"No futuro, haverá, sem dúvida, uma nova pandemia ou recrudescimento [das infeções por covid-19]", considerou António Vitorino, durante a sua intervenção no Seminário Diplomático 2023, que decorre entre hoje e quinta-feira em Lisboa.
"Não vai ser possível gerir a nova pandemia como gerimos esta. Basta ver o que acontece na China neste momento: um país muito disciplinado e disciplinador, mas que teve de ceder à pressão da opinião pública", levantando as restrições e os confinamentos da população, referiu.
"Na próxima pandemia vai ter de haver um controlo para permitir a mobilidade humana mesmo em confinamento. Isto exige investimento em equipamento, em infraestruturas e na formação dos guardas de fronteiras e dos responsáveis na gestão das fronteiras", avisou o diretor-geral da OIM, agência que integra o sistema das Nações Unidas.
Segundo António Vitorino, a pandemia teve impactos muito assimétricos, mas, ao contrário do que chegou a ser vaticinado, não acabou com as migrações.
"As chegadas ao Mediterrâneo Oriental e à Grécia diminuíram, mas na Itália triplicam todos os anos (chegando às 105 mil no ano passado)", descreveu, acrescentando que "os números mantiveram-se estáveis em Espanha, exceto na rota do Atlântico, para as Canárias, onde têm vindo a aumentar".
A pandemia de covid-19 "também não teve muitos reflexos no continente americano", embora o número de migrantes da Venezuela esteja "prestes a atingir os seis milhões" e os que saem daquele país tenham passado a "ser responsáveis por um aumento da tensão na fronteira dos Estados Unidos com o México", disse.
O que foi "uma constante em todas as regiões do mundo foi o aumento do número de migrantes que recorreram a redes de tráfico", alertou o diretor-geral da OIM.
Além disso, avançou, o comportamento das remessas de emigrantes também foi uma surpresa, já que nalguns países diminuíram e noutros aumentaram.
"Verificou-se que uma parte dessas remessas era transferida por via pessoal", quando familiares ou amigos se deslocavam ao país de origem e levavam dinheiro, relatou ainda o representante.
"Com o fecho dessa via [causado pelos confinamentos e proibições de deslocações], as remessas entraram mais nos circuitos legais", descreveu, sublinhando que "a quebra global [dos valores das remessas] foi de apenas 2% e o valor retomou logo no segundo ano da pandemia, em 2021".
Lembrando que a última vez que participou no Seminário Diplomático -- a reunião anual de embaixadores de Portugal no estrangeiro para debater as prioridades da política externa -- foi há quatro anos, António Vitorino admitiu que "o mundo parece ser outro" e que as preocupações mudaram desde 2019, numa referência a um cenário mundial que se viu confrontado com uma crise sanitária, alterações climáticas e uma guerra em plena Europa.
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