Foi, oficialmente, chumbada a proposta de governo do Partido Popular (PP), dirigido por Alberto Núñez Feijóo, em Espanha.
Após uma manhã de debate no Congresso dos Deputados, e tal como já era previsível, o PP não conseguiu arrecadar os 176 votos suficientes para avançar com a sua proposta de Governo.
A favor da investidura de direita votaram 172 deputados (PP, VOX, Coalición Canária e UPN), votando contra os restantes 178 deputados (de esquerda, nacionalistas e independentistas da Galiza, Catalunha e País Basco). Não houve qualquer abstenção.
Assim, volta a ficar em aberto a situação política em Espanha, após as eleições legislativas de julho deste ano, em que o PP venceu, mas sem alcançar a maioria absoluta.
A Constituição espanhola estabelece que terá de haver por isso uma repetição da votação 48 horas depois, ou seja, na sexta-feira, precedida de novas intervenções de Feijóo e dos partidos, embora, desta vez, com limites de tempo.
Nesta segunda votação basta uma maioria relativa (mais votos a favor do que contra) para um candidato ser eleito primeiro-ministro, mas também este cenário é, pelo menos para já, quase impossível, como assume há semanas Alberto Núñez Feijóo.
O PP foi o partido mais votado nas eleições de 23 de julho e o Rei de Espanha, Felipe VI, indicou Feijóo como candidato a primeiro-ministro, com a investidura a ter de ser votada e aprovada pelo Congressos dos Deputados.
Se na sexta-feira se confirmar o fracasso da investidura de Feijóo, o Rei deverá indicar a seguir um novo candidato a primeiro-ministro, com o socialista Pedro Sánchez a afirmar repetidamente que está disponível e que tem condições para reunir os apoios necessários para ser reconduzido no cargo pelo parlamento.
O debate que precedeu, na terça-feira e hoje, a votação da candidatura de Feijóo já esteve centrado, precisamente, nas negociações de Sánchez com partidos independentistas, em especial, os da Catalunha, que pedem uma amnistia para os envolvidos na tentativa de autodeterminação da região de 2017 em troca da viabilização de um novo governo de esquerda em Espanha.
"Aquilo que o independentismo pede é uma aberração jurídica e moral. Mas sobretudo porque é um ataque direto a valores democráticos essenciais", disse Feijóo, logo no arranque deste debate, na terça-feira.
Hoje, no encerramento da discussão e poucos minutos antes da votação, o líder do PP reconheceu que provavelmente não sairia do parlamento como líder do Governo, mas defendeu que sairia com os seus "princípios, palavra e integridade pessoal intactos", ao contrário de Sánchez, que até às eleições de julho rejeitou a possibilidade da amnistia.
Sánchez e o Partido Socialista espanhol (PSOE) têm evitado falar da amnistia, cuja possibilidade não confirmam nem desmentem, e o líder dos socialistas não participou no debate e manteve-se em silêncio durante toda a sessão parlamentar de investidura de Feijóo.
"Valeu a pena esta sessão de investidura. Retratámo-nos todos, com as nossas palavras e com os nossos silêncios", disse Feijóo, que antes tinha dito diretamente a Sánchez que "preferiu fugir para não dizer a verdade" sobre os acordos com os separatistas e a amnistia que antes negava.
O PP considera a amnistia inconstitucional e um ataque ao Estado de Direito, frisando que as cedências aos independentistas, que tiveram menos de 6% dos votos nas eleições, são inaceitáveis e dão a chave da governabilidade a quem não quer fazer parte do país.
Perante tais críticas, a esquerda respondeu que a direita repete sempre que "Espanha se desintegra" quando há governos socialistas, mas que, na verdade, esse risco só existiu quando o PP esteve no poder, como acontecia em 2017.
Os partidos de esquerda lembraram ainda que o ex-primeiro-ministro do PP José María Aznar também negociou e fez acordos com nacionalistas da Catalunha para conseguir chegar ao Governo e que até indultou 15 terroristas do grupo catalão Terra Lliure (já extinto).
Já o ex-líder do Governo Mariano Rajoy, também do PP, propôs mesmo amnistias "para baixar a tensão na Catalunha", lembrou o deputado Enrique Santiago, da plataforma de esquerda e extrema-esquerda Somar, com quem o PSOE pretende reeditar a coligação governamental de esquerda da última legislatura.
Os partidos de esquerda e as forças nacionalistas e independentistas que hoje votaram contra a investidura de Feijóo acusaram o PP de não ter uma proposta política para as "questões territoriais" para além das respostas judiciais e o endurecimento da repressão policial e do Código Penal.
Os mesmos partidos sublinharam, por outro lado, que o PP só tem hoje um único aliado, o VOX, um partido de extrema-direita que, sublinharam, é antieuropeu, antidemocrata, negacionista das alterações climáticas e saudoso da ditadura franquista, além de querer acabar com as autonomias espanholas.
"O PP não pode querer fazer-nos acreditar que o VOX não está na equação", disse o deputado Aitor Esteban, do Partido Nacionalista Basco (PNV).
O PNV é uma formação de centro-direita que no passado fez acordos com o Partido Popular, mas que considera que as atuais alianças com a extrema-direita são uma 'linha vermelha' que impede qualquer diálogo com o PP.
[Notícia atualizada às 13h51]
Leia Também: Somar quer amnistia para catalães e lembra indultos do PP a terroristas