O resultado do escrutínio é, contudo, muito incerto, porque mesmo que os mais de 6,3 milhões de eleitores (numa população de nove milhões) deem a vitória ao Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ), o seu polémico dirigente, Herbert Kickl, está longe de ter o lugar de chanceler garantido.
O FPÖ operou um regresso espetacular à arena política no país, depois de ter atingido o seu ponto mais baixo há cinco anos, devido ao escândalo de corrupção batizado como 'Ibizagate'.
Fê-lo utilizando uma retórica certeira, criticando a imigração, as medidas de combate à pandemia de covid-19, a política climática e até as sanções impostas à Rússia, em nome da neutralidade austríaca.
As últimas sondagens atribuem ao FPÖ 27% das intenções de voto e apenas 25% aos conservadores do Partido Popular Austríaco (ÖVP), que sofrem uma queda acentuada: no poder desde 1987 no próspero país da Europa Central, obtiveram em 2019, sob a liderança do jovem Sebastian Kurz, 37% dos votos.
Enfraquecidos pelo seu tempo no Governo com o ÖVP, os sociais-democratas do SPÖ e os Verdes classificam-se muito atrás, com 20% e 8% das intenções de voto, respetivamente.
Segundo os especialistas em ciência política, Herbert Kickl conseguiu, durante a campanha eleitoral, alargar o espetro dos temas abordados para além do habitual 'leitmotiv' (linha condutora) da extrema-direita - a imigração - e "seduzir" muitos eleitores frustrados com a política atual, desafiando-os com o seu 'slogan': "Ousar algo novo".
A sua comunicação clara e maniqueísta conquistou os eleitores, numa altura em que a sociedade está altamente polarizada, num cenário de pós-pandemia, elevado custo de vida e convulsões geopolíticas.
Embora o FPÖ já tenha experimentado o poder por três vezes na Áustria, um primeiro lugar nas legislativas do próximo domingo poderá ser "um terramoto" para o país alpino, dizem os analistas, embora entre eles exista uma certa unanimidade em relação a um ponto: é maior a probabilidade de uma vitória do que a de Kickl se tornar chefe do Governo, porque os conservadores do ÖVP nunca aceitarão ser o parceiro minoritário numa coligação com o FPÖ, preferindo aliar-se aos sociais-democratas e aos liberais do NEOS -- uma coligação tripartida sem precedentes.
O chanceler conservador cessante, Karl Nehammer, um ex-militar de 51 anos, tem repetido muitas vezes a sua recusa em aliar-se a um dirigente tão radical como Kickl, e o presidente dos Verdes, Alexander Van der Bellen, afirmou que provavelmente não o convidaria para formar Governo.
Uma solução que até poderá não desagradar ao líder da extrema-direita, sugerem os politólogos, porque lhe permitiria espalhar a sua mensagem contra as elites e semear a discórdia, numa altura em que a Áustria atravessa um período económico difícil.
Nos últimos meses, Nehammer endureceu o discurso sobre a imigração, numa tentativa para recuperar o atraso em relação ao que é agora uma tendência de fundo na Europa, pretendendo mostrar que os Governos europeus estão atualmente na defensiva e que a Áustria não é exceção.
Depois de uma campanha difícil e sem brilho, a margem que separa o ÖVP dos ultranacionalistas do FPÖ diminuiu, e o chanceler prometeu "estabilidade", sublinhando a sua "capacidade para gerir crises", nomeadamente há duas semanas, durante a passagem da mortal tempestade Boris, que suspendeu todo o debate político.
Se as sondagens estiverem erradas, os conservadores do ÖVP ficarão, então, numa posição de força e poderão sentir-se tentados a coligar-se com a extrema-direita, que tem um programa económico semelhante, segundo os especialistas.
A anterior experiência, entre 2017 e 2019, manchada por escândalos, deixou certamente um gosto amargo no ÖVP, mas nada é de excluir num país que, em 2000, foi alvo de sanções de Bruxelas, devido à aliança forjada pelo ÖVP com o então líder da extrema-direita austríaca, Jörg Haider, uma personagem controversa.
Uma tal reação da União Europeia (UE) seria hoje impensável, num contexto de ascensão de partidos da extrema-direita em toda a Europa, como Giorgia Meloni em Itália, Robert Fico na Eslováquia, Geert Wilders nos Países Baixos e Marine Le Pen em França.
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