O Haiti está mergulhado numa enorme onda de violência, com gangues e organizações violentas a dominarem as ruas de Port-au-Prince, e parece que a única forma de ter sucesso no país é aderir à violência. Terá sido esse o caso de Iskar Andrice, que, antes de ser morto nos últimos dias, passou de professor de matemática e física a um dos mais poderosos líderes criminosos do Haiti.
Iskar Andrice, também identificado pelas autoridades como Iscar Andris, foi morto na favela de Cité Soleil, uma zona extremamente pobre e violenta na capital haitiana de Port-au-Prince. A morte foi confirmada pelo antigo autarca da cidade a uma rádio local, na segunda-feira.
"É pena que este homem se tenha envolvido em atividades de gangues, porque ele era um homem muito inteligente", afirmou, numa entrevista citada pela Associated Press.
O gangue liderado por Andrice foi identificado num relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), que denunciou que o grupo estava envolvido em homicídios, assaltos, sequestros, violações e roubos de bens e de veículos humanitários. Andrice ter-se-á juntado a outro proeminente líder criminoso, Jimmy Chérizier, formando uma aliança que se tornou no maior e mais poderoso gangue do Haiti.
Em 2015, Andrice e outros líderes fundaram uma associação, de modo a promover uma imagem mais positiva dos gangues junto das comunidades que controlavam e colocando a responsabilidade pela pobreza e violência no Haiti unicamente do lado da comunidade internacional.
Num relatório recente da organização não-governamental National Human Rights Defense Network, o antigo docente convertido em reputado criminoso foi acusado de liderar uma série de rusgas em bairros no Haiti que levaram à morte de vários civis.
A violência no Haiti cresceu exponencialmente na última década, com o enorme terramoto de 2010 e o furacão Matthews em 2016, que mataram centenas de milhares de pessoas e deixaram de rastos uma grande parte das infraestruturas públicas do país, a catapultarem a crise humanitária. Em 2021, quando a atividade criminosa já era demasiado grande para as autoridades lidarem com o problema, o presidente Jovenel Möise foi assassinado em sua casa por atiradores por identificar.
Desde então, a crise só se agudizou, e mais de 40 mil pessoas fugiram recentemente do país devido às graves dificuldades de acesso a emprego, saúde, alimentação, habitação e direitos humanos básicos.
O último relatório da ONU sobre o Haiti aponta que "a violência sexual continua a ser usada como arma nas mãos dos gangues para aterrorizar e magoar a população, especialmente mulheres e crianças", e "'brigadas de violência' e linchamentos públicos contra membros de gangues e criminosos comuns multiplicaram-se pela capital". A nível de saúde, têm-se registado vários surtos de cólera devido à falta de condições de higiene, especialmente pelas mais de 155 mil pessoas deslocadas na área metropolitana de Port-au-Prince.
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