Numa declaração política lida hoje na primeira sessão parlamentar de janeiro, o presidente do Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV), Rui Semedo, apontou falhas à democracia do país, dizendo que a liberdade de imprensa está ameaçada e pediu o cumprimento das leis.
Em reação durante à tarde, na cidade da Praia, o primeiro-ministro disse que "quando o PAICV está no Governo considera-se o maior protetor da liberdade de imprensa, mas quando está na oposição ataca a liberdade de imprensa".
"Quem faz a imprensa não é o Governo, são os órgãos de comunicação social, os jornalistas. E essas acusações todas caem em cima dos profissionais da comunicação social", afirmou Correia e Silva.
Na declaração, o presidente do PAICV considerou que a liberdade de imprensa está ameaçada em Cabo Verde, e deu como exemplo o recente caso em que a televisão pública não transmitiu, no dia apropriado, 31 de dezembro, a mensagem de Ano Novo do Presidente da República.
Na sequência, a Presidência da República apresentou duas queixas à Autoridade Reguladora para a Comunicação Social contra a direção da Televisão de Cabo Verde (TCV) por "tratamento desrespeitoso" ao chefe de Estado.
Em causa esteve também a não cobertura de um evento que contou com a participação do chefe de Estado e a reação considerada "pouco digna e desrespeitosa" do diretor da TCV, António Teixeira, para com o chefe de Estado, antigo primeiro-ministro (2001 a 2016) e eleito em outubro de 2021, como apoio do PAICV.
Para o presidente do PAICV, a não transmissão da mensagem do fim do ano do Presidente, no dia apropriado, uma prática com 47 anos no país independente e a declaração do diretor da TCV "é um incidente grave que em qualquer país democrático teria consequências imediatas".
"Esta também é a consequência de falta de decisão e de uma inércia grave em manter no cargo um diretor ilegítimo, demissionário e num cargo desenhado para ser acedido via concurso", criticou Rui Semedo.
O primeiro-ministro lembrou que o Governo cria as condições, particularmente nos órgãos públicos, e cria as leis, para que a imprensa continua a ser cada vez mais livre e seja praticada e exercida por profissionais mais motivados, com maior estímulo no exercício da sua atividade.
O presidente do PAICV referiu também a uma "tentativa clara do Governo em instrumentalizar os órgãos públicos, manipular os jornalistas, discriminar ou condicionar a imprensa privada e transformar os órgãos em instrumentos de propaganda e de tratamento da imagem do próprio Governo".
Na declaração política, Rui Semedo notou ainda falhas da democracia do país, dizendo que é o entendimento de que quem ganha as eleições passa a ser "o senhor e dono do poder e quem perde passa a ser uma espécie de um ser menor do poder".
"Este entendimento leva, à partida, a instalação de uma relação baseada na desconfiança, na ausência de diálogo, na falta de respeito pelos adversários que deveriam ser tratados como parceiros na construção de um país mais livre, mais justo, mais solidário, mais inclusivo e com oportunidades para todas as pessoas", afirmou o também deputado nacional.
O "desequilíbrio" no tratamento das instituições, com uma "nítida sobrevalorização" do poder executivo e a "tentativa de marginalização" dos diversos órgãos de soberania foi outra falha apontada pelo maior partido da oposição cabo-verdiana, dando como exemplo o parlamento, que disse não ser informado de todos os atos da governação, mas também do próprio Presidente da República "que é tratado de acordo com as conveniências".
Um outro facto apontando pelo PAICV foi a recente medida anunciada pelo Governo de incentivo às rádios comunitárias, que considera que é boa e deve ser continuada, mas alertou que não foi feita da melhor forma.
"Senão vejamos, de acordo com a legislação em vigor no país quem passou a ter o poder de atribuição de incentivos é a Autoridades Reguladora para a Comunicação Social (ARC)", esclareceu o deputado.
E para que tal acontecesse, denunciou que o Governo, suportado pelo Movimento para a Democracia (MpD), mudou a lei passando essa competência ao executivo, alterou o orçamento da ARC e não consultou esta entidade independente eleita pelo parlamento sobre essa alteração.
Para o maior partido da oposição cabo-verdiana, outra falha na democracia do país é a nova forma do Governo se relacionar com os municípios, notando que se verificam "tensões, crispação, tentativa de condicionar a ação das câmaras municipais, pela via do financiamento, e até sinais de discriminação para limitar a margem de ação dos autarcas recentemente eleitos".
"No modelo de democracia que se pretende consolidar nestas ilhas temos que ter um Estado de Direito forte onde impera o primado do cumprimento da lei, onde se respeitam todas as instituições e onde se respeita a vontade do povo", pediu.
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