"Não aplicaremos imediatamente medidas punitivas a partir de 01 de fevereiro", declarou o vice-primeiro-ministro Besnik Bislimi. "Mas teremos o tempo necessário para informar os cidadãos sérvios", prosseguiu em declarações aos 'media'.
O Governo "compromete-se a períodos de transição para que os cidadãos possam adaptar-se o mais depressa possível e com os menores inconvenientes possíveis", acrescentou.
Mas o euro "mantém-se a única moeda oficial", insistiu.
Diversos governos ocidentais tinham criticado a decisão de Pristina e alertado contra um novo aumento das tensões interétnicas.
"Estamos preocupados pelo impacto da regulamentação em particular nas escolas e hospitais, onde de momento nenhum processo alternativo parece viável", escreveram os embaixadores da França, Alemanha, Reino Unido, Itália e Estados Unidos num comunicado comum divulgado sábado.
"A regulamentação terá igualmente um impacto direto sobre a vida quotidiana da larga maioria dos sérvios do Kosovo que recebem pagamentos e uma ajuda financeira proveniente da Sérvia", acrescentaram, apelando a uma suspensão e a um "período suficientemente longo de transição" com uma comunicação "eficaz".
Na manhã de hoje, a Presidente do Kosovo, Vjosa Osmani, acedeu aos argumentos do relatório, sublinhando que, "para garantir a sua completa aplicação", há igualmente necessidade do apoio dos "aliados" do país, "para assegurar a estabilidade".
A nova regulamentação prevê que "o euro é a única moeda aceite para os pagamentos em espécie ou transações no Kosovo".
No final da guerra em 1999, o Kosovo, então uma província sérvia, optou pelo marco alemão como moeda, e quando o dinar estava teoricamente em vias de abolição.
Em 2002, quando o euro se tornou moeda oficial na Alemanha e em diversos países da União Europeia (UE), o Kosovo tornou-o na sua "moeda nacional", mas sem qualquer acordo formal com a união económica e monetária europeia, que permanece sem ser concretizado.
O dinar sérvio, moeda oficial da Sérvia, é tolerado nas zonas maioritariamente sérvias do Kosovo, onde predomina a religião cristã ortodoxa. A sua proibição arrisca-se a reavivar as tensões nas localidades onde muitos trabalham ou trabalharam para instituições sérvias com salários ou reformas pagos em dinares.
Na perspetiva do jornalista e comentador político sérvio Bosco Jaksic, citado pela agência noticiosa AFP, serão os sérvios do Kosovo "quem mais vão sofrer".
"Na minha perspetiva, constitui um desejo de Albin Kurti [primeiro-ministro kosovar] de sabotar o processo de negociação, que parecia bem encaminhado. As consequências diplomáticas e políticas [de semelhante decisão]" serão muito mais graves que as consequências monetárias", indicou.
Belgrado nunca reconheceu a independência do Kosovo, autoproclamada em 2008, e mantém o apoio à comunidade sérvia local (cerca de 120.000 dos 1,7 milhões de habitante, na larga maioria albaneses muçulmanos), através de empregos ou ajudas financeiras. O orçamento da Sérvia prevê anualmente uma verba de 120 milhões de euros para o Kosovo.
A liderança nacionalista de Pristina justificou esta nova regulamentação como uma forma de combater a corrupção, o branqueamento de dinheiro e o dinheiro falso.
O Governo sérvio considera a medida uma provocação que poderá comprometer "em definitivo" as negociações destinadas à normalização das relações entre Belgrado e Pristina.
O ano de 2023 tinha já sido assinalado por momentos de forte tensão entre a Sérvia e o Kosovo. Na primavera, a eleição de responsáveis municipais albaneses nas zonas de maioria sérvia, com apenas 3% de taxa de participação no escrutínio devido ao boicote sérvio, implicou manifestações onde ficaram feridos sem gravidade diversos soldados da força da NATO no terreno (Kfor).
Em setembro, a morte de um polícia kosovar e a descoberta de um comando fortemente armado integrado por sérvios também suscitou receios de uma escalada num conflito ainda sem solução.
O Kosovo, uma província autónoma do sul da Sérvia, autoproclamou a independência em 2008, nunca reconhecida por Belgrado.
As tensões entre a Sérvia e o Kosovo permanecem muito elevadas 14 anos depois do final da guerra, após uma intervenção militar da NATO contra Belgrado em 1999, suscitando receios sobre o reacender do conflito e a abertura de uma nova frente de desestabilização na Europa enquanto prossegue a guerra na Ucrânia.
A normalização das relações entre a Sérvia e o Kosovo, mediadas pela UE, permanece num impasse, em particular após os confrontos em setembro passado entre uma milícia sérvia e a polícia kosovar que provocou quatro mortos e agravou as tensões na região.
Na sequência deste incidente, a Kfor, a força multinacional da NATO no Kosovo e presente no território desde 1999, reforçou a sua presença no terreno e possui atualmente cerca de 4.800 efetivos.
A UE e os Estados Unidos têm pressionado Belgrado e Pristina para a aplicação dos acordos que o Presidente sérvio, Aleksandar Vucic, e Kurti terão aceitado em março passado.
A permanência das tensões arrisca a comprometer as ambições sobre uma futura adesão à UE.
O Kosovo independente -- que a Sérvia considera o berço da sua nacionalidade e religião -- foi reconhecido por cerca de 100 países, incluindo os Estados Unidos, que mantêm forte influência sobre a liderança kosovar, e a maioria dos Estados-membros da UE, à exceção da Espanha, Roménia, Grécia, Eslováquia e Chipre.
A Sérvia continua a considerar o Kosovo como parte integrante do seu território e Belgrado beneficia do apoio da Rússia e da China, que à semelhança de dezenas de outros países (incluindo Índia, Brasil, África do Sul ou Indonésia) também não reconheceram a independência do Kosovo.
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