e escolar e dar atenção às mulheres. E é essencial a colaboração dentro do Governo, que devem ser muito mais ativos em coordenação do que até agora. Há um ponto focal no gabinete do primeiro-ministro e isso é muito positivo, é essencial um planeamento conjunto, mas também implementar, avançar na concretização", notou.

Referindo que o problema da nutrição envolve vários aspetos do desenvolvimento, e que a pobreza em Timor-Leste acentua a sua dimensão e gravidade, Greda Verburg sublinhou que as autoridades timorenses estão "comprometidas" a lidar com a questão, mas que há que fazer mais.

"Se 50% das pessoas em Timor-Leste são afetadas por nanismo e raquitismo, como podem ter a capacidade de gerir um programa destes? É preciso mais formação, reforço das capacidades e garantir que depois de um ou dois anos as pessoas podem gerir o seu próprio programa de merenda escolar, que os agricultores conseguem diversificar, reduzir a perda de produção, que chega a ser de 30 ou 35% de cada cultivo", afirmou.

"Não se pode fazer programas avulso. Se fosse essa a solução já se tinha resolvido o problema. Já se gastou muito dinheiro em vários programas ao longo dos anos. mas ações avulsas, durante curtos períodos, não permitem resolver isto. Isto requer o apoio de todos, tem que ser institucionalizado, integrado em todas as políticas, legislação, em orçamento em monitorização, em tudo. Tem que fazer parte integrante do sistema", sublinhou.

Em termos gerais, insistiu, "terminar a fome e a malnutrição é uma questão de vontade política".

Verburg visitou hoje a delegação da Lusa em Díli onde está numa visita de vários dias para avaliar os passos dados por Timor-Leste desde que se juntou ao SUN Movement e os esforços das autoridades para combater a má nutrição no país.

"A questão da nutrição é complicada. A boa nutrição é invisível. Não se consegue ver de fora como as pessoas estão. E é sobre saúde, o que está a acontecer com o corpo, mas particularmente com o cérebro", recordou.

"Os primeiros mil dias das crianças são de crucial importância para o desenvolvimento do cérebro e para a 'hardware' cognitiva. As pessoas muitas vezes confundem nutrição com segurança alimentar: pensam que se o bebé não está a chorar, se parece bem por fora, o resto está bem. Até há quem pense que se as crianças tiverem sobrepeso é um sinal de riqueza", afirmou.

A responsável das Nações Unidas admitiu que este não é um problema que se consiga resolver de um dia para o outro, e defendeu marketing mais agressivo para promover a nutrição, especialmente num espaço onde já competem pela atenção dos consumidores os vendedores de 'fast-food' e comida processada.

"E envolver também os líderes religiosos e culturais, o que pode ter um grande impacto no país", frisou.

O reforço das capacidades, a educação das novas gerações, prémios e apoios que reconheçam avanços na nutrição a nível local ou municipal são outras medidas que podem ajudar a aumentar a sensibilização da sociedade para o problema.

"O falhanço aqui é que temos demasiadas ações individuais, uma ação do Ministério da Agricultura, ou uma ação da Saúde. E também ao nível da ONU,  que tem que operar com uma única voz. A Unicef não pode fazer tudo, o apoio da FAO é necessário para diversificar produção. E assim é possível", vincou.

Os dados demonstram a dimensão do que ainda há para fazer em Timor-Leste onde, apesar das melhorias, a prevalência de desnutrição em mulheres e crianças continua a ser uma das mais elevadas do mundo, com nanismo a afetar 47% das crianças e quase um quarto das mulheres com idade reprodutiva a ter peso a menos.

A insegurança alimentar continua a ser um problema significativo, com metade da população considerada em "insegurança alimentar" e 16% a enfrentar insegurança alimentar severa.

O Movimento SUN nasceu de "um reconhecimento global crescente dos problemas de subnutrição e com as preocupações pelo facto de o sistema internacional não estar a conseguir lidar com o problema de forma eficaz".

A ideia surgiu na sequência da criação em 2008 de um grupo de trabalho de alto nível das Nações Unidas sobre segurança alimentar e nutricional, a que se seguiu o Consenso de Copenhaga, que reiterou a importância da nutrição para o desenvolvimento.

O assunto marcou a agenda de uma cimeira mundial em 2009, gerando um primeiro movimento que teve o apoio de 80 instituições internacionais. O processo foi formalizado em movimento global em 2012.

Leia Também: Economia timorense a recuperar, mas país enfrenta vários riscos futuros

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