ONU. Rússia visada em reunião que pediu sobre "russofobia"
A Rússia convocou hoje uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) para abordar a "russofobia", mas acabou acusada de responsabilidade pelos "danos irreparáveis à cultura e aos cidadãos russos" devido à invasão da Ucrânia.
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Mundo Guerra na Ucrânia
"Quando discutimos russofobia é porque estamos preocupados com os danos aos russos. Essa é uma premissa que certamente compartilho. Então, pensemos nas ações adotadas no ano passado que mais prejudicaram os russos e a cultura russa. A invasão russa da Ucrânia fez com que cerca de 750.000 russos deixassem a Rússia, incluindo algumas das pessoas mais criativas e produtivas. Este é um dano irreparável à cultura russa", argumentou o historiador norte-americano Timothy Snyder, um dos convidados desta reunião.
"Prejudicar os russos e a cultura russa é principalmente uma questão de política russa. E se estamos preocupados com os danos aos russos e à cultura russa, devemo-nos preocupar com as políticas do Estado russo", acrescentou Snyder, um professor da Universidade de Yale, frisando que o termo "russofobia" está a ser utilizado como uma forma de "propaganda imperial" para "justificar os crimes de guerra russos na Ucrânia".
Um dos temas invocados pela Rússia para esta reunião foram as tentativas de acabar com o idioma russo e com a liberdade de expressão em russo, algo que foi rapidamente rebatido por Snyder, especialista em história da Europa central e de leste.
"Na Ucrânia, pode dizer-se o que se quiser em russo ou ucraniano. Na Rússia, não se pode. Se alguém estiver na Rússia com uma placa a dizer 'não à guerra', será detido. (...) Além disso, a guerra de agressão russa na Ucrânia matou, de longe, mais falantes de russo do que qualquer outra ação. Não há comparação. É política russa enviar jovens russos para morrer numa guerra de agressão", argumentou o historiador.
Porém, para o historiador norte-americano, a pior política russa em relação aos seus próprios cidadãos é a de tentar "normalizar o genocídio".
"Vemos o Presidente da Rússia a repetir que a Ucrânia não existe. Vemos isso em fantasias genocidas na imprensa estatal russa. Vemos isso num momento em que a televisão estatal atinge dezenas de milhões de russos todos os dias e apresenta os ucranianos como porcos, como parasitas, como vermes, como satanistas", disse.
"O termo 'russofobia' é uma reivindicação do poder imperial de que é vítima, mesmo quando está a realizar uma guerra de atrocidades. Este é um comportamento historicamente típico. O poder imperial desumaniza a vítima real e faz-se de vítima quando a vítima se opõe a ser agredida, assassinada, colonizada. (...) Ao convocar esta sessão, o Estado russo encontrou uma nova maneira de confessar crimes de guerra", concluiu o historiador.
As declarações de Timothy Snyder numa reunião convocada pela própria Rússia não agradaram ao embaixador russo junto da ONU, Vasily Nebenzya, que acusou o historiador de "mentir deliberadamente" e negou que a imprensa russa veicule esse tipo de informação contra os ucranianos.
Nebenzya direcionou então o seu discurso contra os alegados princípios do nacionalismo ucraniano, os quais comparou à "doutrina nazi alemã", que disse acreditar na supremacia da nação ucraniana sobre as outras.
"A Ucrânia tornou-se definitivamente anti-russa. A russofobia foi elevada ao estatuto de política estadual", argumentou Nebenzya.
Para negar as acusações de russofobia na Ucrânia e no mundo, o coordenador político do Reino Unidos junto da ONU, Fergus Eckersley, optou por fazer parte do seu discurso em russo.
"Colegas, a russofobia é uma das crescentes desculpas que a Rússia criou para justificar a sua guerra na Ucrânia. Em nome do Reino Unido, deixem-me dizer isto em russo: 'Não sofremos de russofobia. Temos uma longa história entre os nossos dois países. Lutamos juntos em duas guerras mundiais. Em todo o nosso país, as pessoas respeitam e admiram a rica herança cultural da Rússia", disse Eckersley.
"Não queremos que a Rússia fracasse como Estado, como a delegação russa às vezes afirma. Muito pelo contrário. Na verdade, queremos que a Rússia seja uma nação estável e próspera -- apenas uma nação que não invada e tente anexar os seus vizinhos", acrescentou o diplomata britânico.
Já o diplomata norte-americano John Kelley afirmou que esta reunião não foi a primeira, nem será a última, convocada pela Rússia "para abusar do seu lugar no Conselho de Segurança e espalhar desinformação", "incluindo algumas teorias da conspiração verdadeiramente ridículas".
Por outro lado, vários países pediram que as reuniões do Conselho de Segurança sejam usadas para discutir formas de chegar à paz na Ucrânia, com o Brasil a indicar que "está pronto para mediar negociações de uma paz duradoura".
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