Salome Zourabichvili, que se recusou a reconhecer os resultados oficiais, afirmou, numa entrevista à agência de notícias Associated Press (AP), que a nação do sul do Cáucaso foi vítima de pressão da Rússia, cujo objetivo é afastar a Geórgia de uma adesão à União Europeia (UE).
"Vimos que a propaganda russa foi utilizada diretamente", disse Zourabichvili, uma reconhecida crítica do partido no poder, referindo que o Governo da Geórgia tem "trabalhado de mãos dadas com a Rússia" e provavelmente teve ajuda dos serviços de segurança russos.
No domingo, Zourabichvili esteve ao lado dos líderes da oposição e instou os georgianos a participarem numa manifestação marcada para hoje à noite na rua principal da capital, Tbilissi, em protesto contra o que chamou de "fraude total" e "roubo dos votos".
Na entrevista à AP, a chefe de Estado adiantou esperar que os Estados Unidos da América (EUA) e a UE apoiem os protestos.
"Precisamos de ter o apoio firme dos nossos parceiros europeus, dos nossos parceiros norte-americanos", considerou Zourabichvili.
O secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, afirmou, numa mensagem divulgada através da rede social X, que "o povo georgiano abraçou a democracia" e instou os líderes políticos da Geórgia a "respeitarem o Estado de direito, a revogarem a legislação que prejudica as liberdades fundamentais, a resolverem as deficiências no processo eleitoral e a conduzirem a Geórgia em direção ao seu futuro euro-atlântico".
O Kremlin (presidência russa) rejeitou todas as acusações de interferência.
"Não estamos a intrometer-nos nos assuntos internos da Geórgia e não temos qualquer intenção de nos intrometer", garantiu o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, acusando, por sua vez, o Ocidente de tentar influenciar o resultado da votação.
Questionado sobre o apelo de Zourabichvili para que os georgianos se juntem aos protestos de hoje à noite, Peskov considerou que o pedido constitui uma tentativa de desestabilizar o país.
Com quase todos os votos contados, a comissão eleitoral da Geórgia avançou no domingo que o partido no poder, "Sonho Georgiano", recebeu 54,8% dos votos no escrutínio de sábado.
O partido -- fundado por Bidzina Ivanishvili, um bilionário que fez fortuna na Rússia -- tornou-se mais autoritário ao longo do último ano, adotando leis semelhantes às utilizadas pela Rússia para reprimir a liberdade de expressão.
Em junho, face à aprovação de uma "lei de influência estrangeira" ao estilo russo, a UE suspendeu indefinidamente o processo de pedido de adesão da Geórgia.
Segundo os observadores eleitorais europeus, as eleições decorreram num ambiente "divisivo", marcado por intimidações e por casos de compra de votos, dupla votação e violência física.
Durante a campanha, o "Sonho Georgiano" utilizou "uma retórica antiocidental e hostil" e "promoveu a desinformação, as manipulações e as teorias da conspiração russas", acusou o líder da delegação de observadores do Parlamento Europeu, Antonio López-Istúriz White.
O primeiro-ministro, Irakli Kobakhidze, membro do "Sonho Georgiano", descreveu no domingo o sucesso do seu partido como "impressionante e óbvio", e disse que "qualquer tentativa de falar sobre manipulação eleitoral está condenada ao fracasso".
Os números iniciais da contagem de votos sugeriam que a participação eleitoral foi a mais elevada desde que o "Sonho Georgiano" foi eleito pela primeira vez, em 2012.
O partido prometeu continuar o esforço rumo à adesão à UE, mas também reiniciar os laços com a antiga potência dominante da Geórgia, a Rússia.
Em 2008, a Geórgia travou e perdeu uma breve guerra com a Rússia, que reconheceu então a independência de duas regiões separatistas do país do Cáucaso (Ossétia do Sul e Abecásia) e reforçou a sua presença militar nessas zonas.
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