Para a investigadora Darcie Draudt-Véjares, do programa para a Ásia da unidade de investigação ('think tank') Carnegie Endowment for International Peace, "existem razões para alarme", porque dá um sinal de "viragem estratégica mais ampla da Rússia para a construção de uma coligação contra o Ocidente".
"Ao expandir a sua órbita para incluir a Coreia do Norte (juntamente com o Irão, com potencial alinhamento chinês), a Rússia não está apenas a procurar vantagens táticas na Ucrânia - está a tentar remodelar a arquitetura de segurança global", vincou num relatório do organismo.
Para a analista, "este sistema de alianças emergente desafia os acordos de segurança pós -Guerra Fria e arrisca-se a transformar conflitos regionais em confrontos globais mais alargados".
A participação dos soldados norte-coreanos representa assim uma "mudança fundamental" na dinâmica do poder global, suscitada pelo tratado de defesa celebrado entre Moscovo e Pyongyang, e transforma a guerra na Ucrânia num "inesperado campo de batalha por procuração para as tensões na Península Coreana", observou.
A investigadora Mary Glantz, do centro para a Rússia e Europa do 'think tank' United States Institute of Peace, concordou que a participação dos norte-coreanos nos combates "representa uma escalada e um desafio implícito à Ucrânia e aos países aliados", mas questionou os seus efeitos práticos no campo de batalha.
"A guerra tornou-se num conflito de atrito que ceifa aproximadamente 1.200 russos por dia. Com essa taxa de baixas, mesmo 12.000 soldados norte-coreanos só seriam suficientes para 10 dias de operações", observou num documento publicado pelo 'think tank'.
"O mais provável é que a participação da Coreia do Norte se enquadre na estratégia mais alargada do Kremlin de expandir o caos para desafiar o apoio do Ocidente à Ucrânia", escreveu Glantz. O Presidente russo, Vladimir Putin, pode também estar a usar esta movimentação "para sinalizar que não está isolado internacionalmente e que é capaz de recorrer a recursos adicionais quando necessário".
O envio de tropas norte-coreanas pode, no entanto, ter efeitos mais nefastos para a Coreia do Sul. Seul declarou que o envio direto de tropas para o conflito representa uma "grave ameaça" à sua segurança, permitindo aos solados adquirir experiência de combate direto e dados sobre o desempenho de armas, incluindo veículos aéreos não tripulados ("drones") e mísseis balísticos.
A Coreia do Sul está também preocupada com o apoio prestado pela Rússia à modernização das armas convencionais e às capacidades de lançamento de satélites da Coreia do Norte, o que melhoraria a sua capacidade de vigilância contra as forças norte-americanas e sul-coreanas na região.
"No mínimo, os destacamentos intensificam a solidariedade do país para com a Rússia, dando a Pyongyang mais poder para procurar ajuda adicional de Moscovo e maior confiança para resistir à pressão internacional", escreveu Frank Aum, especialista em assuntos do nordeste da Ásia no United States Institute of Peace.
Em resposta, o governo sul-coreano declarou que está a considerar "contramedidas faseadas". No entanto, apesar das ameaças de envio de "armas ofensivas" para a Ucrânia, a assistência direta sul-coreana "continuará provavelmente a limitar-se à ajuda humanitária e não letal, uma vez que a legislação nacional impede a exportação de armas para zonas de conflito ativas", apontou o analista.
Aum apontou, no entanto, que Seul pode continuar a enviar munições indiretamente através dos Estados Unidos e de outros países e colocar pessoal na Ucrânia, para ajudar a falar com os soldados norte-coreanos que desertam ou são capturados, ou para analisar as táticas e capacidades norte-coreanas.
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